sábado, 16 de janeiro de 2010

Desperdício de energia chega a R$ 16 bi por ano no país

Perda ocorre apesar de consumidor bancar pesquisas, com quase R$ 5 bilhões destinados pelas contas de luz.
Nos últimos dez anos, o consumidor brasileiro desembolsou quase R$ 5 bilhões na conta de luz para bancar projetos de eficiência energética e de soluções para melhorar a operação do sistema elétrico nacional. Até agora, no entanto, os resultados são questionáveis. O País continua desperdiçando cerca de R$ 16 bilhões por ano de energia elétrica, equivalente ao investimento total para a construção da Hidrelétrica de Belo Monte (PA). Além disso, nos últimos anos, a qualidade da energia entregue aos consumidores tem piorado consideravelmente em algumas distribuidoras.
Dos R$ 16 bilhões de eletricidade desperdiçada, R$ 7,3 bilhões referem-se a furtos, fraudes e erros de medição. Só nesse caso, a quantidade de energia perdida, de 23 mil MWh, poderia abastecer por um ano 19 milhões de residências com consumo médio de 100 kWh/mês. Os outros R$ 8,7 bilhões referem-se a perdas ocorridas durante a transmissão da energia, da usina até o consumidor final.
A redução desses prejuízos, que também oneram o bolso dos brasileiros, foi um dos principais motivos da lei criada pelo governo federal, em 2000, que tornou obrigatório o investimento de 1% da receita líquida em P&D e eficiência energética. Parte desse dinheiro vai para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), do Ministério de Ciências e Tecnologia.
Outra parcela fica no Ministério de Minas e Energia e banca, entre outras coisas, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que produz os estudos de novas usinas para o País. O restante fica nas empresas (distribuidoras, geradoras ou transmissoras), para a elaboração de projetos de pesquisa e inovação. Só em P&D, as companhias desenvolveram 4.521 projetos até o ano passado.
O grande problema é que todo esse volume de projetos não tem se traduzido, na maioria dos casos, em melhoria para a população que usa o serviço público. Segundo especialistas, o dinheiro tem sido mal usado em muitas companhias por falta de uma política adequada. Prova disso, é que as empresas não conseguem gastar todo o dinheiro destinado à pesquisa.
Segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), do total reservado para investimentos em P&D e eficiência energética, entre 2000 e outubro deste ano, R$ 1,92 bilhão (sem correção dos juros) ainda não havia sido gasto pelas empresas. Isso representa 42% do volume total "recolhido" desde 1998.
"De fato, as empresas têm dificuldade para gastar todo o dinheiro, pois não são especializadas em pesquisas. Sua atividade é gerar, transmitir e distribuir energia", observa o diretor da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Edson Carneiro. Segundo o executivo, não basta ter um projeto de qualidade. Ele também precisa se encaixar na receita determinada.
O engenheiro Marcus Vinicius do Nascimento, diretor de uma empresa de transmissão, admite que há dificuldade para fazer a prospecção de programas de inovação. "Estava num ponto de deixar minha atividade de lado para procurar projetos de P&D. Por isso, decidimos contratar uma consultoria para fazer esse trabalho pra gente", diz ele, destacando que a legislação ficará mais rígida a partir do ano que vem.
Antes, completa o engenheiro, era possível deixar o dinheiro provisionado na conta de P&D enquanto não se encontrava um projeto. Agora, a Aneel não permitirá que esse valor supere duas vezes a receita de um ano. "Vemos de tudo no setor, programas bons e medíocres", completa Carneiro, que reivindica um novo modelo para aplicar o dinheiro.
QUESTIONAMENTO
O fato é que depois de dez anos, desde a privatização, muita gente começa a questionar o resultado dos programas realizados até agora. O professor da Unicamp, Gilberto Jannuzzi, acompanhou por alguns anos os projetos.
Segundo ele, normalmente as empresas tendem a apostar em programas que servem a seus interesses, agregam valor à concessão, mas não deixam claro qual o benefício para o consumidor. "É ótimo que uma empresa desenvolva tecnologias para o carro elétrico. Mas, lá na frente, ela vai patentear isso no nome dela. E aí não fica claro qual será o retorno para o consumidor que financiou isso."
Na opinião dele, a ideia de destinar uma parte do dinheiro das empresas para pesquisa e desenvolvimento é "fenomenal". "Mas as estruturas são frágeis, cheias de buracos. Já era tempo de ver algum resultado de todos esses projetos", avalia Jannuzzi. Outro problema é o fato de várias empresas pesquisarem a mesma coisa, mas com rumos diferentes. "Isso não leva a nada. Ninguém ganha."
O professor da Unicamp destaca ainda que seis ou sete companhias no Brasil têm um orçamento que impressiona e que permite a elaboração de um bom programa. "As demais 64 concessionárias ficam com um monte de dinheiro picadinho, que não dá pra fazer um grande projeto. Se juntasse todos esses recursos seria possível investir em problemas-chave do setor."
Para o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco), José Starosta, a busca pela eficiência tem de continuar, pois o desperdício é enorme. "Se não fosse esse dinheiro, estaríamos bem pior", diz.

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