Com aumento da demanda,
energia nuclear deve atingir níveis recordes em 2025, embora seus riscos
desafiem o status de “energia limpa”. China é maior impulsionadora do modelo. A
energia nuclear não libera emissões de carbono durante sua produção, vantagem
que tem alavancado o modelo como uma solução limpa para suprir a demanda de
energética, que cresce em ritmo acelerado em todo o mundo.
Contudo, embora não polua da
mesma forma que os combustíveis fósseis, a energia nuclear tem seu próprio
conjunto de problemas ambientais. Entre eles, as emissões indiretas liberadas
pela extração do urânio, o acúmulo de resíduos radioativos e o risco de
contaminação da água ou da ocorrência de um desastre como o de Chernobyl.
Apesar dos riscos, a Agência Internacional de Energia (AIE) projeta que a energia nuclear vai representar quase 10% da produção global de eletricidade em 2025 – o maior nível em 30 anos.
Crise climática traz uma nova chance para a energia nuclear
Segundo Fatih Birol, diretor
executivo da AIE, esse crescimento foi liderado pela China, impulsionado em
parte para suprir a demanda energética de grandes centros de dados e de
tecnologias como a inteligência artificial (IA).
Nos últimos meses, os gigantes da tecnologia Meta, Amazon, Microsoft e Google anunciaram planos de investir em energia nuclear sob a bandeira da neutralidade carbônica – apesar de antes terem prometido apostar exclusivamente de energias renováveis. E com a pressão crescente para se reduzir as emissões de gases de efeito estufa, alguns formuladores de políticas também se manifestaram a favor de um novo impulso para o modelo.
Energia nuclear é menos destrutiva do que se imagina, segundo especialista em clima e energia
Sabe como será a cara do
mundo caso a temperatura média da Terra aumentar mais 4ºC nos próximos anos?
Mais de um terço da população será afetado.
Energia nuclear é uma solução
climática realista?
Quase dois anos depois de a
Alemanha fechar seus últimos reatores nucleares, os partidos União Democrata
Cristã e Social Cristã (CDU/CSU) de oposição conservadora, pediram mais
pesquisas sobre a tecnologia nuclear.
De olho nas eleições federais
alemãs em fevereiro, seu manifesto eleitoral da afirma que a energia nuclear
“tem um papel importante a desempenhar, especialmente no que diz respeito às
metas climáticas e à segurança de abastecimento”.
Friedrich Merz, candidato a
chanceler federal pela CDU, descreveu o fechamento dos reatores alemães como um
“erro estratégico”, mas diz que não é realista pensar em reativar agora as
usinas desligadas.
Outras siglas querem examinar a possibilidade. A ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD), por exemplo, está pressionando pelo retorno à energia nuclear, como parte de uma “combinação de energia sustentável e séria”. Em entrevista recente à emissora alemã ZDF, a candidata do partido à chefia de governo, Alice Weidel, afirmou que a energia nuclear tem “uma pegada zero de CO2”.
A coalizão governamental do chanceler federal alemão Olaf Scholz, hoje composta pelos social-democratas e verdes, descarta o retorno à energia nuclear, que também envolve emissões carbônicas indiretas ao longo do complexo processo de construção dos reatores.
Henry Preston, porta-voz da
Associação Nuclear Mundial (WNA), acredita que os formuladores de políticas se
tornaram mais “pragmáticos” nos últimos anos, equilibrando a segurança
energética e a emergência climática, enquanto pesam o aumento do custo e do
cronograma de construção de um reator nuclear com o potencial de produzir uma
“enorme quantidade” de energia limpa.
Grupos ambientalistas têm
apontado que os novos e caros projetos nucleares, que normalmente levam cerca
de uma década para ser construídos após todo o processo de planejamento e
licenciamento, não entrarão em operação a tempo de cumprir as metas climáticas.
“Uma transição rápida requer
o uso de tecnologias e soluções existentes que possam ser implementadas mais
rapidamente, como as energias renováveis, principalmente a solar e a eólica,
além de eficiência energética e flexibilidade sistêmica”, frisou a Climate
Action Network Europe, uma organização global de defesa do clima, em publicação
online.
“As energias renováveis superam consistentemente a nuclear em termos de custo e velocidade de implantação e, portanto, são escolhidas em vez da energia nuclear na maioria dos países”, consta do Relatório de Status da Indústria Nuclear Mundial de 2024 (WNISR), que considera “irrealistas” os planos de aumentar a capacidade nuclear.
Reatores modulares pequenos são alternativa mais segura?
Nos Estados Unidos, a Amazon
e a Google planejam comprar energia de pequenos reatores modulares (SMRs), que
funcionam como usinas nucleares avançadas com capacidade inferior a 300
megawatts, cerca de um terço de uma usina nuclear padrão.
As gigantes da tecnologia
afirmam que a energia nuclear ajudará a suprir as necessidades energéticas da
inteligência artificial e dos centros de dados. Atualmente, essas tecnologias
consomem entre 1% e 3% do suprimento mundial de energia – parcela que alguns
analistas contam dobrar até 2030.
Os centros de dados precisam
de “uma abundância de energia que seja livre de carbono e confiável a cada hora
do dia, e as usinas nucleares são as únicas fontes que podem cumprir essa
promessa de forma consistente”, disse em setembro Joe Dominguez, diretor
executivo da Constellation Energy nos EUA, ao anunciar um acordo de
fornecimento de energia nuclear de 20 anos com a Microsoft.
Os defensores afirmam que os SMRs serão mais seguros e mais baratos, e sua integração à rede mais rápida do que os reatores tradicionais, podendo ser construídos nos locais de antigas usinas de combustíveis fósseis. As parcerias da Amazon e da Google nos EUA para a implementação da tecnologia devem estar operacionais no início da década de 2030.
Energia nuclear é “energia verde”?
Ambientalistas:
“promessas vazias”
Mas a Climate Action Network
rebate o que classifica de “promessas vazias” dos SMRs, pois “a tecnologia
ainda não foi testada em escala comercial”. Em nível global, apenas dois
projetos de SMR foram construídos até o momento, cada um com reatores de
diferentes padrões russos e chineses. Eles foram conectados à rede em 2019 e
2021, respectivamente.
O relatório WNISR 2024,
financiado em parte pelo Ministério do Meio Ambiente da Alemanha, apontou que
ambos os projetos sofreram atrasos significativos na construção, levando duas
ou três vezes mais tempo para ser construídos do que o planejado. Eles também
ultrapassaram o orçamento e, até o momento, não tiveram bom desempenho na
geração de energia.
Segundo o setor nuclear, no
entanto, os atrasos não foram surpresas, pois os primeiros SMRs construídos na
Rússia e na China eram projetos-piloto. Os futuros, agora em fase de
planejamento, poderiam “entrar em operação mais rapidamente”, disse Preston, da
Associação Nuclear Mundial.
Mas Mycle Schneider, analista
independente de políticas nucleares e editora do WNISR, lembra que isso só
seria possível com a “reprodução de unidades idênticas ou praticamente
idênticas”, e não com SMRs de padrões diversos, como acontece na Rússia e na
China.
Schneider entende que o rápido aumento da produção de painéis solares, baterias conectadas à rede e turbinas eólicas, com dezenas de milhares de unidades construídas a cada ano, representa uma “fabricação verdadeiramente modular”, permitindo que esses setores inovem e reduzam rapidamente os custos: “O setor nuclear aprendeu com os projetos pilotos de SMR na China e na Rússia que ninguém quer reproduzi-los, e não há tentativas de licenciá-los em nenhum país ocidental”.
Falta de investimentos e consenso impedem avanço da energia nuclear no Brasil.
Em meio ao debate sobre a
retomada da usina de Angra 3, governo enfrenta desafios para a conclusão do
projeto.
É preciso energia nuclear
para atingir as metas climáticas?
Na conferência climática
COP28, de 2023, em Dubai, a energia nuclear foi listada pela primeira vez entre
as tecnologias de baixa emissão necessárias para alcançar as “reduções
profundas, rápidas e sustentadas nas emissões de gases-estufa”.
O relatório de 2022 do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU também mencionou a energia
nuclear, dizendo que era “improvável que todos os sistemas de energia de baixo
carbono em todo o mundo dependam inteiramente de fontes de energia renováveis”.
Embora admitam que a energia
eólica e a solar devam desempenhar um papel importante no esforço para
substituir os combustíveis fósseis, os especialistas em energia costumam
ressaltar a falta de confiabilidade da energia renovável que depende da
disponibilidade do sol e do vento.
Desde a COP28, 31 países – entre eles protagonistas nucleares como França, Reino Unido, Estados Unidos e Japão – se comprometeram a triplicar sua capacidade dessa energia até 2050. Estados não nucleares, como El Salvador, Jamaica, Moldávia e Mongólia, fizeram o mesmo.
A energia nuclear é melhor do que a solar e a eólica?
No entanto, o WNISR 2024 é
cético em relação a essa promessa. Listando uma série de possíveis obstáculos,
incluindo altos custos, tempo de construção e falta de capacidade industrial, o
cálculo é que seriam necessários mais de mil novos reatores para triplicar a
capacidade instalada atual. (msn)
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