A energia eólica, aquela que
produz energia elétrica pela força dos ventos, tem crescido exponencialmente no
país. Os números não mentem. Em 2011 a potência instalada era de 2 GW
(GigaWatts). Em dezembro/2021, segundo a Abeeólica (Associação Brasileira de
Energia Eólica) a potência instalada ultrapassou os 20 GW, com aproximadamente
751 parques eólicos e mais de 8.800 aerogeradores instalados. O que representa
aproximadamente, 11% da matriz elétrica.
O uso desta fonte de energia
renovável é considerado menos sujo, em relação aos combustíveis fósseis. É
inesgotável, abundante e de excelente qualidade no nordeste brasileiro, e em
outras regiões do país. Sua contribuição para a transição e diversificação da
matriz elétrica é inquestionável. A modularidade permite atender a distintas
faixas de potência. Várias são as vantagens.
A produção de energia eólica
é necessária pelos inúmeros benefícios, desde que se preservem as funções e os
serviços dos complexos sistemas naturais que combatem as consequências
previstas pelo aquecimento global. Mas também a preservação dos modos de vida
das populações locais.
A produção de grandes blocos de energia, em larga escala, utiliza grandes superfícies para a instalação dos complexos eólicos, constituídos de parques eólicos que ocupam áreas contínuas. Os impactos produzidos por cada parque são cumulativos e sinergéticos, e atingem as pessoas que vivem nos locais de instalação, atingem os ecossistemas e, em última análise, o planeta, de modo geral.
O problema reside na escala de produção de energia. Maior potência total instalada, maior área necessária para a instalação dos aerogeradores (e também módulos fotovoltaicos), maior área desmatada e impactada. A construção das vias de acesso acaba também trazendo impactos indesejáveis ao meio ambiente local, juntamente com a construção de galpões destinados a abrigar os equipamentos e as empresas prestadoras de serviço que atuam na montagem dos parques.
Instalações de complexos
eólicos no interior nordestino concentram mais de 85% das instalações eólicas
distribuídas pelo território brasileiro, atingem diretamente o bioma Caatinga.
A supressão da vegetação, o uso de grandes quantidades de água na construção
das bases para as torres de sustentação das pás dos aerogeradores, são aspectos
que merecem ser analisados em relação à sustentabilidade destas instalações de
grande porte, quando as instalações eólicas estão localizadas em áreas
costeiras, os impactos ambientais são distintos, mas não menos graves. Inúmeras
publicações e estudos acadêmicos descrevem detalhadamente estes impactos.
Para os empreendimentos
eólicos existe uma legislação pertinente que disciplina as questões de
licenciamento ambiental, através das resoluções do CONAMA (Conselho Nacional do
Meio Ambiente).
No auge da crise de desabastecimento de energia, conhecida como o Apagão de 2001, a resolução CONAMA 279/2001 flexibilizou a legislação ambiental. Aplicável apenas aos empreendimentos elétricos de pequeno impacto ambiental (fonte eólica considerada como tal pelos órgãos ambientais). O enquadramento caberia ao órgão ambiental estadual definir. Por sua vez, a Resolução CONAMA 462/2011, definiu que o órgão licenciador tem a competência de enquadrar os projetos de geração eólica; agora considerando o tamanho, a localização e o baixo potencial poluidor do empreendimento.
O que ocorre atualmente é que todo projeto eólico de grande porte é considerado de baixo impacto, e assim é dispensado a exigência do EIA/RIMA. Pelo fato dos empreendimentos eólicos, independentemente do tamanho e da localização serem considerados de baixo impacto ambiental, a única exigência junto ao empreendedor para o licenciamento, se restringe somente ao Relatório Ambiental Simplificado (RAS). Todavia os empreendimentos eólicos, tanto podem ser de baixo potencial como de significativo impacto ambiental, como verificado no campo.
Cabe à autoridade
administrativa, identificar os riscos, apontar as soluções adequadas, e impor
ao empreendedor medidas de mitigação e/ou de compensação ambiental. Todavia,
infelizmente na prática, inexiste o acompanhamento, a fiscalização para que
tais compromissos sejam alcançados. Verifica-se de fato uma omissão, uma
transgressão dos órgãos que deveriam ter a responsabilidade de cuidar do meio
ambiente.
Empreendedores acabam
dividindo o complexo eólico, em vários parques eólicos menores em relação à
potência instalada, e ao número de aerogeradores. Todavia, os parques eólicos
são “vizinhos” entre si, ocupando áreas contínuas e, consequentemente, impactos
cumulativos dos parques devem ser levados em conta. O que pode tornar o
empreendimento de grande impacto ambiental é se boas práticas socioambientais
não forem adotadas pelos empreendedores, respeitando a natureza e as pessoas.
Órgãos licenciadores “fecham os olhos”, prevaricam diante dos altos impactos, e
utilizam a grife “energia limpa”, como passaporte para malfeitos.
Estes breves comentários sobre a legislação existente, das “manobras” dos empreendedores e conivência das instituições que licenciam, fiscalizam; demonstram condutas éticas questionáveis, em desrespeito completo à preservação do meio ambiente, e a falta de transparência. Lamentavelmente este é o modus-operandi dos “negócios do vento”, compreendido e repartido as responsabilidades, entre os empreendedores, organizações governamentais e políticos. Esta situação se repete, e é semelhante nos vários estados brasileiros onde se desenvolvem os “negócios do vento”.
O resultado da balbúrdia instaurada, e de certa promiscuidade reinante entre os atores, é um modelo insustentável de expansão da tecnologia eólica de grande porte.
Recentemente procuradores do
estado do Rio Grande do Norte, integrantes do Conselho Estadual do Meio
Ambiente (Conema), apresentaram recomendações no sentido da necessidade de uma
revisão dos procedimentos do órgão licenciador, e dos conceitos adotados. Não é
pelo fato de ser uma fonte renovável, cuja reputação é de ser limpa, mas que
verdadeiramente não existe fonte de energia limpa, conforme nos diz a ciência,
está isenta de impactos socioambientais expressivos.
Diante da ação dos
procuradores, a reação da presidente da Abeeólica foi imediata. Em entrevista
ao jornal diário Tribuna do Norte com sede em Natal/RGN, em tom arrogante,
ameaçou os governos que pretendem modificar o tratamento diferenciado dado até
então, para os “negócios do vento”. Afirmou que “o investidor vai chegar aqui e
vai identificar tantas dificuldades, que ele vai migrar para outro lugar e o estado
vai perder a oportunidade e o investimento”. O que a representante deste
negócio, que move bilhões de reais, chama de “tantas dificuldades” seria nada
mais, nada menos do que respeitar a lei, e sua interpretação em relação a baixo
impacto ambiental. Não se pode admitir que de antemão a instalação de um
parque/complexo eólico seja considerada de baixo impacto, e sem a necessidade
de realização de estudos mais apurados como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA)
e o Relatório de Impacto de Meio Ambiente (RIMA).
Em sua entrevista, uma clara
chantagem é feita contra o governo potiguar, ao declarar que “agora, os
investidores que estão aqui, observamos que, realmente, eles estão avaliando a
possibilidade de sair do Estado. Porque em geral, nós investidores não entramos
em confronto, simplesmente procuramos outro lugar para colocar nossos
investimentos”.
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