Estamos vivendo uma retomada
radical dos anos noventa quando o governo de Fernando Henrique Cardoso promoveu
as privatizações das estatais (a exemplo da Vale), a abertura do capital da
Petrobras e tantas outros atos feitos com a promessa de melhora da situação do
país. O avanço positivo alardeado pelo então presidente FHC não chegou e o país
perdeu parte do seu patrimônio junto com as riquezas naturais. Aos mais novos,
aconselho que pesquisem o que foi feito com o dinheiro das privatizações.
As nossas estatais não funcionam a contento, muito pelo contrário.
Todos nós sabemos que há muito o que aprimorar nas empresas administradas pelo
governo e que a corrupção e a má gestão são problemas sérios, independente do
espectro político que assume o poder em Brasília. No entanto, não é vendendo-as
que se resolverão os seus entraves. Ao serem repassadas às multinacionais continuarão
as mesmas dificuldades (os escândalos da Lava Jato mostraram que o mundo
empresarial privado é também muito corrupto), com os preços dos seus produtos
mais altos, o desemprego maior e a perda da riqueza construída com os impostos
dos brasileiros e das brasileiras ao longo das últimas décadas.
Caminha-se a passos largos para a venda do que resta do setor
hidrelétrico estatal com o atual governo. Privatizar este setor é o mesmo que
privatizar a nossa riqueza hídrica. As hidrelétricas têm a gestão sobre a vazão
dos rios onde estão localizadas, logo as suas águas estão sobre o seu comando.
Se este poder estiver a cargo de uma empresa privada, isso configura influência
desmedida com interesses de mercado sobre as águas brasileiras utilizadas por
milhões de pessoas.
Vale refletir porque se constrói tantas hidrelétricas no Brasil.
Muitas das nossas barragens foram construídas durante a ditadura civil-militar
de forma impositiva. Milhares de pessoas tiveram que ser removidas de suas
casas e outras tantas morreram durante as suas construções. Tanto sofrimento
foi consequência da união entre as multinacionais do setor e a ditadura.
Estudiosos deste tema afirmam
que grande parte da energia produzida no nosso país vai para a indústria
pesada, principalmente a siderurgia. Segundo o economista Joan Martinez
Alier (2007, p. 180), “A eletricidade de Tucuruí é vendida a pouco mais de um
centavo de dólar por kWh para as fundições de alumínio. Em outras palavras,
isso significa que o Brasil subvencionou o Japão e outros países importadores.”
Essa indústria é grande consumidora de energia e os países ricos preferem
deixar os seus passivos ambientais com as nações que ainda estão submetidas aos
interesses do mercado internacional.
O rio barrado paga o seu preço pela hidrelétrica nele localizada.
Com o controle das comportas, o rio passa a ter uma vazão inconstante e suas
margens enfrentam períodos de seca e inundação repentinas. Todos os seres vivos
dependentes do rio passam a estar sujeitos aos gestores da vazão que colocam em
primeiro lugar a produção da hidroeletricidade. Privatização pode resultar na
privação da água para muitas pessoas que dela dependem. Outras consequências do
barramento são:
-Espécies de peixes desaparecem ou diminuem em número;
-Fuga dos animais do seu habitat natural e a consequente perda da
biodiversidade;
-A madeira que apodrece no fundo das barragens emite gazes que
aumentarão o efeito estufa;
-O alagamento de grandes áreas com a água da barragem causa a
perda de ecossistemas;
-A possibilidade de tremores de terras na área das barragens;
-Os sedimentos são depositados no fundo da barragem e não
conseguem ir rio abaixo;
-Perda na qualidade da água;
-Grande perda da água pela evapotranspiração;
-Problemas na economia local que é dependente da vazão natural do
rio.
Nas últimas décadas milhares as represas foram
construídas em nosso planeta, causando enormes impactos socioambientais. É tão
grave o problema que existem movimentos sociais que nasceram por casa dele, a
exemplo do Movimento dos Atingindo por Barragens –MAB. Grupos similares existem
em várias outras partes do planeta, já que o problema se repete em outros
países. Estes movimentos sociais são rotulados como setores contrários ao
“desenvolvimento” recebendo retaliação por parte do Estado. O surgimento destes
grupos se dá, entre outros motivos por causa do descolamento forçado das
populações locais que gera, entre outras coisas, a perda de laços comunitários.
Outra grave consequência é a perda de monumentos históricos e da riqueza das
paisagens naturais. Além disso, lugares de grande
importância histórica e/ou sagrados para as comunidades passam a não mais
existir por serem tomados pelas águas das hidrelétricas.
Itaipu
Binacional
Uma das justificativas para a construção de novas hidrelétricas é
a necessidade do aumento de produção de energia para a industrialização. No
entanto, é necessário se perguntar se vale o preço pago com todas as perdas ou
se há alternativas. Segundo o geógrafo Walter Costa Ribeiro, (2008, p. 51),
“Uma queda d´água natural pode ser usada para produzir energia. Porém, a
escolha de grandes projetos, que acabam causando impactos em larga escala, tem
sido preferida.” Há algumas soluções para a diminuição destas grandes
construções como as hidrelétricas de pequeno porte para suprir as necessidades
de pequenas comunidades, a repotencialização das turbinas de algumas
hidrelétricas mais antigas e o investimento em outras formas de produção
de energia como a solar, a biomassa e a eólica. São possibilidades que podem
dar outro rumo a matriz energética brasileira e não causar tantos danos a
milhares de vidas que, quase sempre, só encontram o Estado brasileiro quando é
para lhes causar prejuízos. (ecodebate)
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