Vinte e cinco anos após o acidente radioativo em Goiânia, vítimas e
trabalhadores envolvidos com a limpeza dos locais contaminados com césio-137 ainda
brigam na Justiça para ter acesso a indenizações e medicamentos. Os remédios
que combatem as doenças decorrentes da radiação não são distribuídos há quase
dois anos.
Hoje, cerca de 500 vítimas do acidente recebem pensão do Estado e só 164
têm assistência médica do Centro de Assistência aos Radioacidentados (Cara).
Desde novembro de 2010, porém, foi cortada a verba do centro por uma questão
burocrática - os R$ 10 mil mensais para a compra dos medicamentos são um valor
muito baixo para que seja feita uma licitação pública.
"Usávamos um fundo rotativo criado para compras emergenciais, mas,
como era de uso contínuo, fomos proibidos", diz André Luiz Souza,
diretor-geral do Cara. Segundo ele, o centro aguarda um parecer da Casa Civil.
"Esperamos resolver o problema até o fim de outubro."
O acidente, em 13 de setembro de 1987, teve início com o roubo de um
antigo aparelho de radiografia, alojado no terreno onde antes funcionara um
hospital. Dias depois, a peça de chumbo foi aberta por Devair Alves Ferreira,
dono de um ferro-velho. Maravilhado com o brilho do pó azul contido em uma
cápsula no interior do aparelho, Devair chamou vizinhos e a contaminação se
espalhou por Goiânia. O caso só chegou às autoridades duas semanas depois.
Irmão de Devair, Odesson Alves Ferreira é um dos afetados pela ausência
dos medicamentos. "Tenho um problema de próstata relacionado à
contaminação e tive de parar de tomar a medicação, que custava R$ 300 por
mês." Presidente da Associação de Vítimas do Césio-137 (AVCésio), Odesson
afirma que as pensões não contemplam todas as vítimas. "Entre 1,5 mil e
1,6 mil pessoas foram afetadas", afirma.
Vítimas. Em 2002, o Estado de Goiás reconheceu estudos que evidenciaram
doenças em trabalhadores que haviam feito a limpeza das áreas contaminadas,
determinando indenizações.
O promotor Marcus Antônio Ferreira Alves, do Centro Operacional de
Defesa do Cidadão, reclama da lentidão. "Esses servidores não foram
contaminados por acidente. Era uma operação de guerra e exigiu procedimentos
emergenciais, mas esses trabalhadores depois foram abandonados pelo
Estado", diz.
Segundo ele, entre 900 e 1.000 pessoas foram afetadas, entre policiais,
bombeiros e funcionários da Consórcio Rodoviário Intermunicipal (Crisa),
estatal convocada para ajudar na limpeza dos rejeitos radioativos. "Todo
mundo que comprovadamente trabalhou a mando do Estado e posteriormente teve
doença crônica tem direito a indenização."
A diretoria da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), que liderou
o trabalho de isolamento e limpeza da área em Goiânia, afirma que houve
preocupação com os trabalhadores. "Antes de o caminhão ser transportado,
havia avaliação dos técnicos. E o tempo de exposição dos servidores era calculado
para que a dose ficasse abaixo dos níveis toleráveis", afirma Ivan Salati,
diretor da Cnen. "É difícil fazer uma relação entre a exposição e o
aparecimento de doenças. É improvável que, depois de vários anos, uma pessoa
sinta dores nas costas e haja relação com a radiação." (OESP)
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