Hidrelétrica de Manso: "50.000 hectares de terra debaixo d'água para uma pequena geração de energia".
Instalada há nove anos, no município de Chapada dos Guimarães, Mato Grosso, a Hidrelétrica de Manso trouxe consigo diversos problemas para a população que habita a região. Desde sua construção, a hidrelétrica atingiu mais de mil famílias ribeirinhas. Na última semana, cansados de esperar o cumprimento de um Termo de Acordo Global, feito em 2005, e que ainda não foi cumprido pela empresa estatal Furnas, cerca 800 agricultores atingidos por barragens ocuparam a área da hidrelétrica. É sobre esta ação que conversamos com o coordenador do MAB-MT, Paulo Fernandes. Em entrevista, por telefone, para a IHU On-Line, Fernandes explica que, desde o abandono do termo, a empresa de Furnas comprou somente 40% das terras do assentamento, deixando mais de 700 famílias praticamente na miséria. “As famílias que foram reassentadas estão largadas há mais de três anos em barracos de lona. As demais terras ainda não foram compradas, e só existem promessas. É aquela história, ‘devo, não nego e pago quando puder’. Estamos levando dessa maneira”, lamenta Fernandes.
A expectativa dos atingidos, segundo Fernandes, é que o resto das terras sejam compradas imediatamente para a sobrevivência das famílias. “Na última reunião, eles disseram que uma ONG, chamada Cândido Rondon, irá criar um projeto de assentamento. O prazo é de oito meses para fazer o projeto, dar entrada no Ministério do Meio Ambiente e ver se será aprovado ou não. E se não aprovam isso, como ficará a situação das famílias?”, questiona.
IHU On-Line – Você pode nos contar um pouco da história da hidrelétrica de Manso, no Mato Grosso?
Paulo Fernandes – Não sabemos o motivo de sua construção. Certamente é para gerar lucro. Acho que todas as empresas, ao construírem uma barragem, têm a intenção de tirar proveito. A hidrelétrica de Manso está localizada no município de Chapada dos Guimarães, na divisa com Rosário Oeste, pegando também o município de Nova Brasilândia. Esta hidrelétrica atingiu mais de mil famílias, mas a empresa até agora não reconheceu cerca de 912 destas. Algumas dessas famílias já morreram, e outras venderam as propriedades e foram embora. Hoje existem 780 famílias na luta para receberem seus direitos. Na época da construção, 341 foram reassentadas em uma terra de areia improdutiva. Nesta área, o pessoal não consegue sobreviver, e a maioria quer uma nova área para poder plantar. As demais ainda se encontram sem receber nenhuma reparação. Não foram reassentados, não receberam indenização e estão na espera. E já faz quase dez anos. A hidrelétrica de Manso fechou as comportas para a geração em 30 de novembro de 1999.
IHU On-Line – O que dizia o Termo de Acordo Global, realizado em 2005, e que também diz respeito à hidrelétrica de Manso?
Paulo Fernandes – Criamos alguns critérios, juntamente com a empresa, para reconhecer o direito dos atingidos. Vimos quais eram os direitos e o que cada um deveria receber. Diante disso, geramos um documento dizendo que os filhos de atingidos, ou a pessoa que foi atingida diretamente, tinham tantos hectares para receber, o que esta pessoa irá receber de bem feitoria dentro dessa propriedade, quais são os direitos das pessoas idosas e etc. Eles não queriam reconhecer os garimpeiros, nós batemos em cima e fizemos eles reconhecerem.
Esse foi um termo de acordo global, criado junto com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), com o Ministério de Minas e Energia e Furnas. O ministro de Minas e Energia e o presidente de Furnas assinaram esse acordo. Nós da coordenação do MAB também assinamos e reconhecemos em cartório. Só que a empresa alegou que, para ela cumprir esse tipo de acordo, teria de ter uma autorização da justiça. Procuramos a justiça federal, e o juiz, a promotoria e a advocacia geral da união assinaram esse termo de acordo. Isso foi reconhecido e geramos um documento público.
Porém, isso foi fechado em 2005 e, depois disso, a empresa comprou 40% das áreas para assentamento das famílias. Lá foram colocadas 53 famílias que estão largadas há mais de três anos em barracos de lona. As demais terras ainda não foram compradas e só existem promessas. É aquela história, “devo, não nego e pago quando puder”. Estamos levando dessa maneira.
IHU On-Line – Para onde vai a energia gerada pela hidrelétrica de Manso?
Paulo Fernandes – Essa energia é interligada, liga-se em outras redes e se vai. Aqui na região não fica nada. A energia que temos é de uma outra hidrelétrica muito antiga, uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH), que fornece energia para a região. Nada da energia produzida pela da Usina de Manso fica no estado.
IHU On-Line – Qual a situação atual das famílias que ainda não foram reassentadas?
Paulo Fernandes – A situação é muito precária, as famílias estão em situação difícil. Lutamos com a empresa para que ela pudesse dar uma ajuda. Cestas básicas já poderiam resolver um pouco dos problemas dessas famílias. Na época, negociamos 800 salários mínimos, mas já faz cinco anos que a empresa não reajustou esse dinheiro. Hoje, as pessoas recebem apenas 300 reais por mês. É claro que o banco “come” alguma coisa disso, pois fica com a conta bancária. No final das contas, chegam apenas 240 reais para as famílias. Isso é o que elas têm para sobreviver. Aqueles que foram reassentados pelo menos têm a casa, e aqueles que não foram estão vivendo de favor ou acampados em barracas de lona.
São 780 famílias, 484 ainda não foram reassentadas e ainda se encontram sem endereço. Aquelas que foram reassentadas também não estão numa situação boa, pois estão vivendo em uma terra improdutiva. A empresa dá uma “esmolinha” para eles. O termo de acordo diz que a empresa dará essa ajuda até que as famílias tenham condições de sobrevivência. A empresa deveria reassentar as famílias que ainda não foram e melhorar as condições dessas que já foram, removê-las para novos assentamentos ou criar um projeto de desenvolvimento para que elas possam sobreviver da terra.
IHU On-Line – E qual era a situação antes da hidrelétrica de Manso?
Paulo Fernandes – Antes, as famílias viviam em uma situação razoável. Todo mundo vivia tranquilo. A margem do rio tinha uma terra que era agricultável, então eles plantavam e colhiam. Tinha o peixe e vários outros meios de sobrevivência, como o garimpo. Não posso dizer que a vida dessas pessoas era 100% boa, mas elas tinham meios de sobrevivência. Hoje, elas não têm.
IHU On-Line – Depois que os atingidos invadiram a área da hidrelétrica, Furnas se manifestou?
Paulo Fernandes – Furnas marcou uma reunião na última semana, e um grupo foi negociar no Rio de Janeiro já que eles não quiseram vir até nós. A negociação não teve avanço, pois a única coisa que eles propuseram, razoavelmente, foi a resolução do problema dos idosos, comprando uma casa para cada um deles etc. Isso não foi muito bom porque eles determinaram um certo valor para a compra da casa, e se a casa for comprada por menos, eles não devolvem o resto do dinheiro. É só a casa e pronto. Os demais aguardam a próxima reunião, que acontece nos dias 29 e 30 de março, em Cuiabá.
IHU On-Line – As famílias viviam da agricultura e da pesca na região. Como está a situação da fauna aquática?
Paulo Fernandes – Os peixes acabaram. Na parte de cima, no lago, não existem mais peixes e, na parte de baixo, também, porque o peixe depende da água das enchentes para subir etc. Os ribeirinhos da região mais baixa do rio, que viviam da pesca, estão sem condições de vida, pois não tem mais o peixe, e, quem vive mais para cima do rio também passa por essa situação.
IHU On-Line – O que esperam os atingidos pela hidrelétrica agora?
Paulo Fernandes – A expectativa é que Furnas compre o resto das terras e reassente as famílias para que elas sobrevivam. Pedimos que isso seja imediato. Nesta última reunião, eles disseram que vão investir em uma ONG chamada Cândido Rondon, no Mato Grosso do Sul, e essa ONG irá criar um projeto de assentamento. Para isso, claro, deve ser comprado o resto das terras. Segundo eles, essa ONG quer um prazo de oito meses. Isso é o que demora para fazer o projeto, dar entrada no Ministério do Meio Ambiente e ver se será aprovado ou não. Nós achamos que é impossível. Quem não tem um lugar para morar terá que esperar oito meses. E se não aprovam isso, como ficará a situação das famílias?
Ainda estamos acampados e, se não houver avanço, vamos permanecer. Acho que essa hidrelétrica foi criada mais para prejudicar as famílias, pois sua geração de energia é muito pouca. Era para gerar 210 megawatts, mas hoje não gera nem 100. A usina trabalha com uma ou duas turbinas, e as famílias são prejudicadas por uma coisa que não está gerando quase nada. Não está havendo retorno pelo tanto de área que foi alagada. São quase 50 mil hectares de terra debaixo d’água para uma pequena geração de energia.
A expectativa dos atingidos, segundo Fernandes, é que o resto das terras sejam compradas imediatamente para a sobrevivência das famílias. “Na última reunião, eles disseram que uma ONG, chamada Cândido Rondon, irá criar um projeto de assentamento. O prazo é de oito meses para fazer o projeto, dar entrada no Ministério do Meio Ambiente e ver se será aprovado ou não. E se não aprovam isso, como ficará a situação das famílias?”, questiona.
IHU On-Line – Você pode nos contar um pouco da história da hidrelétrica de Manso, no Mato Grosso?
Paulo Fernandes – Não sabemos o motivo de sua construção. Certamente é para gerar lucro. Acho que todas as empresas, ao construírem uma barragem, têm a intenção de tirar proveito. A hidrelétrica de Manso está localizada no município de Chapada dos Guimarães, na divisa com Rosário Oeste, pegando também o município de Nova Brasilândia. Esta hidrelétrica atingiu mais de mil famílias, mas a empresa até agora não reconheceu cerca de 912 destas. Algumas dessas famílias já morreram, e outras venderam as propriedades e foram embora. Hoje existem 780 famílias na luta para receberem seus direitos. Na época da construção, 341 foram reassentadas em uma terra de areia improdutiva. Nesta área, o pessoal não consegue sobreviver, e a maioria quer uma nova área para poder plantar. As demais ainda se encontram sem receber nenhuma reparação. Não foram reassentados, não receberam indenização e estão na espera. E já faz quase dez anos. A hidrelétrica de Manso fechou as comportas para a geração em 30 de novembro de 1999.
IHU On-Line – O que dizia o Termo de Acordo Global, realizado em 2005, e que também diz respeito à hidrelétrica de Manso?
Paulo Fernandes – Criamos alguns critérios, juntamente com a empresa, para reconhecer o direito dos atingidos. Vimos quais eram os direitos e o que cada um deveria receber. Diante disso, geramos um documento dizendo que os filhos de atingidos, ou a pessoa que foi atingida diretamente, tinham tantos hectares para receber, o que esta pessoa irá receber de bem feitoria dentro dessa propriedade, quais são os direitos das pessoas idosas e etc. Eles não queriam reconhecer os garimpeiros, nós batemos em cima e fizemos eles reconhecerem.
Esse foi um termo de acordo global, criado junto com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), com o Ministério de Minas e Energia e Furnas. O ministro de Minas e Energia e o presidente de Furnas assinaram esse acordo. Nós da coordenação do MAB também assinamos e reconhecemos em cartório. Só que a empresa alegou que, para ela cumprir esse tipo de acordo, teria de ter uma autorização da justiça. Procuramos a justiça federal, e o juiz, a promotoria e a advocacia geral da união assinaram esse termo de acordo. Isso foi reconhecido e geramos um documento público.
Porém, isso foi fechado em 2005 e, depois disso, a empresa comprou 40% das áreas para assentamento das famílias. Lá foram colocadas 53 famílias que estão largadas há mais de três anos em barracos de lona. As demais terras ainda não foram compradas e só existem promessas. É aquela história, “devo, não nego e pago quando puder”. Estamos levando dessa maneira.
IHU On-Line – Para onde vai a energia gerada pela hidrelétrica de Manso?
Paulo Fernandes – Essa energia é interligada, liga-se em outras redes e se vai. Aqui na região não fica nada. A energia que temos é de uma outra hidrelétrica muito antiga, uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH), que fornece energia para a região. Nada da energia produzida pela da Usina de Manso fica no estado.
IHU On-Line – Qual a situação atual das famílias que ainda não foram reassentadas?
Paulo Fernandes – A situação é muito precária, as famílias estão em situação difícil. Lutamos com a empresa para que ela pudesse dar uma ajuda. Cestas básicas já poderiam resolver um pouco dos problemas dessas famílias. Na época, negociamos 800 salários mínimos, mas já faz cinco anos que a empresa não reajustou esse dinheiro. Hoje, as pessoas recebem apenas 300 reais por mês. É claro que o banco “come” alguma coisa disso, pois fica com a conta bancária. No final das contas, chegam apenas 240 reais para as famílias. Isso é o que elas têm para sobreviver. Aqueles que foram reassentados pelo menos têm a casa, e aqueles que não foram estão vivendo de favor ou acampados em barracas de lona.
São 780 famílias, 484 ainda não foram reassentadas e ainda se encontram sem endereço. Aquelas que foram reassentadas também não estão numa situação boa, pois estão vivendo em uma terra improdutiva. A empresa dá uma “esmolinha” para eles. O termo de acordo diz que a empresa dará essa ajuda até que as famílias tenham condições de sobrevivência. A empresa deveria reassentar as famílias que ainda não foram e melhorar as condições dessas que já foram, removê-las para novos assentamentos ou criar um projeto de desenvolvimento para que elas possam sobreviver da terra.
IHU On-Line – E qual era a situação antes da hidrelétrica de Manso?
Paulo Fernandes – Antes, as famílias viviam em uma situação razoável. Todo mundo vivia tranquilo. A margem do rio tinha uma terra que era agricultável, então eles plantavam e colhiam. Tinha o peixe e vários outros meios de sobrevivência, como o garimpo. Não posso dizer que a vida dessas pessoas era 100% boa, mas elas tinham meios de sobrevivência. Hoje, elas não têm.
IHU On-Line – Depois que os atingidos invadiram a área da hidrelétrica, Furnas se manifestou?
Paulo Fernandes – Furnas marcou uma reunião na última semana, e um grupo foi negociar no Rio de Janeiro já que eles não quiseram vir até nós. A negociação não teve avanço, pois a única coisa que eles propuseram, razoavelmente, foi a resolução do problema dos idosos, comprando uma casa para cada um deles etc. Isso não foi muito bom porque eles determinaram um certo valor para a compra da casa, e se a casa for comprada por menos, eles não devolvem o resto do dinheiro. É só a casa e pronto. Os demais aguardam a próxima reunião, que acontece nos dias 29 e 30 de março, em Cuiabá.
IHU On-Line – As famílias viviam da agricultura e da pesca na região. Como está a situação da fauna aquática?
Paulo Fernandes – Os peixes acabaram. Na parte de cima, no lago, não existem mais peixes e, na parte de baixo, também, porque o peixe depende da água das enchentes para subir etc. Os ribeirinhos da região mais baixa do rio, que viviam da pesca, estão sem condições de vida, pois não tem mais o peixe, e, quem vive mais para cima do rio também passa por essa situação.
IHU On-Line – O que esperam os atingidos pela hidrelétrica agora?
Paulo Fernandes – A expectativa é que Furnas compre o resto das terras e reassente as famílias para que elas sobrevivam. Pedimos que isso seja imediato. Nesta última reunião, eles disseram que vão investir em uma ONG chamada Cândido Rondon, no Mato Grosso do Sul, e essa ONG irá criar um projeto de assentamento. Para isso, claro, deve ser comprado o resto das terras. Segundo eles, essa ONG quer um prazo de oito meses. Isso é o que demora para fazer o projeto, dar entrada no Ministério do Meio Ambiente e ver se será aprovado ou não. Nós achamos que é impossível. Quem não tem um lugar para morar terá que esperar oito meses. E se não aprovam isso, como ficará a situação das famílias?
Ainda estamos acampados e, se não houver avanço, vamos permanecer. Acho que essa hidrelétrica foi criada mais para prejudicar as famílias, pois sua geração de energia é muito pouca. Era para gerar 210 megawatts, mas hoje não gera nem 100. A usina trabalha com uma ou duas turbinas, e as famílias são prejudicadas por uma coisa que não está gerando quase nada. Não está havendo retorno pelo tanto de área que foi alagada. São quase 50 mil hectares de terra debaixo d’água para uma pequena geração de energia.
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