quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Produção do etanol de celulose e biogás

Pesquisa feita na Unicamp propõe aliar a produção do etanol de celulose com a produção de biogás
O etanol de segunda geração, feito com a celulose existente no bagaço da cana-de-açúcar, é uma alternativa importante para aumentar a produção de biocombustível sem prejudicar as plantações de alimentos ou as áreas de preservação ambiental.
Mas como seu processo de produção é mais caro que o do etanol de primeira geração – obtido pela fermentação da sacarose do caldo de cana –, é preciso encontrar alternativas para torná-lo economicamente viável.
A proposta de um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) é aliar a produção do etanol de celulose à produção de biogás e usar os resíduos obtidos no processo como fonte de energia para as usinas.
O projeto de pesquisa “Otimização de pré-tratamento de biomassa e hidrólise para maximizar a produção de biogás a partir de resíduos agroindustriais” foi financiado pela FAPESP e realizado em parceria com pesquisadores do Institut National de la Recherche Agronomique (Inra), da França.
"O bagaço de cana que sobra da fabricação do etanol de primeira geração é hoje queimado e usado pela indústria como fonte de energia elétrica ou térmica em forma de vapor. Quando usamos esse bagaço para fabricar o etanol de segunda geração, conseguimos recuperar apenas 32% da energia que seria obtida com a queima em caldeira”, disse a engenheira química Aline Carvalho da Costa, coordenadora da pesquisa.
No modelo proposto pelos pesquisadores, foi possível recuperar cerca de 65% da energia. A vantagem é o aumento da produção de biocombustível líquido, que pode ser usado para transporte e, por isso, tem um apelo econômico maior. “Além disso, o biogás e os demais resíduos podem ser usados como fonte de energia para a indústria, substituindo o bagaço”, ressaltou Costa.
Além da celulose usada na produção do etanol de segunda geração, o bagaço de cana contém hemicelulose – substância composta por açúcares de cinco carbonos chamados pentoses – e lignina – material estrutural da planta, responsável pela rigidez, impermeabilidade e resistência dos tecidos vegetais.
Para que essa biomassa possa ser transformada em biocombustível, ela precisa passar por um pré-tratamento que separa a celulose da lignina, substância que impede a hidrólise. Esse é um dos passos mais caros e menos maduros tecnologicamente no processo produtivo do etanol de segunda geração.
Depois disso, ainda é preciso submeter a celulose à ação de enzimas que vão quebrá-la em várias moléculas de glicose para que os microrganismos consigam fazer a fermentação. Esse procedimento é conhecido como hidrólise.
“A lignina que sobra depois do pré-tratamento pode ser queimada e usada como fonte de energia. O mesmo pode ser feito com o resíduo sólido que sobra após a hidrólise. Mas, quando se fala em etanol de segunda geração, a grande pergunta é: o que fazer com as pentoses? Tivemos então a ideia de transformá-las em biogás”, conta Costa.
A pesquisadora explica que esse tipo de açúcar não pode ser usado na produção de etanol porque os microrganismos não conseguem fermentá-lo de forma eficiente.
“Microrganismos geneticamente modificados conseguiriam, mas isso exigiria uma infraestrutura de biossegurança nas usinas que tornaria a produção inviável no cenário brasileiro atual, embora isso possa mudar em longo prazo”, disse.
Palha de cana
Por meio de um processo de digestão anaeróbica, feito por um conjunto de bactérias capazes de degradar a matéria orgânica, os pesquisadores conseguiram transformar essas pentoses em biogás.
“Essa etapa da pesquisa foi realizada na França, país com muita experiência na produção de biogás a partir de vários resíduos, e contou com a participação de minha aluna de doutorado Sarita Cândida Rabelo”, disse Costa. O doutorado teve apoio de Bolsa da FAPESP.
Buscando tornar mais eficiente e barata a transformação de celulose em etanol, os pesquisadores também compararam dois tipos de pré-tratamento – um feito com cal e outro com peróxido de hidrogênio alcalino. Esse último se mostrou mais promissor, uma vez que necessita de menos tempo e não deixa resíduo na biomassa.
“Essa etapa ainda precisa ser mais amadurecida para tornar o etanol de segunda geração competitivo”, ressalta Costa. O uso de todos os resíduos do processo de produção, avalia, é provavelmente a única forma de tornar o produto economicamente viável e ambientalmente sustentável. “Nossa grande contribuição foi mostrar que o licor de pré-tratamento, rico em pentoses, tem grande potencial para produção de biogás. Embora várias alternativas de aproveitamento das pentoses venham sendo estudadas, nenhuma é ainda definitiva.”
A pesquisadora ressalta que com o etanol de segunda geração é possível aumentar muito a produção de biocombustível do país sem aumentar a área plantada de cana-de-açúcar.
Embora seja possível obter biocombustível a partir de praticamente qualquer biomassa vegetal, o Brasil tem investido no bagaço de cana por esse ser um insumo abundante e que já está na usina, dispensando gasto com transporte.
“Também pesquisamos a produção de etanol usando como matéria-prima a palha da cana, que representa um terço da planta e hoje não é aproveitada. Os resultados parciais têm se mostrado bastante semelhantes aos obtidos com a produção de etanol a partir do bagaço”, disse Costa.
Essa parte da pesquisa deu origem a um trabalho de mestrado que será defendido em março de 2012. Outras três dissertações também integram o projeto. Resultados da pesquisa foram publicados em congressos nacionais e diversas revistas indexadas, entre elas a Bioresource Technology e o Journal of Chemical Technology and Biotechnology. (EcoDebate)

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