sábado, 24 de novembro de 2012

Instabilidade do sistema energético brasileiro

Instabilidade do sistema cresce com construção de usinas
Fontes renováveis de energia reduzem a emissão de carbono, mas também comprometem a segurança pela sua complexidade, o que pode resultar em mais ‘apaguinhos’
Hidrelétrica de Belo Monte: sem represa para água. Discussão é a volta de grandes reservatórios
A manutenção do título de melhor matriz energética do mundo não sairá de graça para o Brasil. Se por um lado a forte participação das fontes renováveis significará redução das emissões de carbono, por outro tornará o sistema nacional mais instável e sua operação, bem mais complexa. Sem um bom planejamento, o país ficará mais exposto aos “apaguinhos”, que se tornaram frequentes nas últimas semanas.
A explicação para isso é a construção de grandes usinas, sem reservatório, distantes milhares de quilômetros dos centros urbanos, e uma série de pequenas centrais elétricas, como as eólicas e as usinas de biomassa. A expectativa é que até 2021 o Brasil mantenha os atuais 84% da matriz elétrica com fontes renováveis. Mas o mix de usinas será diferente. A participação das hidrelétricas vai cair de 72% para 64%.
As pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e as usinas de biomassa continuarão com 4% e 7%, respectivamente. A diferença virá das eólicas, que passarão de 1% para 9% até 2021, prevê o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim:
— Com esse novo desenho, a operação do sistema muda. Era mais simples. Ficará mais complexa.
Um dos principais motivos para a mudança está nas restrições para construir hidrelétricas com reservatório, as chamadas usinas a fio d’água. Por questões ambientais, a maioria não tem represa, como as hidrelétricas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio. Isso significa que o Brasil está perdendo capacidade de poupança para suportar períodos com poucas chuvas.
Dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) mostram que, em 2001, a capacidade dos reservatórios era suficiente para atender a seis meses de carga de energia de todo o sistema interligado nacional. Em 2009, o volume já tinha caído para cinco meses. E, em 2019, será suficiente para apenas três meses.
— Ninguém quer construir um reservatório de qualquer jeito. Mas não podemos simplesmente eliminar a possibilidade de construir uma hidrelétrica com reservatório. Ao menos precisamos calcular qual o custo ambiental. Hoje nem isso é permitido fazer — afirma o presidente da consultoria PSR, Mario Veiga, um dos maiores especialistas no setor, reconhecendo, porém, que o mix de energia renovável, com hidrelétricas, eólicas e biomassa, é muito bom.
Fontes renováveis dependem do clima
É no período mais seco que as eólicas e as usinas de biomassa têm o maior potencial de produção, explica Tolmasquim. A safra de cana-de-açúcar ocorre entre maio e novembro, e os ventos são mais fortes também nessa época.
— Enquanto essas unidades produzem mais energia, estocamos água nos reservatórios. Elas têm um papel sustentável incrível — diz.
Por outro lado, as três fontes de energia são muito dependentes das condições climáticas.
— Seria muito arriscado depender apenas das condições climáticas. Precisamos ter backup — argumenta o presidente da EPE.
Com menos reservatórios, o país terá de acionar mais térmicas para complementar a produção de energia elétrica. É o que está ocorrendo neste momento. O ONS decidiu, no fim de outubro, pôr todas as térmicas disponíveis no Brasil para funcionar por causa do período seco.
Sem chuvas suficientes, os reservatórios de algumas regiões, como Sudeste e Centro-Oeste, estão no menor nível desde 2000, antes do racionamento. Para evitar que o problema piore, o ONS não teve escolha e acionou até mesmo as térmicas movidas a óleo combustível, diesel e carvão, bem mais caras e poluentes.
Hoje, cerca de 11 mil megawatts (MW) de energia térmica estão em operação no sistema. O preço do megawatt-hora (MWh) gerado pelas térmicas a óleo varia entre R$ 310,41 e R$ 1.047,38, segundo relatório do ONS. As térmicas a gás, que já estão em operação, têm custo entre R$ 6,27 e R$ 401,67; e as movidas a carvão, entre R$ 56,34 e R$ 341,89.
— Não temos alternativa. Sem reserva suficiente, temos de usar as térmicas. O problema é que elas são caras — avalia Erico Evaristo, membro do Conselho da Bolt Energias.
Ele observa que uma saída seria incrementar a matriz elétrica com termelétricas movidas a gás natural. Mas, no momento, a Petrobras, principal produtora, não tem oferta suficiente para atender à demanda. Parte das usinas movidas a gás em operação funciona com gás natural liquefeito (GNL) importado, bem mais caro.
Sol é a fonte de energia do futuro
Para o presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), Carlos Faria, a matriz energética brasileira é invejável:
— Por isso, não podemos usá-la pela metade. Os reservatórios são um mal necessário. Não tem outra forma de regularizar o sistema, deixá-lo mais estável.
A nova promessa é a energia solar. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) acaba de aprovar novas regras que preveem, por exemplo, que o consumidor que instalar placas solares em sua residência e não consumir toda a energia produzida, terá o restante repassado à distribuidora e o crédito será abatido no consumo dos meses subsequentes. (globo)


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