Não existe tema mais universal que a questão dos recursos energéticos. É consenso entre estudiosos, autoridades, empresários e consumidores que o contínuo suprimento de energia pode propiciar um maior crescimento econômico e melhor qualidade de vida. Na maior parte dos trabalhos acadêmicos e relatórios governamentais a energia é relacionada à segurança nacional e a estabilidade econômica global. O crescimento da demanda por energia tem pressionado o desenvolvimento de sistemas e tecnologias mais eficientes e a diversificação de fontes de suprimento, especialmente de energias limpas e renováveis. Às tradicionais fontes energéticas de carvão, petróleo e gás gradativamente somam-se outras como a nuclear, a elétrica, a eólica e a dos biocombustíveis.
Além de melhores tecnologias e sistemas de geração energética são crescentes também as preocupações com a infra-estrutura de distribuição e regulamentação comercial das novas descobertas e do crescente aumento da demanda e oferta de novas soluções energéticas. Grande parte do aumento da demanda energética está atrelada à expansão econômica da China e da Índia. Estes dois países vêm desenvolvendo suas economias de forma mais acentuada que os demais e tornaram-se grandes consumidores de energia. Seus processos de desenvolvimento econômico somam-se às pressões para a busca de energias substitutas ao petróleo e, nesse sentido, os biocombustíveis na forma de etanol e de biodiesel vêm despertando o interesse de todos os agentes econômicos. Várias políticas governamentais, como relacionado no item seguinte, vêm incentivando sua maior presença na matriz energética de diferentes países.
No maior consumidor energético do mundo, nos Estados Unidos, por exemplo, o ex-presidente Bush estava demandando uma redução de 20% do consumo de gasolina nos próximos 10 anos e o Senado daquele país, por sua vez, tem legislado em favor da produção de biocombustíveis, especialmente do etanol produzido a partir do milho. De acordo com o Institute for 21st Century Energy e variados artigos acadêmicos e jornalísticos, o combustível de etanol (etil álcool) resulta da fermentação e destilação de açucares derivados de várias plantas como o milho e a cana de açúcar, sendo o cultivo desta última comum na faixa tropical do mundo onde o Brasil se destaca como grande produtor. Tradicionalmente o etanol é produzido em praticamente todos os países, não como combustível, mas como o principal componente das bebidas alcoólicas.
Como combustível, é empregado na mistura com a gasolina, sendo comum adicionar E10 (10% de etanol em 90% de gasolina). Na sua forma pura, E100 (100% etanol), é utilizado principalmente no Brasil de forma crescente desde os anos 70. Nos Estados Unidos, com base na cultura do milho, o estado de Iowa, secundado por Illinois, Minnesota, Nebraska e South Dakota, produz aproximadamente 75% do etanol do país. No Brasil, o fenômeno da concentração produtiva, com base na cultura da cana de açúcar, se repete sendo o estado de São Paulo o maior produtor (58%), seguido pelos estados do Paraná, Minas Gerais, Alagoas e Pernambuco. A Índia segue sendo o maior produtor de cana de açúcar do mundo, mas sua utilização como biocombustível ainda é pequena se contrastada com a produção brasileira.
Nos Estados Unidos, a mistura do etanol na gasolina representou em 2006 aproximadamente 3,6% de seu consumo total, ou seja, cinco bilhões de galões. No mesmo ano, segundo o Institute for 21st Century Energy existiam 120 refinarias em funcionamento e outras 80 estavam sendo construídas visando alcançar uma expansão adicional de sete bilhões de galões. O Energy Policy Act de 2005 estabeleceu o requisito nacional de utilização de 7,5 bilhões de galões de combustíveis renováveis até 2012 sendo que a maior parte deles será de etanol. Em 2007, em sua fala à nação, o Presidente Bush indicou a necessidade de o país utilizar 35 bilhões de galões de combustíveis renováveis até 2017. Nesse caso toda a atual produção de milho do país seria utilizada para a produção de etanol.
Ao longo de três décadas o Brasil liderou a produção de etanol combustível perdendo sua posição para os Estados Unidos após a compulsoriedade de sua utilização exigida pelo Energy Policy Act de 2005. Antes desta lei, segundo Swanson, Madden e Ghio4 o estabelecimento do American Jobs Creation Act em 2004 foi um marco na produção de biocombustíveis nos Estados Unidos. No centro dessa lei encontra-se a provisão de incentivos que permitem aos distribuidores de biodiesel receber créditos tributários que levaram segundo os autores a um crescimento de 300% da produção somente no ano de 2005. Medidas de incentivo à produção de etanol adotada pelos Estados Unidos ou outros países têm contribuído para uma vertiginosa expansão da produção mundial de etanol.
Na maioria dos países produtores de etanol combustível e em relatórios de agências oficiais como o The Global Biofuels Outlook 2007 os proponentes da expansão da produção argumentam que o mesmo possibilita uma maior diversidade da matriz energética e maior independência das fontes de energias fósseis. Argumentam que seu uso reduz a poluição e que propiciaria um maior desenvolvimento de regiões agrícolas. Uma maior utilização do etanol contribuiria para a redução das emissões de gás carbônico na atmosfera. A National Corn Growers Association, informa que 4,9 bilhões de galões de etanol combustível consumidos em 2006 reduziram 8 milhões de toneladas de emissões de CO2, equivale a remover 1,2 milhões de veículos das estradas.
Parte considerável da literatura sobre a expansão da produção de biocombustíveis ressalta vários aspectos negativos da mesma. O principal deles é o aumento dos preços dos produtos agrícolas e o seu impacto na alimentação da parcela mais pobre da população mundial. Nos Estados Unidos, por exemplo, o preço do milho no mercado de futuros cresceu de US$ 2,50 ao bushel (um bushel corresponde a 2,2 sacas de 60 quilos) em setembro de 2006 para US$ 4,16 por bushel em janeiro de 2007. O aumento nos preços dos produtos utilizados para a produção de etanol e biodiesel provoca um deslocamento da produção agrícola de outras culturas ou mesmo de suas funções originais ocasionando elevações de preços em outros produtos e indiretamente na produção animal.
Estudiosos e organizações não governamentais chamam a atenção para a limitada poupança de energia e de ganhos ambientais com a expansão da produção dos biocombustíveis. O impacto pode até mesmo ser negativo, pois o cultivo em larga escala de vegetais para a produção de bioenergia requer grandes quantidades de água, fertilizantes e pesticidas. Se o manejo não for adequado o plantio extensivo e intensivo pode também degradar o solo e destruir ecossistemas. Outro aspecto negativo e que gradativamente vem sendo superado pelos avanços tecnológicos é a baixa taxa de retorno energético de algumas plantas utilizadas no processo de produção de etanol e biodiesel. Enquanto o etanol de cana-de-açúcar possui uma taxa de aproximadamente 8 e o biodiesel de óleo de dendê aproximadamente 9, o etanol de milho apresenta uma taxa de retorno energética de 1,5 e 3 para o biodiesel de soja.
Nos cálculos das taxas de retorno energético dos biocombustíveis o rendimento das diferentes culturas por hectare de terra cultivada é uma das variáveis mais importantes. Fulton et al, contrastaram o rendimento das culturas mais utilizadas para a produção de etanol com as utilizadas para o processamento de biodiesel. Dado o baixo rendimento por hectare de grande parte das culturas utilizadas na produção de biocombustíveis a necessidade de significativas extensões de terra agricultáveis é indispensável para seu cultivo. Desmatamentos, queimadas e utilização dos solos com base em critérios econômicos de curto prazo visando a um rápido aumento da produção dos biocombustíveis têm se apresentado urgentes desafios a serem controlados e superados.
Outro problema relacionado à produção em larga escala de biocombustíveis está associado a necessidade de expansão da infra-estrutura de produção e de distribuição. Em várias regiões o etanol e o biodiesel continuam sendo mais caros que os combustíveis fósseis sendo subsidiados direta ou indiretamente para viabilizar sua produção. Nos Estados Unidos, por exemplo, os produtores de etanol recebem subsídios diretos de US$ 0,51 por galão e na União Européia, segundo Jank et al. os subsídios indiretos, em 2004, foram da ordem de US$ 1,6 bilhão para os produtores de azeites e US$ 15 bilhões para os produtores de cereais.
Existem centenas de usinas produtoras de etanol combustível principalmente nos Estados Unidos e no Brasil, ainda são poucas as que se dedicam à produção de biodiesel. O crescimento do número de usinas produtoras de biodiesel vem expandindo a taxas superiores as produtoras de etanol. Nos primeiros cinco anos deste século o número de usinas produtoras de etanol dobrou enquanto as produtoras de biodiesel, partindo de uma base menor, quadruplicaram. A produção mundial de biodiesel ainda é embrionária se comparada com a produção de etanol.
Ao longo de todo o século XX, o biodiesel sempre foi um potencial combustível e utilizado em pequena escala em várias experiências desenvolvidas em diferentes ocasiões históricas. Quando da invenção dos motores á combustão no início do século passado Rudolph Diesel já o empregava em seus experimentos e considerava viável sua utilização. Durante a Segunda Guerra Mundial e mais tarde quando das duas grandes crises do petróleo de 1973 e 1976 a utilização de biocombustíveis para transporte proliferaram e desde então o interesse em seu aproveitamento como substituto dos combustíveis fósseis tem sido crescente.
O biodiesel pode ser produzido a partir de óleos vegetais ou animais. Entre os vegetais mais comuns utilizados na produção desta renovável fonte energética encontra-se a canola, o girassol, a soja e o óleo de palma produzido em grande escala na Malásia e na Indonésia. A Alemanha em 2005 processou 1.920 milhões de litros é o maior produtor mundial de biodiesel extraído basicamente da beterraba. Naquele ano, a França, o segundo maior produtor, beneficiou 511 milhões e os Estados Unidos, 290 milhões. Embora a Malásia e a Indonésia sejam os maiores produtores do insumo de maior rendimento na produção de biodiesel seu processamento nesses dois países ainda encontra-se em fase experimental. Em 2005, Estados Unidos, União Européia e o Brasil foram responsáveis por 95% da produção mundial de biocombustíveis sendo na seqüência o Canadá, a China e a Índia os maiores produtores.
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