Da virada do século aos dias
atuais
Para sabermos o quanto o carro
elétrico é ambientalmente sustentável e se ele será a salvação do planeta
precisamos olhar com mais cuidado alguns aspectos.
O carro elétrico assumiu o
status de um dos símbolos da preservação ambiental e luta contra o aquecimento
global já que, segundo o entendimento popular, não emitem gases prejudiciais ao
meio ambiente ou à saúde. Além disso, o carro elétrico
também é associado a alta tecnologia pela indústria automobilística e, desta
forma, constantemente exibido como 'a mais fina realização da moderna engenharia'.
Apesar
de parecer que a ideia dos elétricos é algo extremamente moderna, na verdade,
os primeiros modelos foram apresentados em meados de 1880. Na virada do século
XIX para o XX três diferentes modelos de automóveis concorriam no mercado:
elétrico, a vapor e a combustão interna. Com o passar dos anos os carros com
motor de combustão assumiram a dianteira e deslancharam. Dentre os fatores que
o fizeram dominar o mercado está o combustível barato, facilmente encontrado e
produzido, e uma maior facilidade na distribuição deste. Além disso, a maior
autonomia do carro a combustão interna permitiu às pessoas viajar maiores
distâncias enquanto os elétricos, com menor autonomia, ficavam cada vez mais
confinados nas cidades.
Modelo elétrico de 1909 sendo
recarregado.
Claro
que na época não se pensava em poluição do ar ou coisas do tipo. Com a
popularização do automóvel, especialmente graças ao famoso modelo T da Ford, as
cidades começaram a ficar super lotadas de carros e, consequentemente, também
de poluição.
A
preocupação com a questão da poluição está diretamente ligada à saúde da
população, em especial nos grandes centros. Nestes, onde existe uma grande
quantidade de automóveis em uma pequena área, a poluição emitida por estes acaba
concentrada. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade
mostra que em São Paulo a poluição chega a ser 2,5 vezes maior do que o limite
estabelecido pela Organização Mundial da Saúde e entre 2006 e 2011, mais de 99
mil pessoas morreram por doenças ligadas à poluição. No Rio de Janeiro, por
exemplo, 75% da poluição está relacionada com os automóveis.
Crises
do petróleo - especialmente a da década de 1970 - e guerras deram pequenos
sopros de investimento nos carros elétricos, mas a força econômica do petróleo
sempre prevaleceu.
Hoje
percebemos o ressurgimento da ideia do carro elétrico em formas e contextos bem
diversos. A ideia de veículos híbridos, aproveitamento do próprio movimento
para gerar energia e combustíveis alternativos, como o hidrogênio, estão
ampliando as formas de se pensar e produzir os novos carros elétricos.
Diferenças
entre o motor elétrico e o motor de combustão interna
A
diferença entre o motor elétrico e o motor de combustão interna consiste no
tipo de energia que faz este funcionar.
Nos
motores elétricos, como o próprio nome sugere, é a energia elétrica quem faz o
motor girar, utilizando-se o conceito da indução eletromagnética. Este efeito
ocorre quando uma corrente elétrica passa por um fio. Ao passar por este a corrente
elétrica gera - ou induz - um campo magnético. Através de uma construção
específica estes campos magnéticos fazem o motor girar. O motor elétrico de um
carro, conceitualmente falando, não é nada diferente de um motor elétrico
encontrado em bombas de água, aspiradores de pó e outros eletrodomésticos. Ele
não emite gases. O que alimenta o motor é um conjunto de baterias que são
constantemente recarregadas.
O
motor de combustão, de outra maneira, funciona pela reação entre o combustível
(diesel, gasolina, etanol, biodiesel), oxigênio e calor. Dentro de um motor a
combustão interna estes três elementos são misturados em certas proporções e
temos como resultado uma 'explosão' extremamente controlada, que como
resultado gera energia cinética - movimento. Além do movimento alguns elementos
químicos são gerados pela mistura dentre eles Monóxido de Carbono (CO), Dióxido
de Carbono (CO2), Dióxido de Enxofre (SO2), material particulado (fuligem) e
outros. Estes elementos podem variar dependendo do tipo de combustível, de sua
qualidade e da regulagem do motor.
Como
podemos ver pelas descrições acima os modelos elétricos não emitem gases ao
funcionarem, mas será que apesar disso eles são tão ecológicos assim?
Para
saber a resposta temos que avaliar algumas nuances sobre sua construção e
origem da energia utilizada para recarregar as baterias.
Tipos
de carros elétricos
Em
essência podemos dizer que existem três tipos de veículos elétricos atualmente
no mercado:
Inteiramente
elétrico não possui motor de combustão como os convencionais a gasolina,
etanol, gás natural ou diesel. O único motor que o move é o elétrico,
alimentado por baterias. Após o uso estas baterias devem ser conectadas em uma
tomada ligada a rede elétrica para recarregar. Veículos desta categoria possuem
uma autonomia menor (andam menos quilômetros com uma única carga completa).
Alguns modelos de última geração já possuem autonomia bem elevada como o Tesla.
Tesla Modelo S e Nissan LEAF
são dois carros totalmente elétricos mas com autonomias bem diferentes. O LEAF
pode rodar até 175km com uma carga enquanto o Tesla S pode rodar até 475 km.
Híbrido Plug-In
são
como os carros inteiramente elétricos, porém possuem um pequeno motor de
combustão que carrega as baterias. Este modelo possui a vantagem de no caso da
bateria se esgotar o motor de combustão mantém o carro em movimento até que
possa ser feita uma nova carga das baterias na rede elétrica. Esta
característica aumenta sua autonomia.
Chevrolet Volt
Híbrido não se conecta a rede
elétrica. Estes modelos possuem dois motores, um a combustão e um elétrico. Em
baixas velocidades, como no trânsito pesado, por exemplo, são os motores
elétricos que funcionam, já em altas velocidades é o motor de combustão que
assume.
O Toyota Prius foi o veículo
que deu novo impulso aos elétricos, o Ford Fusio Hybrid é a versão da Ford para
os híbridos.
Fora a recarga conectando-se
na rede elétrica ou através de um motor de combustão dentro do próprio carro
pode-se usar outras alternativas para recarregar as baterias. Um sistema muito
utilizado é transformar a energia dissipada nas frenagens em carga para a
bateria através de dínamos especialmente projetados.
Frenagem
regenerativa
Será
que o carro elétrico realmente não polui?
Um
veículo elétrico vai poluir mais ou menos com relação a um automóvel
convencional dependendo da origem da energia que o alimenta durante a recarga.
Se a
energia que chega na tomada que o recarrega for gerada por uma usina a carvão
ou petróleo a poluição gerada não será muito diferente da de um motor
convencional. Já se for gerada por usinas hidroelétricas ou a gás natural o
impacto poderá ser menor. Agora se for gerada por fontes renováveis - como
eólica, solar ou até mesmo nuclear - as emissões de gases serão muito menores
que as de um veículo convencional.
Esta
é uma conta bem complexa de ser feita, pois dependendo do local e da hora que o
veículo é carregado esta conta pode mudar, pois os sistemas elétricos são
interligados e em um dado momento a energia que chega em nossa casa pode vir de
uma hidroelétrica enquanto em outro momento pode vir de uma usina a carvão.
Um
estudo feito nos Estados Unidos sobre o impacto da poluição dos carros
elétricos em diferentes regiões do país mostra que no noroeste do país, região
que engloba estados como Washington e Oregon, os carros elétricos são menos
poluentes do que, por exemplo, na região de Illinois. Isto não se deve ao fato
dos carros em cada região serem diferentes, mas sim porque na região noroeste a
energia elétrica é gerada por meio de usinas de gás natural e nuclear, enquanto
na região de Illinois a energia é gerada principalmente por usinas a carvão.
Este
detalhe, que na maior parte das vezes passa despercebido aos nossos olhos, faz
uma grande diferença no impacto ambiental dos carros elétricos, ou seja, se
você estiver guiando um carro elétrico na região de Illinois não será tão
ecológico quanto pensa ser.
Apesar
de todas as questões referentes ao tipo de geração da energia que alimenta os
carros elétricos uma vantagem deste é que ele transfere a poluição que estaria
sendo gerada na cidade, onde existe um grande adensamento de pessoas, para um
lugar fora dela, em geral distante dos grandes centros. O impacto na saúde das
pessoas que vivem nos grandes centros urbanos é positiva neste caso.
Outro
fator que deve ser observado é com relação as baterias utilizadas por estes
veículos. A produção destas é extremamente poluente, além de possuírem uma vida
útil, tendo de ser substituídas. O descarte correto e sua posterior reciclagem
é fundamental para que a solução elétrica seja ambientalmente justificada.
Mas
os carros elétricos possuem características interessantes e inusitadas com
relação as veículos convencionais. Eles podem agir como centrais de armazenamento
de energia. Neste sentido os carros seriam carregados nos períodos de baixo
consumo energético - de madrugada, por exemplo - e poderiam devolver a energia
que sobrou durante o dia de uso para o sistema elétrico no momento que seu dono
chega em casa e o conecta na central de carga. Este tipo de integração é
gerenciado em redes chamadas Smart Grids.
Além
disso, a eficiência dos motores elétricos é de cerca de 90% enquanto o de
motores de combustão fica em torno de 40%.
Todos
estes detalhes são importantes ao avaliar o quanto um carro elétrico realmente
é ecológico e se ele é uma opção para certas regiões.
Como
anda o carro elétrico no Brasil?
Renato
Baran e Luiz Fernando Loureiro Legey destacam em seu artigo "Veículos
elétricos: história e perspectivas no Brasil" que, diferentemente
do mercado Norte Americano já saturado, o veículo elétrico no Brasil possui
grande potencial de expansão.
O
Brasil possui um enorme potencial para a adoção do carro elétrico já que a
maior parte de sua energia elétrica não vem da queima do carvão, além do
aumento de oferta das energias renováveis no sistema elétrico nacional.
Apesar
disso aqui o carro elétrico anda a passos de lesma. Algumas iniciativas
começaram tímidas como a circulação de alguns modelos elétricos na frota de táxis
em São Paulo e Rio de Janeiro em caráter experimental, mas nada muito, além
disto.
A Scientific
American Brasil, em artigo de 2010, aponta para o fato de que não existe
um interesse por parte do governo brasileiro em incentivar o carro elétrico,
pois este competiria, em tese, diretamente com o álcool e poderia influenciar
negativamente as operações de empresas controladas pelo governo, como a
Petrobras, que basicamente trabalham com o antigo combustível fóssil.
Será
que o carro elétrico é realmente uma alternativa?
Diferente
do que vemos hoje, no futuro nossas fontes de energia serão muito mais variadas
e provavelmente também muito mais distribuídas. Exemplos disto e que já estão
em andamento são a geração de energia nas próprias residências - basicamente
energia solar - ou em fazendas - através do processamento de esterco animal,
energia solar e outros. Neste contexto é provável que não apenas os carros
elétricos serão comuns mas também veículos movidos por outros tipos de
combustível, além é claro de motores de combustão híper econômicos, que com
apenas um litro de combustível poderão rodar várias dezenas de quilômetros.
Apesar
de hoje o veículo elétrico possuir certas desvantagens a evolução da tecnologia
trará novos materiais e métodos que farão o processo de construção, o
desempenho e a recarga serem mais limpos e eficientes. A adoção de fontes
renováveis em larga escala no sistema de distribuição de energia também tornará
a operação dos veículos elétricos mais limpa.
Com
certeza é necessária uma mudança global, pois a poluição, o futuro esgotamento
da reservas de petróleo e as gigantescas plantações destinadas à produção de
combustível, ao invés de alimentos, nos forçarão a seguir uma direção mais
ambientalmente sustentável.
É
provável que o carro elétrico não será o 'salvador da pátria' mas contribuirá
de modo substancial para o nosso futuro. (sermelhor)
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