Há uma forte analogia
entre a inquietação da sociedade que se manifesta hoje nas ruas das cidades
brasileiras, na Turquia e em outros países com o que está acontecendo na área
de energia.
Característica geral
dessas manifestações é o inconformismo com a estagnação do progresso, a
indignação com a transformação da política em balcão de negócios e vantagens
pessoais e a ausência do otimismo que galvaniza as pessoas em tomo dos seus
governos. Problemas análogos ocorrem há anos no setor de energia baseado no uso
de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás), que permitiram um desenvolvimento
técnico e econômico sem precedentes na História da humanidade, mas, após mais
de um século de grandes avanços, dá claramente sinais de exaustão.
As razões para tal
são basicamente as seguintes:
• O esgotamento
progressivo dos combustíveis fósseis. Exemplo desse fato é o que está
acontecendo com os poços petrolíferos da Bacia de Campos depois de 25 anos de
produção. Essa é uma característica geral da exploração do petróleo e do gás
natural em todos os países produtores, com a exceção dos do Oriente Médio.
• As reservas
excepcionais de petróleo e gás dessa região aumentaram a dependência mundial
das exportações da Arábia Saudita, do Iraque, do Irã e outros, criando graves
problemas geopolíticos que têm dado origem a instabilidades políticas e até
guerras.
• A poluição
ambiental que tem origem no uso dos combustíveis fósseis e sufoca as grandes
cidades da China, do México e outras. Não se trata apenas de poluição local,
mas também da emissão de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento global.
Esse é um problema que afeta a todos, mesmo fora dos locais e das cidades onde
se origina.
Diversos governos têm procurado, ativamente, soluções novas que lhes permitam enfrentar essas questões.
Diversos governos têm procurado, ativamente, soluções novas que lhes permitam enfrentar essas questões.
Os Estados Unidos
estão atacando os problemas de duas maneiras. A primeira delas é a busca
frenética por gás de xisto para produzir mais energia, apesar das inquietações
a respeito de que o sucesso dessa tecnologia não seja uma solução duradoura.
Tanto é assim que outros países – como a França, por exemplo – não estão
apostando nessa opção. Por outro lado, o presidente Barack Obama decidiu
enfrentar a oposição republicana no Congresso e poderosos grupos econômicos e
está tomando medidas administrativas para reduzir as emissões resultantes da
queima de combustíveis fósseis, principalmente do carvão mineral.
Na Europa é a adoção
de metas – e um calendário para cumpri-las – de redução das emissões de
gases-estufa, quer por meio de maior eficiência no uso de energia ou no uso de
energias renováveis, que tem sido amplamente beneficiado por instrumentos
fiscais.
Na China é um amplo
programa de redução da poluição, que deve ser incorporado no próximo plano
quinquenal. O problema nesse pais é que a maior parte da eletricidade é gerada
em usinas termoelétricas que queimam carvão de baixa qualidade. Ao melhorar a
eficiência dessas usinas ou optar por gerar eletricidade com energias
renováveis, pode resolver dois problemas: o da poluição local, que é muito
sério na China, e o da poluição global.
E o que está fazendo
o governo brasileiro para enfrentar esses problemas?
Ação mais visível do
governo federal ocorre no setor de petróleo, com a exploração do pré-sal, no
qual o governo está jogando todas as suas fichas, apesar dos enormes desafios
técnicos e econômicos envolvidos. Pior ainda, desperdiçou cinco anos sem a
realização de leilões que poderiam atrair sócios estrangeiros que dividiriam os
investimentos e os riscos com os quais a Petrobras não consegue arcar sozinha.
No setor de
eletricidade, o sistema adotado de leilões – baseado numa duvidosa teoria de
“modicidade tarifária” – pode ser atraente como diretriz política para
conseguir popularidade e votos, mas não é racional. Diferentes formas de
energia têm custos e características diferentes e devem ser tratadas de maneira
distinta. Se isso fosse feito corretamente, milhões de quilowatts de energia
elétrica estariam sendo produzidos usando bagaço das usinas de açúcar e álcool.
Como isso não foi feito, a eletricidade passou a ser gerada usando gás e
carvão, com custos elevados que, na prática, tomam inviável a tentativa de
baratear o custo da energia elétrica. Este verdadeiro “tiro no pé” acabou por,
praticamente, inviabilizar também a Eletrobrás, cujas ações despencaram em
queda livre. Além disso, o gerenciamento dos parques de geração eólica
demonstraram falhas, bem como a construção de usinas hidrelétricas sem
reservatórios.
O governo cogita
agora de estimular o uso do carvão em usinas termoelétricas – na contramão do
que estão fazendo a China e os Estados Unidos – e até energia nuclear!
O fato de os Estados
Unidos e a China – que juntos emitem mais de 50% dos gases poluentes –
decidirem unilateralmente adotar medidas para reduzir tais emissões prenuncia
um acordo entre eles, que vai deixar o Brasil isolado na sua política climática,
a qual tem sido sempre a de se recusar a tomar medidas sérias nessa área,
usando o argumento de que elas impediriam o crescimento econômico do País.
Exceto pela redução
do desmatamento na Amazônia, a política climática brasileira está paralisada. Até
mesmo a liderança que o Estado de São Paulo assumiu nessa área está encontrando
resistências da indústria, que assim adia mais ainda a sua modernização e o
aumento da produtividade, essenciais para competir no mercado internacional.
Antes que seja tarde
seria bom que se ouvisse, nessas questões, a voz de técnicos independentes, que
neste caso representa a “voz das ruas”, para evitar repetir o que está
acontecendo em outras áreas. (EcoDebate)
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