sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Bioenergia: impactos sobre o clima

A expansão sustentável da produção de etanol exige avaliações precisas sobre as mudanças no uso do solo em áreas que passam a ser ocupadas por culturas voltadas à geração de bioenergia. Já se sabe, por exemplo, que quando a cana-de-açúcar substitui culturas agrícolas anuais como a soja, o impacto na emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) oriunda da alteração da vegetação é relativamente neutra. Mas quando a cana ocupa áreas de culturas perenes, como café e laranja, as emissões crescem. No caso de florestas nativas o aumento é ainda maior. Já o plantio de cana em áreas de pastagens degradadas, ao contrário, resulta em balanço favorável de emissões de GEE.
Entretanto, muitas incertezas ainda rondam as pesquisas sobre esse tema. Essas questões, assim como os avanços científicos relacionados, foram abordados no Workshop on Quantifying and Managing Land Use Effects of Bioenergy, promovido pelo Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), em Campinas, entre os dias 19 e 23 de setembro.
Um dos aspectos mais controversos, segundo os participantes do evento, são as mudanças indiretas no uso da terra (ILUC, na sigla em inglês) que ocorrem quando uma cultura agrícola voltada à produção de bioenergia substitui, por exemplo, áreas de pastagem. Como a demanda por carne continuará a existir, a tendência é que haja um deslocamento da criação de bovinos para outra região ou País, gerando uma cadeia de efeitos que poderá resultar em desmatamento de florestas nativas e emissões de GEE em outras áreas. Estudos sobre esse complexo fenômeno econômico e ambiental ganharam destaque na agenda internacional quando agências governamentais dos EUA e da União Européia incluíram modelos matemáticos em avaliações sobre a sustentabilidade dos biocombustíveis.
Helena Chum, brasileira que atualmente trabalha no National Renewable Energy Laboratory (NREL), parceiro do CTBE, explicou que os modelos iniciais utilizados pelas agências internacionais careciam de maior sofisticação para reproduzir a realidade de forma adequada. “No caso Brasil, o território foi modelado como tendo apenas florestas nativas e terras agriculturáveis. Não foi incluída na análise a grande quantidade de pastagens degradas existentes, o que gerou o resultado absurdo de cerca de 0,8 hectares de desmatamento na Amazônia para cada hectare usado para produzir etanol de cana”, contou Chum.
Para os pesquisadores presentes ao Workshop do CTBE, os modelos matemáticos atuais estão mais robustos, mas ainda necessitam de aprimoramento para mensurar adequadamente a complexidade das mudanças indiretos no uso da terra. “O modelo ideal teria que contemplar a distribuição do uso da terra em todo o mundo num período de, pelo menos, cinco anos. Teria também de considerar o manejo do solo em cada região, a rotação de cultura, o plantio e a colheita, etc.”, explica Chum.
O Brasil possui um modelo próprio para mensurar as mudanças no uso da terra para bioenergia, o Brazilian Land Use Model (BLUM), desenvolvido pelo Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (ICONE) e que está sendo aperfeiçoado com o apoio do CTBE. “Colocaremos um profissional no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) para contribuir com a aceleração do processo de aquisição e interpretação de imagens de satélite sobre mudança no uso da terra”, disse o diretor de sustentabilidade do CTBE, Arnaldo Walter.
Novas frentes de estudo - O Workshop promovido pelo CTBE também sediou reuniões periódicas de três grupos de estudos da IEA (International Energy Agency) Bioenergy. Concluiu-se que a bioenergia é apenas um dentre os inúmeros fatores sociais e econômicos que causam as mudanças no uso da terra e que análises eficientes deveriam compreender tais alterações como eventos localizados regionalmente, dentro de condições socioeconômicas específicas.
O debate sobre as mudanças no uso do solo para a bioenergia também possui outras vertentes a serem exploradas: um modelo matemático apresentado por Klaus Peter Zulka, da Environment Agency Austria, mostrou que terras agriculturáveis, convertidas para a produção de biocombustível na Áustria, têm sua riqueza de espécies reduzida de 3% a 14%, dependendo do grupo de organismos analisados.
Já outra pesquisa da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês), apresentada por Holger Matthey, mostrou que a pressão por terra para a produção de alimentos continuará a crescer na próxima década, principalmente por conta do aumento da população mundial e do crescimento econômico de países populosos como Brasil, China, Índia e Rússia, os BRICS. No caso dos biocombustíveis, a FAO pressupõe que o etanol de cana-de-açúcar é o que mais vai ser expandido na próxima década, já que a produção de etanol de milho norte-americana, por conta de um mandato do país, não ultrapassará 15 bilhões de galões por ano até 2022. (ambienteenergia)

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