A eletricidade é um vetor de energia que permite atender à maioria das necessidades, de uso final, notadamente a iluminação, calor, frio ou movimento. Estes serviços, por sua vez, são fornecidos por lâmpadas, geladeiras, aquecedores, motores elétricos e outros equipamentos que convertem a energia elétrica. Suas eficiências e a maneira de utilizá-los afetam significativamente a demanda final de energia elétrica.
Portanto, o atendimento da nova demanda por serviços de energia elétrica pode ser feito, expandindo sua oferta com novos geradores, linhas de transmissão e sistemas de distribuição ou, em certa medida, aumentando a eficiência dos aparelhos consumidores e/ou evitando usos perdulários.
Em condições normais, empresas e planejadores do setor elétrico trabalham com a perspectiva da expansão da oferta. No entanto, em 2001, um racionamento de energia foi evitado com base no uso mais eficiente da energia. O Brasil foi o único país do mundo a usar, de maneira tão abrangente, esta forma de redução da demanda com um resultado tão importante. Passados quase dez anos é fácil perceber que o resultado foi impactante e consistente: em pouco mais de um mês, ações dos consumidores adiaram em uns três anos o crescimento da demanda anual de energia elétrica de cerca de 50 TWh (5 Mtep ~), adiando a necessidade de investimentos de uns R$ 20 bilhões.
Eficiência
A ação foi possível porque um programa de governo (PROCEL) tinha medido a eficiência dos aparelhos mais usados, estimado o potencial de redução do consumo e formado quadros de especialistas que atuaram durante a crise.
Não obstante, superados os problemas hidrológicos que desencadearam a crise, a visão da oferta entendeu que a redução do consumo era transitória e associada à moeda muito desvalorizada na época, à eleição presidencial no ano seguinte e à crise econômica da Argentina. Entendiam que o mercado voltaria logo aos níveis históricos e que era importante evitar uma nova crise alugando centenas de geradores diesel para montar um dispensável sistema emergencial a um custo de alguns bilhões de reais. A conta, naturalmente, foi paga pelos consumidores cujas tarifas, além disso, foram reajustadas para recuperar o “equilíbrio financeiro” das empresas cujo mercado encolheu. Curiosamente, pouco se falou sobre a alocação dos ganhos econômicos associados ao adiamento dos investimentos.
Curioso, também, que, em seguida à crise, foram criados grupos de trabalho para discutir porque ela tinha ocorrido e como prevenir uma nova situação. Os sofisticados relatórios usaram até conceitos de Nash, Prêmio Nobel de Matemática que, na época, devido a um filme sobre a sua vida, estava na moda. No entanto, apesar das evidências de que a solução para a crise não se deu pelo lado da oferta, nem um tostão foi gasto para fazer uma pesquisa de opinião entre consumidores, principais responsáveis pelos resultados alcançados, para entender a sua participação, respondendo a perguntas do tipo: “sua casa (firma) atendeu os limites impostos?”; “que providências tomou para enfrentar a crise?”; “depois da crise continua a se preocupar com o consumo: ainda compra lâmpadas eficientes?”; “agiu com a intenção de ajudar o país ou com medo das punições anunciadas?”; etc.
A eficiência energética, na verdade, embora reconhecida como um tema “politicamente correto”, não integra as políticas de planejamento energético com a profundidade e a extensão, particularmente do lado da demanda, que sua potencialidade justifica. Isto é até compreensível nas estruturas de governo que foram montadas e formadas com a visão de gerenciar a oferta e onde a “estratégia 2001” seria uma solução de bolso do colete para a hipótese de outra crise.
Não obstante, a eficiência energética afeta a economia do setor elétrico, além do meio ambiente e afetará, fatalmente, os negócios das empresas que apostarem em uma continuidade de crescimento da demanda. Ao longo da história não há registro de marcha-a-ré na eficiência energética: tecnologias ineficientes cedem espaço para as eficientes. Entender bem essa questão e tirar proveito das oportunidades que se colocam, porém, exige que empresas e governo entendam e se preparem para vencer algumas barreiras tanto políticas quanto culturais. Mas isso é assunto para outro artigo. (ambienteenergia)
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