O Intergovernmental Panel on
Climate Change - IPCC da Organização das Nações Unidas recomendou que os países
limitem em dois graus célsius o aquecimento global, para evitar maiores
catástrofes ambientais. A COP21, que ocorreu na França, sugeriu que US 14,5
trilhões sejam investidos em energias renováveis até 2040 para se chegar a essa
meta.
De acordo com o artigo
America’s Unconventional Energy Opportunity da Harvard Business Review, até
2040, as energias renováveis serão 66% de novas capacidades de
geração elétrica instaladas e responsáveis por US 12,2 trilhões investidos.
Além disso, não serão mais as políticas públicas as direcionadoras do aumento
do grid, serão as empresas e os negócios. Os custos dos projetos de energia
elétrica solar reduzirão em 48% até 2040, pois irão ocorrer melhorias nas
condições de financiamento e também em razão da aprendizagem organizacional das
empresas do setor. Em 2030, praticamente em todo o globo, a energia
fotovoltaica centralizada vai ser a fonte elétrica mais vantajosa.
Segundo o Relatório Crossing
the Chasm do Deutsche Bank, a expectativa é que a fonte solar se torne cada vez
mais competitiva em relação a energia da rede, os custos da geração solar sem
subsídios variam entre US 0,08 e 0,13 por kWh e são entre 30 e 40% mais baratos
do que o preço da energia elétrica de varejo em muitos país. Até 2045, mais de
100 milhões de novas conexões de energia fotovoltaica irão ocorrer, uma adição
de mais de US 4 trilhões, ou seja, em todo o globo 10% da geração de energia
elétrica será solar. Até 2050, a fotovoltaica irá ser, aproximadamente,
responsável por 30% da geração elétrica a nível mundial.
Em 2016, de acordo com o
National Solar Jobs Census, nos EUA, existem mais de 260 mil trabalhadores no
segmento de energia
solar, um aumento de 25% em relação a 2015. Os trabalhos solares aumentaram
em pelo menos 20% por ano, nos últimos quatro anos. Um em cada 50 novos
empregos nos EUA são na indústria solar, representando 2% de todos os novos
empregos. Há mais de 530 mil empregos relacionados a energias renováveis nos
EUA, 43 mil em energia nuclear e 1 milhão de vagas com vinculação aos
combustíveis fósseis. Dentre as renováveis, a fotovoltaica lidera o crescimento
nas vagas de emprego. Existem, aproximadamente, o dobro de postos de trabalho
em energia solar em relação a indústria de carvão. O segmento de energia
fotovoltaica é intensivo em mão-de-obra, pois os trabalhos de montagem e de
assistência ao cliente demandam muitas pessoas, mais do que na extração de
carvão.
Além disso, o segmento de
energia fotovoltaica enquanto geração distribuída é descentralizado e com
características para a viabilidade de negócios que o fazem ser local. Neste
sentido, as empresas conseguem custos menores e maior competitividade atuando
de forma regional, não se vê muitos casos de empresas com abrangência nacional
que atuam de forma verticalizada neste setor. No segmento de energia solar
distribuída, a usina é da família ou empresa que gera a energia, ela é a
própria investidora. Portanto, também se descentraliza a economia da geração de
eletricidade. Isto significa também descentralizar o capital, através da troca
do fornecedor de energia, a família ou a empresa passa a produzir a própria
eletricidade e a acumular o seu capital, devido a rentabilidade em forma de
economia que se estaria gastando ao comprar energia da concessionária, a
distribuidora e vendedora de energia.
Percebe-se que há uma mudança
de direção para um formato descentralizado no setor de energia elétrica. Devido
aos incentivos e às pressões provindas dos acordos assinados entre países com o
intuito de limitar o aquecimento global, muito capital será direcionado para as
energias renováveis, em especial para a fotovoltaica, nos próximos anos. Desse
modo, como o Brasil pode se beneficiar dessa onda de desenvolvimento? Essa
mudança ainda não chegou nem perto de seu ápice, mas demandará preparo para
aquelas nações e firmas que queiram criar riqueza nesse setor.
Comparativamente, outro país
que também está no grupo dos BRICS, que está passando por uma transformação
energética é a China, mas por lá, o processo está ocorrendo rapidamente. O
ponto é que a as empresas chinesas vêm desenvolvendo as tecnologias relacionadas
ao sistema fotovoltaico há anos. Atualmente o país colhe os frutos de um
processo cumulativo, lento e gradual. Além de poder transformar a sua matriz
energética, a China é capaz de exportar a sua tecnologia. O desenvolvimento
tecnológico é um processo moroso, que não ocorre rapidamente, mesmo com muita
injeção de capital, pois, outros recursos como infraestrutura de pesquisa e
pesquisadores, não são transferidos rapidamente como o capital é. Os chineses
estão se beneficiando de décadas de estudos e investimento, podendo utilizar a
sua gigantesca demanda doméstica para impulsionar as suas empresas e para
competir no mercado mundial.
Percebe-se que há uma
tendência de que muitos investimentos sejam direcionados para as renováveis nas
próximas décadas, mas como fazer com que a nossa nação se beneficie de fato
disso. Fazer com que a população sinta os frutos dessa riqueza, esse é o grande
ponto. Pesquisadores como Edquist, Nelson, Porter, Dosi, Etzkowitz, Lundvall e
Freeman se dedicam há décadas, toda uma vida acadêmica, para compreender o
processo de desenvolvimento e a geração de riqueza por parte de empresas e
nações. Neste sentido, com base nesses autores, vou propor um modelo para que
nossas empresas e população possam se beneficiar do crescimento do setor de
energia fotovoltaica e não apenas poucos investidores nacionais e
internacionais. O segredo para a criação de riqueza é a inovação, mas isso
demanda paciência e dedicação multilateral.
As inovações consideram a
resolução de problemas e de necessidades sociais por meio da invenção e uso de
produtos e serviços. Mesmo que as condições de avanços tecnológicos apareçam de
maneira externa às firmas, como em universidades e centros de pesquisas, são as
empresas que internalizam os processos e fazem o efetivo uso das invenções,
transformando-as em técnicas produtivas e em novos produtos, formatando a
estrutura do segmento industrial. Schumpeter, um dos mais prestigiados
economistas de todos os tempos, considera que o desenvolvimento é um fenômeno
que ocorre por meio de ciclos intercalados de perturbação e de equilíbrio dos
fatores produtivos. O financiamento é um dos principais fatores produtivos, é o
impulso primário que constitui e suporta o capitalismo, precedendo a criação de
novos bens e métodos produtivos ou novos mercados, determinando o formato
industrial.
O principal a se emprestar da
teoria Schumpeteriana é que existem ciclos tecnológicos de desenvolvimento, que
são temporais e passageiros. Portanto, como explicitado no início do artigo,
vivemos em um momento ímpar de direcionamento de capital para o avanço da fonte
fotovoltaica no mundo, e o Brasil, deveria pegar parte desses
"marketshare". Tudo tem a ver com o tempo de resposta de nosso país,
não somente na geração de negócios, mas nos investimentos em inovação que serão
feitos.
Para se conseguir parte desse
mercado, para que as empresas venham desenvolver inovação no Brasil e para que
startups inovadoras nasçam e prosperem por aqui, deve-se criar as condições
para o estabelecimento de um Sistema Nacional de Inovação de Energia
Fotovoltaica. Este conceito considera que as inovações são a fonte da
transformação econômica e da geração de riqueza. Assim, tecnologias sociais,
como leis e normas, em um setor novo como o de energia solar, pavimentam o
caminho para que as tecnologias físicas sejam criadas. Um exemplo claro foi a
RN 482/2012 da ANEEL, que viabilizou o nascimento da Geração Distribuída (GD)
no pais, gerando algumas poucas inovações e milhões de reais em novos negócios,
antes inexistentes.
As empresas refletem as
condições e desafios possibilitadas pela matriz institucional de uma nação.
Portanto, por exemplo, se as instituições permitem que exista pirataria, que
façam produtos sem criação de conteúdo nacional, muitas organizações passarão a
fazer negócios dessa forma. Em contrapartida, caso o quadro institucional
ofereça prêmios por boa conduta e punições contra esse tipo de ações, assim
também irão se moldar as empresas.
O modelo aqui proposto é de
maior conexão entre os agentes das organizações universitárias, empresariais e
governamentais. Além disso, posturas devem ser mudadas e uma mentalidade de
geração riqueza instituída. É fundamental que exista uma fusão entre esses três
entes, facilitada por locais de coexistência, como é o caso dos parques
tecnológicos, onde há incubação de empresas com o auxílio de centros de
pesquisa e de agências governamentais. As universidades devem expandir as suas
capacidades para o empreendedorismo, visando claramente a criação de empresas
spin-offs. Deve-se deixar de lado a postura de que ciência não toma partido,
que é neutra e não pode receber apoio financeiro de empresa, isso não existe
nas economias desenvolvidas e é um pensamento desconectado com a realidade.
Quem gera riqueza na sociedade são as empresas, por meio do lucro, o governo só
é capaz de redistribuí-la!
Este formato de
desenvolvimento ressalta o papel da indústria do conhecimento na infraestrutura
político-econômica. Sendo assim, propõe-se as seguintes medidas para avanços
tecnológicos em energia fotovoltaica no país, visando o estabelecimento de um
Sistema de Inovação em Energia Fotovoltaica:
1. Pesquisa e
desenvolvimento, voltados à formação de competências técnicas.
2. Criação de mercado para
novos produtos e serviços.
3. Articulação entre o
governo e as empresas para se estabelecer parâmetros de qualidade.
4. Promoção institucional do
networking frequente entre os agentes.
5. Mudanças e evoluções
regulatórias e institucionais.
6. Criação e fortalecimento
com capital público e privado de parques tecnológicos e de atividades de
incubação de startups.
7. Acelerar para que existam
logo novas condições de financiamento de produtos, serviços e, principalmente,
pesquisa.
8. Fortalecimento e a promoção,
por parte do governo, da criação de serviços de consultoria especializados.
9. Uso de tecnologia de ponta
em projetos piloto, se essas tecnologias ainda não forem viáveis
economicamente.
10. Transformação da postura
de professores e reitores, para uma aceitação e utilização do capital privado
largamente em pesquisas.
11. Mudança drástica das leis
e normas que regem os contratos dos professores de universidades públicas,
permitindo que eles trabalhem e sejam remunerados por empresas.
12. Valorização do processo
de patentes, liberdade para os pesquisadores patentear e direcionamento dos
frutos das descobertas para os pesquisadores.
13. Concessão de benefícios
fiscais para a criação de institutos privados de pesquisa, também por meio de
convênio com fundações existentes.
14. Maior divulgação das
redes de pesquisa e inovação no meio empresarial, como o Portal da Inovação do
MCTI.
15. Criação de Conselhos de
Inovação Estaduais por segmento, capitaneados pelo governo estadual e com
reuniões frequentes entre acadêmicos, políticos e empresários, voltadas a
fortalecer o diálogo e a aproximação entre eles.
Nota-se que muitos agentes do
segmento de energia solar se conhecem e possuem relações. Entretanto, ainda
falta por parte das agências governamentais a criação de um espaço para esse
mútuo convívio. Essas ações propostas vão à direção de não aceitar que os
players mundiais venham se beneficiar do mercado nacional, que simplesmente
tragam produtos prontos e não deixem qualquer legado de inovação no país.
Se
não existir essa rápida articulação entre empresários, governantes e acadêmicos
o setor fotovoltaico se tornará como o de automóveis. Iremos perder o
"timing" da criação de inovações nessa indústria e teremos somente
montadoras de peças do sistema fotovoltaico, sem o devido represamento da
riqueza gerada dentro de nossas fronteiras. (portalsolar)
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