Qual o sistema de regulação do emergente mercado mundial de etanol e biocombustíveis é a principal pergunta de autoridades publicas e privadas em todos os continentes. É necessário um novo aparato regulatório para o biodiesel do futuro. Todos os mercados são direta ou indiretamente regulados pelo Estado. Na Europa e no Japão, o preço do petróleo foi mantido alto para preservar a malha ferroviária instalada. Nos Estados Unidos, os oligopólios das sete grandes empresas exploradoras do petróleo mantiveram os preços dos derivados baixos e as ferrovias perderam espaço para os transportes rodoviários.
Para este pesquisador no Brasil, o preço do petróleo foi mantido alto o suficiente para dar lucro excepcional a Petrobrás, que investiu pesadamente na busca da auto-suficiência. No Brasil, o álcool é barato porque, no distribuidor final, o preço da gasolina é onerado por quase 50% de impostos. Sem esta tarifa o álcool brasileiro não seria competitivo e como na esmagadora maioria dos outros países onde é produzido necessitaria de subsídios. Nos Estados Unidos o preço da gasolina é baixo. O álcool brasileiro não consegue entrar, nem conseguirá ser exportado para aquele país, porque àquele país possui visão estratégica acerca de sua autonomia e possibilidades energéticas. Mesmo que as atuais elevadas taxas sobre o etanol e os demais biocombustíveis importados para suprir seu mercado fossem diminuídas, o álcool brasileiro seria competitivo com o álcool americano devido a sua onerosa produção a partir da cultura do milho, mas não competiria com a gasolina que possui um nível de tributação comparativamente baixo.
Além do grande mercado consumidor de energia dos Estados Unidos, por pressões ambientais haverá substituição do MTBE por etanol em níveis em torno de 7% a 10%. Porém, para que os biocombustíveis causem uma grande revolução, os países produtores desta nova fonte de energia renovável não devem produzi-la para misturá-la com as energias fósseis, mas sim deveriam substituí-las. A melhor estratégia para o Brasil é desenvolver um mercado para os carros flex; isto é, vender carro e combustível para países pequenos criando pouco a pouco demanda para sua produção de tecnologia e combustíveis renováveis. Para os países de maior porte, essa estratégia não funcionaria, pois os Estados Unidos não irão abrir seu mercado. O Japão e União Européia também não abrirão, a menos que tenham fortes garantias de fornecimento em grande escala.
Os mercados agrícolas, principalmente dos países desenvolvidos, têm sido os mais protegidos por barreiras tarifárias e alfandegárias. Impasses nas negociações da Rodada de Doha têm se caracterizado pelas resistências dos países centrais em liberalizar seus mercados agrícolas. Baseado na experiência brasileira de desenvolvimento da produção de etanol discute suas vantagens e demanda a abertura dos mercados para o etanol brasileiro. Subsídios aos combustíveis fósseis, subsídios agrícolas e outras externalidades encobrem o foco central da discussão sobre os biocombustíveis, que é a rápida melhoria da curva de aprendizagem por meio do comércio internacional liberalizado e da exploração total do potencial produtivo de biocombustíveis nos países em desenvolvimento.
Apesar das resistências na liberalização do comércio internacional, dos problemas técnicos de classificação dos biocombustíveis como sendo um produto agrícola ou uma commodity energética como desde 2006 o governo brasileiro vem demandando, não existe certeza de que os mercados americano, europeu e japonês permanecerão sempre fechados para os biocombustíveis brasileiros. Aos lobbies protecionistas da agricultura, se contrapõem lobbies igualmente poderosos, que não querem se sujeitar ao preço interno elevado do milho nos EUA e do óleo de colza/canola na União Européia. Para ele, há enorme espaço para o Brasil aumentar a sua presença nos grandes países consumidores de energias fósseis, cujo mercado potencial para combustíveis renováveis é enorme.
Qualquer pequena abertura comercial nos mercados centrais pode representar um aumento expressivo da demanda por biocombustíveis uma vez que toda a atual produção brasileira de álcool representa um volume equivalente a apenas 2% de substituição de gasolina nos Estados Unidos. A imagem do Brasil está associada à sustentabilidade econômica, social e ambiental do setor de renováveis. Se o Brasil não for ecologicamente correto, pode enfrentar barreiras nos grandes mercados. Isso aponta para a necessidade de mecanização da colheita da cana de açúcar e para a intensificação do uso da terra pela pecuária, com crescimento vertical (e não horizontal) da produção. A contrapartida de curto prazo é que a colheita manual da cana de açúcar emprega hoje 250 mil trabalhadores, que podem ficar sem o emprego.
Ao problema do desemprego rural soma-se o temor da cana utilizada para a produção de etanol invadir áreas de produção de grãos que compõem a dieta das populações mais pobres do planeta. É errado temer a monocultura de cana de açúcar. Dados censitários mostram justamente o contrário: uma diversificação do uso da terra graças ao incremento tecnológico nos últimos sessenta anos. Para ele também é falso o dilema alimentos versus energia uma vez que o Brasil poderia suprir toda a demanda de etanol dos Estados Unidos, de 38,6 milhões de m3 e da UE, mais 11,4 milhões de m3, em 2010, com apenas 22 milhões de hectares de cultivo da cana de açúcar. O país utilizaria somente 6,5% da sua área agrícola ou 11% da área disponível em pastagens. Ele acredita que se as mais eficientes plantas brasileiras para produção de etanol tivessem espaço no mercado mundial, a discussão seria "alimento + combustíveis" além de se discutir o enorme potencial da bioeletricidade de origem vegetal e as certificações que atestem a sua sustentabilidade.
Essas preocupações também são consideradas por Homem de Melo, ao evidenciar que a demanda mundial por biocombustíveis exerce forte pressão nos preços dos produtos agrícolas destinados a sua produção. O ano de 2007 marca a transição de um período de crise (2005/2006) para um de crescimento na agricultura brasileira devido à nova demanda de fontes de bioenergia que até então não existia. Suas projeções mostram que nunca houve na história da agricultura brasileira época como a atual onde a produção de grãos é maior em uma menor área cultivada evidenciando claros aumentos de produtividade. Ressalta, porém, com base em dados do International Food Policy Research Institute (Ifpri) que os preços de alguns produtos que compõe a dieta alimentar das populações mais pobres estão duplicando seus preços em apenas 3 anos.
O aumento da produtividade agrícola é promissor para os agricultores e consumidores, mas o mesmo não é verdade quando os preços sobem de forma acelerada. Segundo Homem de Melo, os mais pobres gastam de 50% a 80% de sua renda na compra de alimentos e o consumo calórico cai 0,5% a cada aumento de 1% no preço. Ele indica ainda que o aumento de pessoas em situação de insegurança alimentar no Brasil pode subir em 16 milhões de habitantes para cada 1% de elevação nos preços da cesta básica. E, dando eco às apreensões expressas no artigo de Runge e Senauer, anteriormente mencionados, aponta para o fato de se essa alta for contínua, em 2025 o mundo poderá ter 1,2 bilhões de pessoas em estado de fome crônica: 600 milhões a mais do que é previsto atualmente. Potenciais ganhos de produtividade e aumentos de preços seguiram balizando o debate sobre "alimentos versus combustíveis" ou "alimentos mais combustíveis" no contexto mundial, asiático e latino-americano.
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