Transição
dos carros de combustão interna para os veículos elétricos: uma mudança de
época.
“Nossas invenções são apenas
brinquedos bonitinhos, que distraem nossa atenção das coisas sérias”. Ducentésimo aniversário de nascimento de Henry Thoreau
(12/07/1817)
A indústria automobilística não está
passando simplesmente por uma época de mudanças, mas sim por uma mudança de
época. A mudança da época do motor à combustão interna, com base nos
combustíveis fósseis para a época dos carros elétricos, com base na energia
renovável. A época dos carros elétricos pode ser magnífica se for acompanhada
dos carros autônomos e do compartilhamento.
A época dos combustíveis fósseis está
com os dias contados em função da necessidade de reduzir as emissões de gases
de efeito estufa e contribuir para a mitigação do aquecimento global. A
substituição dos carros de combustão interna para os carros elétricos contribui
para a efetivação das metas do Acordo de Paris. Além do mais os carros
elétricos são mais eficientes que os veículos convencionais. A eficiência
energética de um carro elétrico ultrapassa 80%, quando comparada com 15% a 20%
de um carro à combustão interna.
Até 2010, os carros elétricos ainda
eram contados em centenas. O gráfico acima mostra que o crescimento foi
bastante acelerado. Em 2016 houve um aumento de 750 mil veículos e o número de
carros elétricos no mundo em circulação ultrapassou o limiar de 2 milhões de
unidades. A liderança pertence à China. A aceitação do veículo elétrico tem
sido facilitada pelas políticas de apoio implementadas pelos governos e cidades
e os benefícios ocorrem nos campos da descarbonização dos transportes, redução
da poluição o atmosférica e eficiência e segurança energética. Os veículos
elétricos podem ser:
• Veículo elétrico a bateria (BEV ou
VEB): é tracionado por um motor elétrico e utiliza bateria como fonte de
energia;
• Veículo elétrico híbrido (HEV ou
VEH): utiliza pelo menos um motor elétrico e um motor a combustão interna. A
bateria é recarregada exclusivamente pelo motor a combustão e pela frenagem
regenerativa;
• Veículo elétrico plug-in (PHEV ou
VEHP): é um híbrido em que a bateria também pode ser recarregada em uma fonte
externa de energia (tomada elétrica).
O gráfico abaixo mostra vários
cenários de crescimento do mercado de carros elétricos até 2030. Em qualquer
alternativa o avanço deve ser expressivo, podendo o estoque chegar a 60 milhões
no mínimo ou 200 milhões. De acordo com a Bloomberg New Energy Finance (BNEF),
pelo menos um terço de todos os veículos vendidos no mundo em 2040 serão elétricos.
Para Elon Musk (da Tesla e SolarCity)
a chave da nova época está na integração do carro elétrico, do telhado solar e
as baterias de lítio. Cada domicílio poderá ser produtor de energia para o
funcionamento dos aparelhos eletrodomésticos e para o combustível do automóvel.
O consumidor também será produtor e surgirá um novo agente econômico integrando
as duas pontas do sistema econômico: o prosumidor.
A Noruega é o país mais avançado na
transição do consumo de carros elétricos, pois, segundo a Bloomberg, mais de um
terço de todos os carros novos são totalmente elétricos ou híbridos plug-in,
mais de 10 vezes a proporção nos EUA. Com cerca de 100.000 carros elétricos na
estrada, a Noruega (5 milhões de habitantes) está atrás, em números absolutos,
apenas dos EUA, China e Japão. Em 2025, o governo planeja eliminar a venda de
carros a gasolina ou a diesel, só elétricos.
A fabricante sueca Volvo anunciou, em
julho de 2017, que vai encerrar a produção de carros a motor de combustão a
partir de 2019. Todos os carros lançados a partir de 2019 terão um motor
elétrico, marcando um “fim histórico” para o motor de combustão interna. Isso
faz da Volvo o primeiro fabricante de automóveis tradicional a abraçar
completamente a eletrificação. A empresa disse que é um compromisso claro para
reduzir a pegada de carbono, além de contribuir para melhorar a qualidade do ar
nas cidades. A Volvo disse que lançará cinco carros totalmente elétricos entre
2019 e 2021. O resto de sua frota será constituída por carros híbridos plug-in
e carros híbridos suaves.
Na mesma semana em que a Volvo
anunciou sua decisão e antes da reunião do G20 em Hamburgo, o governo da França
disse que vai encerrar as vendas de veículos a gasolina e diesel até 2040. A
proposta faz parte de um plano ambicioso para atingir os objetivos no âmbito do
acordo climático de Paris, anunciou o novo ministro da Ecologia, Nicolas Hulot.
No mercado chinês, as vendas atingiram
43 mil EVs em junho de 2017. Com o mercado crescendo 16% em relação ao ano
anterior, a China garante a dianteira na produção de carros elétricos. Na
verdade, a China se prepara para liderar a transição no padrão de produção da
indústria automobilística e deve conquistar uma parcela crescente do mercado
internacional. A China pretende liderar o futuro mercado dos carros elétricos.
Mas além da mudança tecnológica, outra
possibilidade que surge e está sendo explorada em vários experimentos é a do
carro autônomo (sem motorista). Várias empresas, com Google, Uber, etc., estão
investindo em tecnologias que prometem viabilizar uma direção mais segura e
confiável em veículos autônomos com sistemas de controle computacional que
possam dispensar o motorista. Como disse Elon Musk: “Dentro de 20 anos, não é
que não haverá pessoas ao volante. É que simplesmente não haverá volante.
Poderá ter alguém com um carro tradicional, mas será como usar hoje um cavalo
como meio de transporte. Possível, mas pouco comum”.
Mas o grande avanço no sentido de
revolucionar a mobilidade urbana viria do compartilhamento coletivo que
permitiria a redução do número de carros particulares. Ao invés de cada
indivíduo ter o seu carro, haveria um estoque menor de automóveis que seriam
compartilhados por diversas pessoas, reduzindo o tempo que os mesmos ficam
ociosos e ocupando espaço e gerando custos.
Com escrevi em artigo do ano passado
(Alves, 24/11/2016): “Na tecnópolis do futuro, um simples aplicativo de celular
permitirá conectar a saída de casa, do trabalho ou de uma festa, interligando
com o local de destino. O carro viria de forma autônoma. A população se
locomoveria com um menor número de carros em circulação. O automóvel se
tornaria apenas um meio (como se fosse um taxi) e não um fim. Neste mundo de
sonho, haveria muitos ganhos com o uso dos carros compartilhados autônomos. Os
engarrafamentos seriam reduzidos ou eliminados, assim como a perda de tempo
provocada pela imobilidade urbana”.
O carro elétrico, compartilhado e
autônomo poderia ser um meio para se superar o “Paradoxo de Jevons”. Ou seja,
ao invés da eficiência energética do carro elétrico provocar o aumento da
demanda por este tipo de automóvel, teríamos a junção da eficiência, da menor
poluição com o decrescimento da produção e do consumo.
Seria,
de fato, uma mudança de época se o carro elétrico, autônomo e compartilhado
vier para reforçar a transição da matriz energética, a drástica redução das
emissões dos gases de efeito estufa e a redução da frota particular de
automóveis. (ecodebate)