Pesquisadores da academia e da iniciativa privada descobriram uma maneira de reduzir pela metade a quantidade de vinhaça resultante da produção de etanol. A vinhaça é o principal resíduo da indústria da cana - uma mistura de água com matéria orgânica e sais que não pode ser despejada nos rios.
A solução desenvolvida pelos cientistas foi duplicar o teor alcoólico dos tanques de fermentação, o que permite produzir mais álcool (e menos vinhaça) de um mesmo volume de açúcar.
Hoje, a maioria das usinas trabalha com um teor alcoólico de 8% nos tanques. Mais do que isso e as leveduras responsáveis pela fermentação morrem intoxicadas no tanque. O resultado é que para cada 1 litro de álcool são produzidos até 12 litros de vinhaça.
Como a vinhaça é rica em potássio - e como a legislação proíbe o despejo no meio ambiente -, as usinas reaproveitam o líquido como adubo, que é lançado sobre as plantações de cana em sistemas de irrigação. O problema é que, como a quantidade de vinhaça é muito grande, o custo de dispersão no campo torna-se também muito alto. Para evitar esse custo, muitas empresas acabam lançando a vinhaça sobre áreas menores, mais próximas da usina. Isso causa uma concentração elevada do resíduo, que pode contaminar águas subterrâneas.
Pelo novo processo, o teor alcoólico da fermentação chega a 16%. Assim, é possível injetar um caldo de cana mais concentrado (com mais açúcar) nas dornas, sem matar as leveduras. O resultado final da fermentação é mais álcool e menos vinhaça no tanque.
O volume do resíduo cai pela metade - 6 litros de vinhaça por litro de álcool -, com o dobro da concentração de potássio. Assim, torna-se economicamente viável transportar e espalhar a vinhaça por uma área maior, com menos impacto sobre o meio ambiente.
"Em vez de dez caminhões, você precisa de cinco", resume Luiz Carlos Basso, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ) da Universidade de São Paulo (USP). Ele é um dos cientistas parceiros da consultoria Fermentec, que financia e coordena a pesquisa.
Segundo o presidente da empresa, Henrique Amorim, a economia para a indústria - se todas as usinas do País adotassem a tecnologia - poderia passar de R$ 1 bilhão por ano, somadas as reduções de custo no setor agrícola (R$ 670 milhões) e industrial (R$ 425 milhões).
Como há menos água misturada ao álcool no final da fermentação, explica ele, as usinas gastam menos para evaporar o combustível e separar uma coisa da outra.
A principal adaptação para trabalhar com o teor alcoólico de 16% é o controle da temperatura de fermentação. Descobriu-se que a levedura tem um sinergismo com a temperatura. Para compensar o efeito do teor alcoólico maior, reduz-se a temperatura (de 33°C para 27°C). O processo requer a instalação de máquinas de resfriamento.
A pesquisa é feita há quatro anos em escala piloto na Usina da Pedra, em Serrana (SP). Mais três cientistas da USP e da Universidade Federal de Santa Catarina participam do projeto. O processo não pôde ser patenteado, segundo Amorim, porque já foi apresentado em uma reunião aberta em 2008.
Leveduras: fungos microscópicos unicelulares que fermentam o açúcar presente no caldo da cana e secreta álcool como subproduto desse metabolismo; diferentes raças são usadas na fermentação de outros produtos, como pães e vinhos. Para fermentar 500 mil litros de caldo de cana são necessárias 50 toneladas de levedura.
Vinhaça: também chamada de vinhoto, é a água que sobra da fermentação, depois que o álcool é separado por evaporação (cerca de 70% do caldo da cana é água e 30%, açúcar). É um líquido rico em sais, como cálcio e potássio, que podem ser usados como adubo irrigado nos plantios de cana.
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