Acidentes nucleares como os ocorridos em Chernobyl ou Fukushima geram muita resistência em relação às vantagens da geração de energia nuclear. Porém, existe uma forma de geração de energia nuclear diferente da tradicional (fissão nuclear do átomo de urânio) que não cria resíduos radioativos nem riscos de acidentes de grande porte. É a fusão nuclear, processo que vem sendo estudado no Laboratório de Física de Plasmas do Instituto de Física (IF) da USP.
“Esse é o caminho para uma fonte perene e não perigosa de energia”, afirma o professor Ricardo Magnus Osório Galvão, chefe do laboratório. Segundo ele, pela fusão nuclear, não há nenhuma chance de acontecer um acidente da proporção dos ocorridos na ex-União Soviética e no Japão. “Se algo der errado, a reação simplesmente para, sem riscos de explosão”, explica.
Além disso, também não há produção de lixo radioativo, outro grande problema da produção de energia nuclear pela fissão do átomo de urânio. Galvão afirma que a viabilidade desse processo foi comprovada na década de 1990.
Atualmente, está sendo realizado um consórcio entre diversos países da Europa Ocidental, Estados Unidos, Rússia, Japão, China, Coreia e Índia para a construção de um protótipo de reator de fusão de grande porte. Chamado de ITER (International Thermonuclear Experimental Reactor), que em latim significa “o caminho”, o reator está sendo construído na França.
O processo – A fusão nuclear nada mais é do que o processo inverso ao mais conhecido quando se pensa em energia nuclear. Em um reator nuclear tradicional ocorre o choque de um nêutron com um átomo de urânio, que tem seu núcleo quebrado, liberando energia, baseando-se no princípio de equivalência entre energia e massa (E=mc²), de Albert Einstein.
Já no caso da fusão, usam-se íons de hidrogênio, que, fundidos, geram energia também pelo princípio da equivalência. Esse é o processo pelo qual ocorre geração de energia nas estrelas, como no Sol, por exemplo.
Entretanto, por serem íons de mesma carga (positiva), existe repulsão entre as partículas, o que dificulta o processo de fusão em condições normais. “A massa do Sol é tão grande, que a força gravitacional é maior que a força de repulsão, possibilitando assim a fusão. O que na Terra não acontece”, explica Galvão.
Ele cita como exemplo duas bolas, sendo lançadas em direções opostas, cada uma em uma ponta de uma mola. Para que ocorra o choque entre as bolas, é necessário que elas sejam jogadas com muita velocidade. A saída, portanto, é dar muita energia cinética para os íons do hidrogênio, de forma que eles possam se chocar, e assim ocorra a fusão.
“Aquecemos o gás a mais de 100 milhões de graus célsius, o que dá a energia necessária para a fusão”, afirma. Nessa temperatura, a energia térmica é tanta, que os elétrons se desprendem completamente dos núcleos, gerando o plasma. Segundo Galvão, “plasma é um gás que, por algum processo, tem todos os seus elétrons ficando livres, perdendo ligação com os núcleos”.
Para armazenar esse plasma, é necessário que se crie um alto campo magnético, já que pela temperatura é impossível que o armazenamento seja realizado em materiais sólidos. Tanto esse processo de criação do campo magnético, quanto o aquecimento para que se atinja a energia necessária para a fusão são realizados por um reator chamado de Tokamak.
“Ele [o reator] produz um campo magnético intenso, e gera uma descarga elétrica que aquece o gás, o transformando em plasma e o confinando, para que ocorra a fusão”, explica Galvão. “Nosso objetivo aqui é pesquisar como confinar melhor a energia desse plasma, e como aquecê-lo de forma mais eficiente”, completa.
Visto externamente, o Tokamak do laboratório do IF (TCABR) tem o formato de um cilindro de 1,22 metros de raio e 1,90 metros de altura, sendo composto por 18 bobinas, cada uma com quatro aspiras, para produção do campo magnético de armazenamento.
O laboratório – O Laboratório de Física dos Plasmas do IF foi fundado na década de 70 pelo professor Ivan Nascimento, que era físico nuclear, mas resolveu mudar para a área de plasmas, preocupado com a questão energética. Entre os anos de 1977 e 1981, foi construído o primeiro Tokamak, que hoje está exposto na entrada do laboratório. A máquina operou até o ano de 1992.
De acordo com o professor Galvão, o laboratório foi muito importante por ser o primeiro do tipo no Brasil, permitindo o treinamento de muitos pesquisadores. “A maioria das pessoas que hoje fazem pesquisa na área, no Brasil, saíram aqui do laboratório”, conta.
O TCABR foi recebido na década de 1990, oferecido pela Universidade de Lausanne, Suíça, que estava construindo um maior. “Aceitamos e o trouxemos para cá, onde ele foi reconstruído”, completa Galvão. A reconstrução foi feita com recursos da própria USP, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Desde sua entrada em operação, em 1999, cerca de 100 trabalhos científicos foram publicados por pesquisadores do laboratório, em temas diretamente relacionados com as pesquisas realizadas no TCABR. (ambienteenergia)
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