sábado, 26 de maio de 2012

Mortes em Fukushima e a radiação

ONU: mortes em Fukushima não foram causadas por radiação
Apesar da elevada exposição à radiação sofrida por alguns trabalhadores da Tepco na usina de Fukushima, “não foram registrados efeitos clinicamente observáveis”.
Segundo os dados do UNSCEAR, um total de 20.115 trabalhadores esteve exposto a radiações em Fukushima, dos quais apenas oito receberam doses de radiação.
Os seis trabalhadores da Tepco, empresa gerente da usina nuclear japonesa de Fukushima, que morreram desde o grave acidente ocorrido em março de 2011, não perderam a vida em consequência da radiação recebida, assegura um relatório das Nações Unidas apresentado em Viena (24/05).
O estudo preliminar do Comitê Científico da ONU sobre os Efeitos da Radiação Atômica (UNSCEAR, na sigla em inglês) explica que graças a medições de elementos radioativos no ar, solo, água e alimentos, analisa as doses recebidas por adultos e crianças em diferentes partes do Japão.
Apesar da elevada exposição à radiação sofrida por alguns dos trabalhadores da TEPCO na usina de Fukushima Daiichi, 'não foram registrados efeitos clinicamente observáveis'.
O UNSCEAR deve apresentar um relatório mais exaustivo dentro de um ano.
Wolfgang Weiss, presidente rotativo do Comitê, explicou hoje à imprensa que um desses falecidos tinha leucemia, mas 'é possível descartar que tenha tido algo a ver com a exposição radiológica'.
Segundo os dados do UNSCEAR, um total de 20.115 trabalhadores esteve exposto a radiações em Fukushima, dos quais apenas oito receberam elevadas doses de radiação, segundo dados oficiais do Japão.
Weiss considerou como 'confiáveis' estes números e destacou que as maiores concentrações de radiação aconteceram nos primeiros dias após o acidente, quando um número muito reduzido de trabalhadores estava na usina.
Em todo caso, o especialista reconheceu que 'validar a exposição dos trabalhadores à radiação será um desafio'.
Por outra parte, Weiss qualificou como 'destacáveis' as medidas de contenção promovidas pelas autoridades japoneses, inclusive as evacuações em grande escala e o corte de provisão de leite para crianças.
Graças a essas medidas, a exposição radiológica da população local 'foi muito moderada', asseverou o presidente do UNSCEAR, destacando o tempo todo o caráter preliminar dos dados apresentados e o fato de que a análise dos efeitos de Fukushima é um projeto de longo prazo.
O UNSCEAR, um comitê que existe desde 1995 e ao qual pertencem 27 analistas de todo o mundo, recebe os dados que analisa das autoridades japonesas e de diferentes agências das Nações Unidas, assim como da Organização Mundial da Saúde e da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. (exame)

Abandonar o projeto de Angra III?

‘Abandonar o projeto de Angra III, poupar os R$ 10 bi, investir em energia alternativa’
“Investir em energia nuclear é a negação total do desenvolvimento sustentável, porque o desenvolvimento sustentável permite atender às necessidades da geração atual, sem prejudicar a possibilidade das gerações futuras de fazê-lo”, adverte o engenheiro nuclear.
Para ampliar a produção de energia no Brasil, não é necessário desenvolver todos os recursos hidráulicos e eólicos existentes. Se o país “aproveitar metade do potencial hidráulico e eólico identificados hoje, daria para dobrar o consumo brasileiro tendo acesso a um padrão de consumo semelhante ao europeu, italiano e espanhol ou até o padrão alemão e inglês”, assegura o engenheiro nuclear Ildo Sauer, em entrevista concedida à IHU On-Line por telefone.
Crítico da maneira como os governos Lula e Dilma conduziram a questão energética nos últimos anos, Sauer afirma que a reestruturação do setor não foi feita porque o governo “não fez o dever de casa”, mas “lançou mão do que tinha na prateleira: um projeto feito no governo do FHC, de energia elétrica no rio Madeira, e Belo Monte, que foi um projeto gestado no tempo da ditadura, desenvolvido naquele tempo visando a exportação de alumínio”.
Na entrevista a seguir, o engenheiro explica os equívocos da atual matriz energética, apresenta a proposta da criação de uma empresa estatal para gerenciar a energia e enfatiza a inviabilidade de o país investir em energia nuclear. “As outras opções que estão disponíveis custarão a metade desse valor, sem deixar como herança toneladas de combustíveis irradiados, rejeitos de baixa radiatividade, expondo a região e a população a riscos”. E dispara: “A minha proposta é simples: abandonar o projeto de Angra III, poupar os 10 bilhões de reais, investir em energia alternativa na combinação das que citei antes: hidráulica, eólica, biomassa, complementação térmica. Esse modelo custaria 5 bilhões de reais”.
Ildo Sauer é graduado em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, mestre em Engenharia Nuclear e Planejamento Energético pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, e doutor em Engenharia Nuclear pelo Massachusetts Institute of Technology. É professor titular da Universidade de São Paulo – USP.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O governo tem ampliado a construção de hidrelétricas sob a justificativa de que poderá faltar energia no país futuramente. O risco existe?
Ildo Sauer – A economia brasileira e a população estão ainda em crescimento. Aí há uma nuança muito importante que precisa ficar clara. Efetivamente ainda não se sabe, em escala mundial, qual é o padrão de consumo e produção necessários para atender às necessidades das pessoas. Isso depende de como a sociedade está organizada, que modo de produção ela utiliza para atender às suas necessidades, como organiza a produção, e como reparte o produto entre os cidadãos. É evidente que, concomitantemente com a Revolução Industrial, a estrutura produtiva se concentrou em fábricas, indústrias e sistemas urbanos, que trouxeram junto consigo o sistema capitalista de produção, que organiza e intensifica a produção não com o objetivo de atender necessidades, mas de aumentar a acumulação ou criar mercadorias que têm um curso de circulação. Quando fecha o circuito entre produção e consumo, produz-se mais excedente econômico para quem controla a produção e os meios de produção. Então, essa contradição existe e está presente também na sociedade brasileira.
Energia para setor industrial
O Brasil evidentemente é uma sociedade de mercado capitalista. Então, não necessariamente a produção incremental de energia para permitir a ampliação da produção econômica e do sistema urbano industrial irá atender às necessidades humanas. Pelo contrário, irá incrementar a produção e o ganho empresarial. O que sobrar será destinado aos cidadãos via salário, etc. Nesse sentido, uma sociedade que está em desenvolvimento e crescimento populacional, se quiser remover suas assimetrias, precisa incrementar a produção de energia e de bens e serviços, mas também precisa encontrar maneiras de distribuir melhor o que é produzido. Essa segunda parte (distribuir melhor o que é produzido) é uma questão política social, que está no limbo, digamos assim, porque o dogma do crescimento permanente parece ser a única forma possível de atender às necessidades sociais de todo mundo.
No Brasil, independentemente do regime social de produção existente, é desejável incrementar a capacidade de produzir energia como forma de alimentar o sistema econômico e social. Um país como o Brasil detém recursos naturais em grande escala para permitir o crescimento da oferta de energia em geral, e elétrica em particular.
IHU On-Line – É possível aumentar a produção de energia diversificando a matriz energética, ou o Brasil ainda é muito refém das hidrelétricas? Por que, se existe a possibilidade de diversificar a matriz, o país insiste no modelo hidráulico?
Ildo Sauer – Na área elétrica, o Brasil dispõe de um potencial eólico e hidráulico enorme. No caso do potencial hidráulico, cerca de 256 mil megawatts, dos quais somente 100 mil já estão desenvolvidos ou estão em desenvolvimento. Há também um potencial eólico que tem crescido rapidamente segundo as avaliações. Em 2001, a estimativa oficial para a tecnologia disponível de velocidades médias, principalmente no Nordeste e no Sul, era da ordem de 143 mil megawatts. Agora, com as torres na ordem de 100 a 150 metros de altura, esse potencial já é estimado em 300 mil megawatts, superior ao próprio hidráulico. O consumo médio brasileiro hoje dá 2.500 quilowatts/hora por ano, média por habitante. Na Espanha e na Itália o consumo é dobrado, em média 5.000 quilowatts/hora por ano; na Inglaterra e na Alemanha, é três vezes isso, ou seja, 7.500 quilowatts/hora por ano. Nos Estados Unidos é muito maior.
Se o Brasil aproveitar metade do potencial hidráulico e eólico identificados hoje, daria para dobrar o consumo brasileiro tendo acesso a um padrão de consumo semelhante ao europeu, italiano e espanhol ou até o padrão alemão e inglês. Não é necessário para isso desenvolver todos os recursos hidráulicos, nem todos os recursos eólicos, porque muitos deles não têm condições de serem desenvolvidos por razões sociais ou por questões ambientais.
IHU On-Line – Por que isso não acontece na prática? Os motivos são políticos?
Ildo Sauer – Além desses recursos de grande monta, que são as usinas de grande porte, as usinas eólicas apenas recentemente passaram a ser aceitas como importantes em razão do desenvolvimento precursor na Europa, nos Estados Unidos e também na China. Nos últimos três ou quatro anos, também no Brasil se materializou essa hipótese, que foi objeto de muitos estudos.
Para diversificar a matriz energética, o Brasil ainda pode investir nas pequenas centrais hidrelétricas, usar os resíduos de biomassa, especialmente o bagaço de cana-de-açúcar, a casca de arroz e outros que podem ser usados para gerar cerca de 10 a 15 mil megawatts. Também existe a possibilidade de usar combustíveis que são queimados para gerar calor e vapor na área de serviços e na área industrial, gerando enorme potencial da ordem de 10 a 20 mil megawatts.
Para um país que tem essa carteira de recursos, é possível escolher uma trajetória que melhor equilibrasse os atributos. Infelizmente, até agora o único atributo analisado historicamente pelo governo é o interesse econômico a partir da perspectiva do empreendedor. Foi assim que aconteceu no planejamento, antigamente, quando haviam os chamados engenheiros economistas para o planejamento – eles eram muito mais ortodoxos. Esse critério foi muito utilizado nos últimos anos para atender à pressão dos grupos econômicos e empreendedores, especialmente nos governos Lula e Dilma. De forma que aquele que tem o lobby mais forte acaba influenciando o “lobbynho” e satisfazendo o “lobbão”, acabando por impor sua trajetória. Foi isso que aconteceu em vários leilões. O governo, em contra partida, anuncia que isso é feito para criar o desenvolvimento tecnológico em benefício de indução que vai ter resultados positivos no futuro para a sociedade brasileira. Mas nem sempre é assim.
A reorganização energética
O fato é que, com essa carteira de recursos, em 2001 e 2002, depois do apagão e do racionamento no governo Fernando Henrique Cardoso, os técnicos que assessoraram inclusive o então candidato Lula, diziam que era possível reorganizar a forma de planejar a produção de energia no país. Uma forma seria reavaliar todo o potencial hidráulico brasileiro, cujos estudos são da década de 1950, e foram aprofundados pelo sistema Eletrobrás nas décadas de 1960, 1970 e 1980 parcialmente, e depois foram abandonados.
Em 2002, dizíamos que a solução para o Brasil seria mapear os recursos hidráulicos, reavaliar os inventários feitos e definir três atributos para cada aproveitamento possível: o técnico-econômico, o ambiental e o social. Seria, então, necessário fazer os estudos ambientais aprofundados em cada região, levando em conta os biomas, os ecossistemas. Era preciso separar disso – embora de forma integrada – os estudos sociais, que são diferentes, são complementares, mas que têm uma natureza própria. Tendo esses três atributos, muitos dos projetos seriam descartados, porque eles seriam barreiras intransponíveis, ou do ponto de vista técnico-econômico, ou do ponto de vista social, ou ainda do ponto de vista ambiental. Aqueles projetos que passassem por esses atributos seriam ordenados conforme um seguro de mérito, e os melhores seriam feitos por primeiro.
Por que isso não foi feito? Porque houve a sobra de energia do racionamento de 2001/2002. Os governos Lula e Dilma ficaram deitados em berço esplêndido achando que haveria sobra de energia. Acontece que essa sobra de energia se esfumaçou quando a economia começou a crescer em 2005. Então, foram feitos novos leilões. Os vencedores do leilão foram usinas a carvão importado, usinas a óleo, óleo diesel, óleo combustível, como usinas a gás, entre outras. Isso fez com que, quando houve a crítica dos movimentos sociais e ambientais a esses projetos, o governo – como não fez o dever de casa – lançou mão do que tinha na prateleira: um projeto feito no governo FHC, de energia elétrica no rio Madeira e em Belo Monte, que foi um projeto gestado no tempo da ditadura, desenvolvido naquele tempo visando à exportação de alumínio, ou seja, energia empacotada sob essas commodities.
Reprodução do modelo energético
Então, rasgaram-se todas as análises e avaliações. Jogou-se tudo no lixo e voltou-se a repetir o que era antigamente. O governo Lula usou o seu prestígio e impôs esses projetos “goela a baixo” dos camponeses e dos indígenas. Costumo repetir que, aparentemente, o governo democrático popular tomou emprestada a espada dos militares para cravá-la nos peitos dos camponeses e índios, e impor projetos que têm atributos naturais favoráveis, no caso de Belo Monte, mas não deu tempo ao processo político social, e aos estudos ambientais, os quais permitiriam desenvolver ou descartar os projetos hidrelétricos.
Recursos naturais não faltam. No entanto, as escolhas feitas não têm correspondido a essa qualidade de recursos por causa do planejamento e da gestão inadequados.
IHU On-Line – Como foram elaborados os contratos de concessão de energia no governo Lula? Que revisões deveriam ter sido feitas nos contratos de concessões do setor elétrico?
Ildo Sauer – Um dos riscos que levaram ao racionamento foi a ausência de contratos de longo prazo. Então, adotou-se a metodologia de estabelecer contratos de duração de 15 anos para usinas termoelétricas, 30 anos para usinas hidrelétricas, com antecedência mínima de três a cinco anos, que é o prazo necessário para construir os projetos. Isso foi feito só para o mercado cativo. O mercado livre, que responde hoje por 1/4 da energia brasileira, tem se beneficiado de aparentes sobras, não tem contratado e tem especulado com o excedente de água que existe.
O governo criou um mecanismo de subterfúgio pelo qual uma figura de mérito é utilizada para orientar a operação do sistema hidrelétrico e hidrotérmico, operação que serve apenas para dizer se a água de hoje deve ser poupada queimando-se combustível ou utilizada. Por fim, converteram isso no preço. Esse preço ironicamente também é um paradoxo, pois determinaram que ele é um mercado de contração livre. Esse setor de mercado livre é composto por menos de mil consumidores, que são responsáveis por 1/4 da energia, os quais, na maior parte do tempo, compram energia a mais ou menos 20% do custo real. É por isso que o mercado consegue receber mais energia do que mandar. Nesses casos, o valor da água e do custo parcial da operação é muito baixo, e este mercado dito livre, que não é livre, privilegia um grupo muito pequeno de consumidores de alto poder econômico e de alta influência política. Esse setor está organizado em associações nacionais que, então, impõe uma assimetria enorme e faz com que o mercado regulado brasileiro, que atende a mais de 50 milhões de consumidores – mais de 75% do consumo –, seja penalizado com as tarifas elétricas mais caras do mundo.
Infelizmente o setor de energia tem esse condão de ser beneficiado e, ao mesmo tempo, maleficiado pelo que se chama de rendas, setores onde com menos capital de trabalho se consegue obter um produto e ter maior valor econômico. E esse excedente econômico é disputado por todos aqueles que têm poder de barganha no seio do governo. E o governo, nas últimas três décadas, têm sido muito generoso com aqueles que conseguem se organizar, fazer pressão e impor suas soluções.
Governo democrático
Como a população não participa da discussão, o debate na imprensa é muito precário, enviesado, estigmatizado, porque aqueles que criticam esse modelo são marginalizados, como aconteceu nos debates do Congresso Nacional. Na ocasião da CPI das tarifas elétricas, Pinguelli Rosa, Roberto Araújo e eu mostramos o erro de cálculo do custo da energia para os deputados, e os parlamentares do governo disseram que somos professores ressentidos.
Então, o governo democrático popular faz acertos entre os grandes grupos econômicos. Por isso é ironia dizer que esse mercado de energia seja livre. Se ele fosse livre, todos teriam acesso. Se a energia fosse vendida a preço tão baixo, ela deveria primeiramente ser vendida ao mercado regulado, à população que é na verdade dona daqueles recursos naturais.
IHU On-Line – O senhor propõe a criação de uma estatal, a Hidrobrás, para resolver essa questão mercadológica do custo da energia?
Ildo Sauer – Proponho a criação da Hidrobrás por outra questão. A Constituição brasileira determina, em seu artigo 6º, que todo brasileiro tem direitos sociais. O primeiro deles é a educação, o segundo é a saúde, a moradia, a alimentação e outras coisas mais. O artigo 20, diz que pertence ao povo brasileiro todos os recursos naturais, incluindo os potenciais hidráulicos, os recursos do subsolo, como os minérios de ferro, ouro e as jazidas de petróleo e gás natural. Mas muitas usinas foram construídas desde a década de 1940, 1950 para cá com contrato de concessão. Diz a lei também que, quando a concessão vence, os recursos retornam ao Tesouro Nacional.
Depois de muitas prorrogações, como as feitas no governo Fernando Henrique Cardoso, quando houve uma assimetria, aquelas usinas que foram privatizadas tiveram a sua concessão prorrogada, ampliada para 35 anos, com possibilidade de estender por mais 20. Isso foi feito para efetivar a privatização e a fruição privada dos benefícios do excedente econômico da renda hidráulica, resultando em aproveitamento de recursos naturais com características muito especiais que, com baixo custo, permitem gerar energia de alto valor. E as demais usinas estatais só foram prorrogadas por até 20 anos.
Vencimento de concessões
Agora essas concessões estão vencendo. São cerca de 22 mil megawatts de potência instaladas, correspondendo a 20% da capacidade brasileira de gerar energia. Além disso, para aqueles investimentos feitos, que não foram inteiramente amortizados, existe a reserva global de reversão criada em 1957, e que todo ano o pessoal paga cerca de 2,5% do valor dos investimentos anuais amortizados para fazer um fundo. O governo tem utilizado esse fundo para muitas coisas: para o Programa Luz para Todos, etc. Mas ainda resta mais de 15 bilhões de reais.
Portanto, se um daqueles projetos de mais de 22 mil megawatts ainda não tiver recuperado os seus investimentos, esse dinheiro deveria ser usado para isso. Significa, então, que nos próximos anos, de 2013 a 2018, cerca de 20% da capacidade brasileira das usinas melhor localizadas, próximas ao centro de consumo – as primeiras que foram construídas no Brasil –, estarão em mãos de empresas estatais, que são somente parcialmente públicas. Essas usinas produzem cerca de 100 milhões de megawatts/hora por ano de energia. Se o preço médio da energia for de 100 reais, elas produzirão na ordem de 10 bilhões de reais por ano. Se usarmos essas usinas, e vendêssemos energia para o mercado cativo a um preço da ordem de 70% ou 80% do valor, teríamos uma redução na previsão futura da energia nova, muito embora no passado o governo tenha utilizado as estatais para vender energia a um preço menor a fim de permitir que os investidores privados fizessem usinas térmicas e de vários tipos a um preço mais elevado.
Proposta
Minha proposta é muito simples: se os primeiros donos de todos os recursos nacionais são os brasileiros, e se dentro da nação brasileira há um conjunto de cidadãos que ainda não teve acesso aos direitos sociais básicos, como a educação pública, a saúde pública, proponho que cerca de 70% ou 80% da renda hidráulica – algo em torno de 10 bilhões de reais – seja utilizado com os consumidores cativos, e que cerca de 6 a 7 bilhões por ano sejam destinados para um fundo público para financiar a educação e a saúde pública. Essa seria uma forma de retribuir aos brasileiros que são, desde a origem, os donos dos potenciais hidráulicos. Muitos deles nunca tiveram acesso à iluminação pública, à energia elétrica, como até hoje. Apesar de muita propaganda e das obras do Programa Luz para Todos, cerca de 2,5 milhões de brasileiros estão às escuras. Em geral, são aqueles que vivem nas periferias urbanas e rurais, que nunca se beneficiaram de nada e que, mais uma vez, estão sendo excluídos, porque há uma enorme disputa por essa fatia do mercado.
O empresariado de grande porte está dizendo que a energia elétrica brasileira é muito cara. Então, eles querem que a energia que, conforme a legislação, irá pertencer ao governo brasileiro a partir de 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017, algo em torno de 20% da energia nacional, seja utilizado para subsidiar a produção, sem reduzir o preço das mercadorias que vão servir à população, apenas para aumentar os lucros ou o que eles chamam de competitividade. Há uma disputa em torno dos benefícios que a apropriação dos recursos naturais permite e, em geral, quem ganha essa disputa têm sido os que têm maior poder de pressão econômica.
IHU On-Line – Diante desse quadro, por que ainda se propõe a construção de usinas nucleares?
Ildo Sauer – Há muitos anos, em função do quadro energético que descrevi, percebi que a energia nuclear, a ciência e a técnica são extremamente importantes para desenvolver uma sociedade mais avançada, que possa se beneficiar desse recurso, especialmente nas áreas da medicina, agricultura, diagnóstico, terapia, etc. No entanto, o caso brasileiro não precisa do urânio para fazer energia elétrica, porque o custo do urânio é muito superior aos demais recursos.
Como disse, em 2042 ou 2043, o Brasil poderá dobrar o consumo atual usando uma parte dos recursos disponíveis. Não há necessidade de fazer usinas nucleares que custem mais de 10 bilhões, como Angra III. As outras opções que estão disponíveis custarão a metade desse valor, sem deixar como herança toneladas de combustíveis irradiados, rejeitos de baixa radiatividade, expondo a região e a população a riscos. No caso da energia nuclear, a possibilidade do acidente não é desprezível, como se revelou em Fukushima. Sempre algo que não estava previsto acaba acontecendo.
IHU On-Line – Por que o governo insiste em retomar a construção de Angra III?
Ildo Sauer – No caso particular de Angra III, retomaram a obra por pressão do lobby. Por isso dizem que o Brasil precisava ampliar a matriz energética para ter mais capacidade. Ampliar a capacidade tecnológica significa projetar, construir e operar reatores. Proponho que se faça isto: um reator de alto fluxo de nêutrons para produzir radioisótopo, que são necessários para fazer imagem do cérebro, fazer imagens do coração. A área nuclear pode dar uma contribuição para a medicina, biologia e agricultura.
A minha proposta é simples: abandonar o projeto de Angra III, poupar os 10 bilhões de reais, investir em energia alternativa na combinação das que citei antes: hidráulica, eólica, biomassa, complementação térmica. Esse modelo custaria 5 bilhões de reais. Depois, seria possível utilizar um bilhão daqueles cinco que forem poupados para fazer o reator de pesquisa.
Investir em energia nuclear é a negação total do desenvolvimento sustentável, porque o desenvolvimento sustentável permite atender às necessidades da geração atual, sem prejudicar a possibilidade das gerações futuras de fazê-lo.
IHU On-Line – Quais as implicações do sítio de Angra? É possível ocorrer um acidente como o de Fukushima?
Ildo Sauer – Angra III, Angra II e Angra I estão situadas numa região da Baía de Itaorna, que quer dizer “pedra podre”, “pedra precária” em tupi-guarani. A região está cercada de montanhas que, desde as décadas 1840, 1850, 1860 têm registros periódicos de deslizamentos. Portanto, a região está suscetível a um tsunami de terra, que pode inviabilizar a possibilidade de evacuação de pessoas se houver um acidente, ou uma tragédia maior ainda. Embora seja improvável, não é impossível eventualmente um deslizamento para dentro do sítio e das usinas.
Ironicamente, na época do governo militar, quando se iniciou o Programa Nuclear Brasileiro, houve um debate mais aberto e esclarecedor sobre energia nuclear. Hoje, a imprensa faz um debate cerceado, não dá espaço ou considera irrelevante a discussão.
O governo disse que está reavaliando a construção de novas usinas nucleares, e provavelmente a única opção seja cocluir Angra III.
IHU On-Line – E o que fazer com a Angra I e a Angra II?
Ildo Sauer – Bom, Angra I e Angra II estão lá. Nós só temos que cuidar. Não podemos abrir mão de um recurso natural disponível, que científica e tecnologicamente pode ser desenvolvido, desde que se construam reatores mais avançados.
Há outro problema que não pode ser separado disso: a proliferação de armas nucleares. Nós criamos um mundo extremamente desigual como resultado da Segunda Guerra Mundial, com a criação do bloco socialista, do bloco capitalista, dos impérios que criaram armas nucleares capazes de destruir o planeta várias vezes. Essas armas estão nas mãos de apenas alguns países. Um país como o Brasil deve tomar a liderança e exigir o desarmamento nuclear de todos os países, especialmente dos Estados Unidos, da Rússia, da Inglaterra, da França, de Israel, e da África do Sul (se ela tiver armas), do Irã, da Índia, do Paquistão, da Coreia do Norte e todos os demais que poderiam fazê-lo.
Controle nuclear
O ciclo do combustível nuclear para usinas civis deveria ser feito por uma empresa sobre o controle da ONU, de maneira que todo o enriquecimento e reprocessamento de energia nuclear seriam feitos em escala global por uma entidade controlada por todos os países conjuntamente. O Brasil pode ter um papel importante, porque é um país que tem capacidade de tecnologia nuclear, inclusive de fazer bombas se quiser, num prazo relativamente curto, como a Argentina também, mas deveria se tornar o precursor no sentido de exigir uma mudança no status quo.
Já não podemos descartar os benefícios que a energia nuclear permite para a medicina, para a agricultura, para a biologia e para a ciência, nem eventualmente para a energia. Porém, é preciso aproveitar as lições do acidente de Fukushima, de Chernobyl, entre outros.
IHU On-Line – Qual será o custo das usinas nucleares para o Brasil?
Ildo Sauer – O Brasil decidiu investir em um reator nuclear cuja a tecnologia é dos anos 1950, que foi top de tecnologia nos anos 1970. Esse modelo atualmente está ultrapassado, mas o país insiste em gastar o dobro do que custariam outras formas de energia. O investimento nas usinas nucleares atuais deixará como herança, além dos rejeitos radioativos, que exigem cuidado por dez, quinze, vinte ou trinta anos, mil toneladas para cada reator de Angra I e Angra II.
É preciso criar um consórcio mundial para dar conta de todos os combustíveis, elementos e rejeitos radiativos dos programas de produção de energia elétrica e dos programas que produziram as armas nucleares.
A Agência Internacional de Energia Atômica, que hoje está servindo muito aos americanos para perseguir o Irã e outros países, deveria mudar de papel, e perceber que a presença de armas nucleares, de reatores, de tecnologia ultrapassada constitui ameaça à segurança da população mundial. Ainda que o risco seja pequeno, ele existe e precisa de uma solução. A Agência Internacional de Energia Atômica atua ingenuamente como lobista a favor de reatores convencionais, alguns deles com risco acima do necessário, como o caso dos três reatores de Angra, o reator de Fukushima e muitos que estão operando na França e em outros países, e perde a chance de se tornar uma organização que trabalhe em favor da humanidade. (EcoDebate)

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Itaipu: 38 anos de geração

A hidrelétrica de Itaipu comemorou em 17/05/12 38 anos. Nesta data, em 1974, os governos do Brasil e do Paraguai assinaram o documento que criava a entidade binacional, gerida pela Eletrobras e pela Administración Nacional de Electricidad (ANDE). O projeto entrou em operação industrial em 1984.
A construção de Itaipu representou um desafio político, diplomático, econômico e de engenharia sem precedentes. Até 2020, a empresa pretende se consolidar como a geradora de energia limpa e renovável com o melhor desempenho operativo e as melhores práticas de sustentabilidade do mundo, impulsionando o desenvolvimento sustentável e a integração regional.
A produção de energia acumulada até 30 de abril de 2012 é de 1.971.677.160 MWh, suficiente para suprir o consumo mundial de energia elétrica por 38 dias. Com 20 unidades geradoras e 14 mil MW de potência instalada, a usina produziu no ano passado 92,24 milhões de MWh, quarto melhor desempenho de toda a sua história, respondendo por 16,99% de toda a eletricidade consumida no Brasil e por 72,91% do consumo paraguaio.
A marca histórica de produção de energia ocorreu em 2008, com a geração de 94.684.781 MWh. O recorde anterior foi em 2000, quando Itaipu gerou 93.427.598 MWh. Para os próximos anos, Itaipu tem como meta e desafio superar os 100 milhões de MW. Só nos quatro primeiros meses de 2012, Itaipu produziu 32.913.663 MWh. (ambienteenergia)

Geração distribuída

Geração distribuída: 30 mil MW até 2020
Os sistemas de geração distribuída acrescentarão 30 mil MW de capacidade instalada à matriz energética até 2020. Segundo a Cogen, cerca de 10 mil MW desse total serão provenientes da biomassa e 7,5 mil MW de energia solar. Os dados foram apresentados vice-presidente executivo da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen), Carlos Roberto Silvestrin, em debate com empresários na Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).
Na ocasião, Silvestrin afirmou que há potencial para a exploração da geração distribuída por diversas fontes, como solar, gás natural, cogeração, biomassa, mas que algumas condições ainda precisam de aperfeiçoamentos regulatórios e de procedimentos financeiros e tarifários para induzir os investimentos.
O empresário lembrou que a geração distribuída apresenta grande potencial também por reduzir custos de transmissão a longas distâncias, em especial por que o potencial hidrelétrico remanescente está localizado principalmente na região Norte, longe dos principais centros consumidores.
Segundo Silvestrin, a atenção e o investimento em projetos de geração de energia elétrica distribuída são complementares aos planos e projetos que visam reforçar e ampliar o Sistema Interligado Nacional (SIN). “É importante o mercado e as autoridades darem alguma prioridade à geração distribuída, pois ela pode cumprir uma função complementar fundamental ao sistema elétrico nacional”, disse. (ambienteenergia)

Rio+20 e a matriz energética brasileira

Rio+20 e a matriz energética brasileira - parte II
Se o Brasil pretende se confirmar como liderança em energias limpas na conferência Rio+20, deve começar por levar e discutir propostas consistentes de programas de eficiência energética, de descentralização da geração e pensar numa matriz nacional de transportes coerente com essa postura. Posar de grande detentor da matriz energética mais verde do mundo é uma falácia.
Rever as políticas energéticas adotadas nos últimos 20 anos é uma boa ideia para a nação anfitriã da Rio+20. O Brasil quer ser a quinta maior economia do mundo. Para isso precisa construir uma sociedade regida por um sistema energético sustentável. Uma sociedade sustentável.
A geração de energia por hidrelétricas já ocupa uma posição secundária no mundo porque os países ricos esgotaram seus potenciais. O governo brasileiro continua investindo no mesmo modelo sem observar as sequelas dos outros países e aprender com os erros deles. Vamos esgotar também o nosso potencial?
O Brasil é um país privilegiado, pois conta com abundância de sol, vento e biodiversidade. Essa é a equação ideal para estimular o incremento das fontes limpas de energia, eólica e solar, na matriz energética. Porém, incentivos mesmo, só para construir barragens, “preferência nacional” do planejamento ofertista de energia elétrica.
O Plano Decenal de Expansão de Energia (PDEE) 2020 chama a Amazônia de “potencial[1]“, “potencial inventariado[2]“. Ele prevê a completa exploração da fonte hídrica de energia na Amazônia, como se essa fosse a vocação natural da floresta. É com essa visão obliterada que o Brasil está sendo considerado uma referência na Rio+20.
O governo de Dilma Rousseff desconsidera as mudanças climáticas que alteram o regime de águas nos rios da Amazônia. Já chamou de fantasia a pretensão de gerar energia com fontes alternativas genuinamente limpas. Talvez considere delirio as alterações do clima. O modelo econômico atual está levando o planeta para o ponto de desequilíbrio de onde não será possível retornar.
Bom exemplo de liderança seria apresentar uma análise mais abrangente das alternativas genuinamente limpas que pudessem complementar as usinas hidrelétricas existentes. A conferência talvez não Rio+20 não fracassasse. Incentivos à pesquisa de novas tecnologias para tornar mais competitivas as energias alternativas, também seriam bem-vindos.
Até o momento sabe-se que a Rio+20 pretende ignorar as mudanças climáticas.
Energia elétrica limpa e barata?
O PDEE 2020 prevê 24 novas grandes usinas hidrelétricas na Amazônia brasileira entre 2016 e 2020 (tabela abaixo). No rio Madeira duas grandes hidrelétricas já estão sendo construídas e provocam sérias alterações na dinâmica do rio, da floresta e do ambiente urbano, conflitos trabalhistas violentos nos canteiros de obras, acompanhados de denúncias de trabalho análogo ao escravo. O projeto de Belo Monte, no rio Xingu, parece vencer os quase 30 anos de resistência dos movimentos sociais. A usina de Estreito, no rio Tocantins, já em início de operação mostra impactos sociais e ambientais e destruição provocada pela abertura das comportas durante as cheias.
As barragens são consideradas os maiores projetos individuais no quesito investimento. Elas têm custos altos mal detalhados, tornam vulneráveis as regiões em que se inserem e produzem grandes passivos ambientais e sociais. Os programas de compensação e mitigação não têm acompanhamento, fiscalização ou controle social.
As hidrelétricas hoje, no Brasil, servem como moeda de troca para suprir as carências regionais, enormes lacunas deixadas pelo Estado. Elas podem gerar energia barata? Os custos socioambientais, na verdade, não são contabilizados.
Gerar energia implica em alteração do ambiente. A energia eólica quando é mal planejada pode gerar conflitos pelo uso do espaço, impactos sobre a fauna e ruído. A tecnologia atual de energia solar requer ainda a utilização de materiais como o arsênio, cádmio ou silício. A biomassa implica em subutilizar terras férteis.
Nenhuma dessas fontes, porém, leva ao deslocamento compulsório de dezenas de milhares de pessoas (no Brasil já são mais de um milhão de desalojados por projetos hidrelétricos) ou afeta os direitos das populações tradicionais, a sobrevivência de povos indígenas ou leva à extinção de espécies da fauna e flora. Só hidrelétricas alteram o ambiente urbano e rural, o clima, destroem ecossistemas. Mas são consideradas “limpas e baratas” pelo governo brasileiro.
O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, diz que as energias alternativas limpas como a eólica e solar são caras. Serão sempre caras se não houver incentivos para torná-las competitivas no mercado. Falta economia de escala.
Da mesma forma que hidroeletricidade não pode ser considerada limpa, também não pode ser considerada barata. É cara do ponto de vista dos custos de implantação e a conta de luz é também é muito cara para o consumidor final. As tarifas de energia elétrica residencial e industrial praticadas no Brasil (80% da energia vêm de geração hidrelétrica) estão entre as dez mais caras do mundo. Isso derruba definitivamente o mito da energia barata.
Considerar essa energia limpa e barata é um engodo. A expansão de energia prioriza hidrelétrica usando a teoria ultrapassada da disponibilidade farta encontrada graças à exuberância da Amazônia. A Amazônia não é só uma dádiva da natureza, mas é, principalmente, berço de povos milenares.
O que prevalece é a cultura das empreiteiras em busca de obras faraônicas. O concreto das barragens e as escavações em rocha no solo da floresta são financiados por dinheiro público a juros subsidiados. Quem fiscaliza? (EcoDebate)

terça-feira, 22 de maio de 2012

Economia verde ou energia limpa

Economia verde ou energia limpa com equidade
A América Latina e o Caribe formam uma região com potencial para desacoplar seu crescimento do consumo de combustíveis fósseis e passar para uma economia verde baseada em energias mais limpas, mas com a condição de reduzir as brechas sociais. “Um em cada três latino-americanos vive na pobreza e quase 90 milhões sobrevivem com menos de um dólar por dia, por isso precisamos de um crescimento sustentado, mas com maior igualdade e ambientalmente sustentável”, disse à IPS o secretário permanente do Sistema Econômico Latino-Americano e do Caribe (Sela), José Rivera.
Para Rivera, “não se trata de mudar da noite para o dia os padrões de produção e consumo, mas de avançar nessa direção, construindo consensos regionais para investimentos, políticas públicas, incentivos, subsídios, normas, trabalho de formação e conscientização, além da cooperação internacional.
O Sela, que reúne 28 Estados latino-americanos e caribenhos, produziu um estudo que assume, como condição básica para “deixar verde uma economia marrom”, o estabelecimento de uma nova matriz energética na região, apressando a passagem de uma economia baseada na energia de carbono para outra, de energias renováveis e limpas.
Ao examinar a atual matriz energética, o estudo constatou que em 2009 a região produziu o equivalente a 7,424 bilhões de barris de petróleo (de 159 litros cada), 80% dos quais baseados em hidrocarbonos e carvão. A distribuição por tipo de combustíveis foi a seguinte: 50,2% petróleo, 23,9% gás, 10,8% biomassa (lenha e cana, com 5,4% cada uma), 6,6% hidroenergia, 6% carvão mineral, 1,3% o conjunto de eólica, solar e outras renováveis, 0,6% nuclear e 0,6% geotérmica.
Os principais países produtores são México com 24,7%, Brasil com 22,9%, Venezuela 20,4%, Colômbia 9,8%, Argentina 7,7%, Trinidad e Tobago 4,2%, e Equador com 2,8%. A Venezuela é líder na produção de petróleo, seguida de México e Brasil. O México é líder em gás, seguido de Argentina e Trinidad e Tobago, enquanto a Colômbia produz três quintos do carvão, o Brasil lidera na produção de lenha, cana, hidroenergia e outras energias renováveis, o México em geotermia, e Brasil e México são produtores nucleares. Do conjunto da oferta energética regional, 74,4% tem origem em fontes não renováveis e 87,6% são de energias muito contaminantes, com altas emissões de dióxido de carbono (CO²).
A América Latina “tem enormes possibilidades de contar com uma energia mais verde, começando pelo grande potencial de energia hidrelétrica, primeiro no Brasil e depois na Venezuela, México, Colômbia, Paraguai e Argentina”, explicou à IPS o especialista Juan Carlos Sánchez, do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC).
Só a Venezuela, com capacidade hídrica e térmica para gerar 20 mil megawatts/hora de eletricidade, poderia instalar capacidade para outros 100 mil megawatts/hora de fontes hídricas, eólicas e de biomassa. Outras fontes para as quais há grande potencial, segundo Sánchez, embora exijam fortes investimentos ainda muito incipientes, são as energias solar e eólica.
“Contudo, ao se tratar de fontes chamadas verdes, independente de serem renováveis ou não, é imprescindível considerar todas as implicações, como é o caso dos agro ou biocombustíveis, como bioetanol ou biodiesel, causadores de problemas terríveis de posse e uso da terra, mais contaminação por agroquímicos, o que também leva a problemas sociais muito sérios”, destacou Sánchez.
O agrônomo Edgar Jaimes, professor titular da venezuelana Universidade de Los Andes, observou que “a economia verde constitui uma nova visão capitalista do mundo, cujo objetivo principal é utilizar a biomassa terrestre com a finalidade última de continuar potencializando os sistemas produtivos, que nos últimos 50 anos depredaram e exploraram os bens naturais e o próprio homem”. “A produção primária do planeta ultrapassa os 250 bilhões de toneladas de biomassa ou matéria viva. Apenas 62 bilhões de toneladas são usadas para atender as necessidades humanas e industriais atuais. A diferença fica para o novo modelo ‘verde’, com fins de renda ou lucro capitalista”, afirmou.
Com essas advertências, a região da América Latina e do Caribe “deve buscar a forma de passar para um crescimento sustentável. Existe consenso de que a economia baseada em carbono está chegando ao seu limite”, afirma o Sela. Julio Centeno, também professor na Universidade de Los Andes, resume que “se trata de desacoplar a energia do consumo de combustíveis fósseis e levá-la para energias mais limpas, um desafio para nações como as da Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep)”, cujos sócios regionais são Venezuela e Equador.
O Sela alerta que “é necessária a intervenção direta do Estado por meio de políticas públicas que facilitem e incentivem a transição, mas não só isso: o tema está na necessidade de fazer uma transição inclusiva”, pois “são precisos ajustes para garantir o emprego e a capacitação” a fim de trabalhar na economia verde. Também se necessitará dar atenção especial aos setores produtivos que poderiam perder viabilidade ao se desfazerem dos combustíveis fósseis e abraçarem energias mais limpas.
O Sela propõe aos Estados da região começar um inventário dos elementos que devem integrar uma matriz de economia verde, para poder elaborar políticas que sustentem a transição. Também recomenda elaborar um estudo sobre o capital natural (bens e serviços ambientais disponíveis) na região e sua relação com a energia do carbono, e definir áreas temáticas e projetos que possam somar as vantagens comparativas tanto regionais como de cada país.
Além disso, a região deveria estabelecer mecanismos de acompanhamento destas políticas e destes projetos, coordenar suas ações, desenvolver programas de cooperação Sul-Sul sobre economia verde e identificar fontes de financiamento para seus novos projetos. A caminho da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que acontecerá entre 20 e 22 de junho no Rio de Janeiro, Rivera propõe que a região adote e desenvolva seu próprio decálogo de marcha para uma economia verde no contexto da nova Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos. (cristovam.org)

Rio+20 – Quando acabar

De nada adianta o direito de igualdade se não temos uma justiça que garanta este princípio, além de que nada adiantam as leis se criamos instrumentos para burlá-las, assim como nem tudo que é legal, é moral. Neste sentido não adiante discutirmos, estabelecermos agendas, definirmos metas se não as seguimos e criamos artifícios para fazer o que queremos. O Brasil tem tudo para viver ás custas de energia renovável, por outro lado estamos construindo termelétricas, assim como explorando inconsequentemente o petróleo, mesmo que às custas de tudo e de todos.
Criticamos muito a China, mas nestes últimos meses a mesma vem invertendo este cenário, firme em direção de um uso racional energético e investindo na renovação, isto é, investindo em energia renovável. Devíamos investir mais em energia solar, reuso de água cinza e de chuva, em mobilidade responsável.
O Estado do Rio de Janeiro, perdeu totalmente sua vocação de turismo e pior, está cego pelo petróleo esquecendo (ou fingindo não compreender) o esgotamento de suas reservas, isto é, acaba, e depois de acabar as cidades devem continuar a viver, mas já terão perdido toda a sua identidade. A dependência do petróleo, a que estamos sendo impostos, é como qualquer outra, como é fisicamente insustentável e ao acabar causa a depressão.
Há de se convir que mesmo as reservas do pré-sal são uma contribuição muito pequena para esta energia do mundo. Mas, esta febre faz com que sejam feitos vários outros empreendimentos atrelados á sua exploração e industrialização. A falta de planejamento faz com que ao fim desta matéria prima todos os negócios e empreendimentos se tornarão obsoletos, abandonados… Elefantes brancos.
Para todo o conhecimento que adquirimos neste tempo todo, é fora de moda nos limitar ao petróleo para desenvolvimento. Podemos ser melhores! Existem maneiras melhores de conquistarmos a prosperidade e garantirmos a qualidade.
Hoje cresce consideravelmente o número de polos navais por todo litoral brasileiro, será que o Brasil necessita de tantos? Parece mais uma forma de pulverizar, e assim sendo dificultar o controle (este em todos os sentidos) e através destes surge um surto de indústrias provocadas por estes empreendimentos, mas quais se manterão quando o ciclo do petróleo declinar nos próximos 20 anos de acordo com o crescimento mundial de demanda?
Regiões turísticas, como Saquarema, Maricá, entre outros simplesmente se tornarão polos industriais, é este tipo de desenvolvimentos que buscávamos? Acredito que a fórmula, (não mágica) para a garantirmos a Sustentabilidade Urbana, esteja na forma como se faz política e se queremos mudar o resultado, devemos mudar a política. Jamais mudaremos os resultados se não mudarmos fatores na operação.
Na Rio+20, deve-se abordar assuntos sobre a economia verde, algo importantíssimo, mas não podemos com ela encobrir a realidade de cidades do Estado do Rio de janeiro sobre a economia negra do petróleo a qualquer custo que vivemos indisfarçada e obscenamente. Sim, devemos abordar a erradicação da pobreza, este seria o eixo principal, mas todos esquecem da sinergia entre os impactos sociais em cidades desestruturadas, e sem pessoal capacitado para este mercado que só enxerga o ouro negro. Sem focar muito no ambiente, pois este está sendo parcelado, leiloado a quem ousar em investir sem tecnologias que garantam estas extrações do pré-sal, vide a Chevron.
Ao fim o Brasil está tentando se fantasiar de coerente. A clandestinidade neste mercado é o que garante que há algo de errado nele!
Não deve ser complicado ter o tão sonhado crescimento, com inclusão social e também com a proteção á natureza, é complicado nos livrarmos do vício da política politiqueira que estamos vivendo, mas se não o fizermos continuaremos nesta lengalenga. Às vezes me sinto como se vivesse em terapia de grupo, todos falam sobre os problemas, assumem responsabilidades, confessam até suas clandestinidades, mas é tudo ainda muito no campo filosófico e não prático.
A mobilização política, não está resumida a política partidária, sendo assim deveria ter mais participação da sociedade civil, pois ela é fundamental para incorporar a sustentabilidade às políticas públicas, e por esta razão devem ser ouvidas, e seus direcionamentos praticados pela administração pública. Ao fim de toda uma discussão de um problema junto à sociedade, se esta for ignorada e forçara a engolir aquilo que não quer, mais cedo ou mais tarde vai colocar tudo para fora!
Também não existe a apresentação de outras tecnologias ou alternativas para gerar de forma positiva a economia das cidades. Somente com acesso a todas estas informações é que a sociedade deverá escolher qual o modelo de desenvolvimento seria mais adequado.
O Brasil deixou de ser o país das oportunidades para ser de oportunistas governamentais. Devíamos nos atentar que pela escassez de matérias primas principalmente, mas também de outros recursos é o que nos faz estarmos num bom momento econômico, até mesmo pela alta na demanda para atender ao mercado internacional. Inovação e tecnologias não são nem vistas ou achadas neste sentido, o que é uma pena, esta alta demanda é o resultado daquilo que conservamos de nossos recursos, coisas que demais economias (em outros países) não fizeram.
Mas nestes últimos 10 anos, nós brasileiros, parecemos copiar o tipo de desenvolvimento que destrói, causando uma exaustão, para evitar isto, para pararmos de ir ao sentido contrário da modernidade deveríamos ter um desenvolvimento equilibrado e duradouro, com qualidade de vida. Estaremos poupando para o futuro e quando acabar certamente o mundo buscará em nós estes recursos. (EcoDebate)

domingo, 20 de maio de 2012

Por um Brasil livre de energia nuclear

Os defensores da energia nuclear conseguem pintar uma imagem de que ela é sinônimo de alta tecnologia, de que os países que investem nesse modelo de energia são avançados, e que o Brasil não pode ficar para trás”, afirma o arquiteto.
Confira a entrevista.
O acidente nuclear de Fukushima reacendeu o debate da energia nuclear no Brasil. Enquanto o governo defende a conclusão de Angra III, engenheiros, pesquisadores, ambientalistas e integrantes da sociedade civil se organizam no sentido contrário, na tentativa de banir a energia nuclear do país. Hoje, a campanha “Por um Brasil livre de energia nuclear” é promovida por duas frentes de discussão: a Coalizão por um País Livre de Usinas Nucleares, e a Articulação Anti-Nuclear Brasileira, que divulgam informações sobre os riscos desse modelo energético e promovem ações para repensar a composição da matriz energética brasileira. O arquiteto e ativista brasileiro Francisco Whitaker participa da Coalizão e diz que as duas frentes atuam no sentido de convencer o governo federal a desistir da ampliação da energia nuclear no país.
Em entrevista concedida à IHU On-Line por telefone, Whitaker avalia que a Coalizão e a Articulação já conquistaram duas vitórias. A primeira foi o adiamento da conclusão de Angra III, que depende de um financiamento externo. “Pressionamos a Alemanha para que não libere esse dinheiro, pois se o governo alemão decide que não irá mais investir em energia nuclear, não pode financiar usinas nucleares em outros países. Diante da pressão brasileira, o governo alemão resolveu postergar a decisão de dar a garantia para a construção de Angra III”, explica. A segunda conquista diz respeito a iniciativa do governo federal de adiar a construção de novas usinas nucleares.
O Instituto Humanitas Unisinos – IHU também participa deste debate, e em breve publicará uma entrevista com Dom Jaime Chemello, que recentemente visitou Chernobyl. A edição número 355 da revista IHU On-Line, de 28-03-2011, intitulada A energia nuclear em debate, publica uma série de entrevistas sobre as implicações da energia nuclear.
Francisco Whitaker (foto) foi presidente da Juventude Universitária Católica – JUC em 1953-1954, assessor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB no 1° Plano Pastoral de Conjunto em 1965-1966, e assessor da Arquidiocese de São Paulo e da CNBB de 1982 a 1988. Foi vereador de São Paulo, SP. É sócio-fundador da Associação Transparência Brasil e foi professor no Instituto de Formação para o Desenvolvimento de Paris e no Instituto Latino-Americano de Pesquisas Econômicas e Sociais (Ilpes/ONU).
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Em que consiste a campanha por um Brasil livre de usinas nucleares?
Francisco Whitaker – Essa campanha iniciou após o desastre de Fukushima, quando assistimos ao sofrimento do povo japonês. Esse desastre acordou as pessoas em relação à periculosidade da energia nuclear.
O Japão é conhecido por dominar a tecnologia nuclear, então, era o último lugar que se poderia esperar um acidente desse tipo e magnitude. Mas mesmo lá, a natureza se encarregou de destruir as previsões. Eles construiriam um dique de contensão de cinco metros de altura para prevenir de eventuais ondas do mar, mas veio uma onda de quinze metros. Esse acidente nos mostrou que não é possível haver uma usina nuclear 100% segura.
Os que defendem a energia nuclear argumentam que ela é mais barata, argumento que é extremamente contestado, principalmente se agregarmos ao custo da usina os gastos oriundos de um desastre. Independentemente do custo econômico, a usina em si é um atentado ao bom senso por causa dos riscos.
Quando acontece um desastre como o de Chernobyl ou Fukushima, muitas pessoas morrem por causa da explosão, e outras são atingidas pela nuvem de radiatividade que se forma e contamina a água, o solo, o ar, porque tal radiação não desaparece rapidamente. A radiatividade permanece por dezenas, centenas ou milhares de anos no local, contaminando as pessoas e o meio ambiente.
Outro risco diz respeito ao lixo atômico. As varetas de urânio produzem elementos e materiais que são extremamente radiativos. Além do mais, o lixo radiativo precisa de 100 mil anos para perder a radiatividade. Ainda não há solução para tratar esse tipo de lixo. Na França eles têm quase cinquenta mil toneladas de lixo atômico acumuladas e não sabem o que fazer com esse material. Cinco anos depois de Chernobyl ter explodido, foi feito um sarcófago sobre a usina, e ele começou a vazar. Precisaram construir um segundo sarcófago para impedir que a radiatividade saísse da usina.
IHU On-Line – No Brasil, dois fóruns discutem as questões referentes à energia nuclear: a “Coalizão por um País Livre de Usinas Nucleares” e a “Articulação Anti-Nuclear Brasileira”. Quais as diferenças e aproximações entre essas duas frentes?
Francisco Whitaker – A diferença diz respeito à forma como foram criadas. A Coalizão trabalha intimamente relacionada com a Articulação. Coincidentemente, no mesmo dia que nós realizamos a primeira reunião da Coalizão em São Paulo, foi criada, no Rio de Janeiro, Articulação.
A Coalizão se definiu como um grupo de pessoas e organizações que irão atuar no sentido de esclarecer a população sobre a energia nuclear, e precisamente batalhar para que o governo brasileiro não adote essa opção. Nossa proposta é de que o governo federal volte atrás e desista das obras de Angra III, desmantele as usinas de Angra I e II, e não invista nesse projeto.
A Articulação reúne organizações do Brasil todo vinculadas ao tema. Reúne também as pessoas que foram vítimas do acidente do Césio-137 em Goiás [1], ativistas que batalham contra a mineração de Urânio etc. Ela amplia mais o debate do que a Coalizão, mas as duas estão trabalhando em estreita relação. As duas lançaram juntas uma iniciativa popular de emenda constitucional para proibir a construção das usinas nucleares no Brasil.
As duas frentes também participarão juntas na Rio+20 com uma tenda antinuclear. Nossa proposta é divulgar ao máximo as informações que temos para que as pessoas saibam o risco que estamos correndo caso o Brasil insista em expandir a energia nuclear. Infelizmente, ainda há falta de informações em relação ao tema.
IHU On-Line – Pode nos dar mais detalhes sobre essa proposta de emenda à Constituição, proibindo a construção de usinas nucleares no Brasil? Como está esse debate?
Francisco Whitaker – Nós estamos coletando assinaturas. Precisamos coletar 1.500.000 assinaturas para que o tema seja discutido no Congresso, e depois conseguir que um número suficiente de deputados assine uma emenda profissional, para que ela possa ser discutida no Congresso. Então, tem todo um trabalho a ser feito.
Recentemente, uma delegação de parlamentares brasileiros queria ter participado da visita a Chernobyl junto com Dom Jayme Chemello. Mas os parlamentares não puderam ir, porque a data da viagem coincidiu com a votação do Código Florestal. Eles queriam criar uma frente parlamentar contra a energia nuclear e preparar a luta dentro do Congresso.
Ainda sobre as nossas articulações, vamos lançar um livro no dia 21 de maio, em São Paulo, com um texto que escrevi quando apresentei a questão da energia nuclear ao Conselho Episcopal de Pastoral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, em fevereiro deste ano, e com artigos de professores. Um capítulo desse livro é intitulado de “Por um Brasil livre de Usinas Nucleares. Por que e como resistir ao lobby nuclear”.
IHU On-Line – Essa campanha tem causado algum efeito na posição do governo federal?
Francisco Whitaker – Já tivemos duas boas repercussões. Uma delas é que a construção da Angra III depende do financiamento alemão. Pressionamos a Alemanha para que não libere esse dinheiro, pois se o governo alemão decide que não irá mais investir em energia nuclear, não pode financiar usinas nucleares em outros países. Diante da pressão brasileira, o governo alemão resolveu postergar a decisão de dar a garantia para a construção de Angra III. Essa foi uma grande vitória.
A segunda vitória é o fato de o governo brasileiro ter decidido adiar a construção das usinas nucleares no Nordeste. Não sabemos se essa decisão tem a ver com a pressão que começamos a fazer. A previsão é de que sejam construídas quatro usinas no Nordeste a partir de 2020. Percebe-se que o governo adiou a construção, mas ainda não desistiu, porque tem uma visão muito “pequena” do assunto. Ele considera que o crescimento econômico do Brasil depende da energia nuclear.
IHU On-Line – A quem interessa a construção de usinas nucleares? Que setores fomentam o lobby?
Francisco Whitaker – Tem muito dinheiro envolvido nesse debate. A construção de uma usina nuclear custa aproximadamente 10 bilhões de reais. Muitas empresas estrangeiras estão interessadas na construção de Angra III, pois exportam reatores, desenvolvem pesquisas, fabricam peças, maquinários. Esses capitais conseguem criar uma aura de que a usina não é problemática. Por exemplo, logo depois do desastre de Fukushima, um dos principais assessores da empresa brasileira de energia nuclear teve a insensatez de escrever um artigo dizendo que Fukushima provou que usina nuclear é segura. É inacreditável.
Os defensores da energia nuclear conseguem pintar uma imagem de que ela é sinônimo de alta tecnologia, de que os países que investem nesse modelo de energia são avançados, e que o Brasil não pode ficar para trás. É inacreditável ver como os franceses têm o maior orgulho de terem a tecnologia avançada. Hoje eles têm dificuldades enorme de abandonar esse modelo, porque 77% da energia é nuclear.
IHU On-Line – A campanha mundial contra a energia nuclear é promovida pela Fundação Gorbachev. Pode nos falar sobre essa fundação? Como o senhor vê a atuação de Gorbachev nas discussões ambientais?
Francisco Whitaker – Essa fundação foi criada por Mikhail Gorbachev em 1993, logo depois da Rio-92, onde a problemática das armas nucleares, das usinas nucleares e da contaminação por radiatividade foi discutida. Surgiu então, a ideia de criar uma instituição como a Cruz Vermelha, que fosse voltada especificamente para atender às vítimas da energia nuclear. Então, criaram a Cruz Verde, uma fundação que está sediada na Suíça. Quando ocorreu o desastre de Chernobyl, Gorbachev era presidente da União Soviética e passou a desenvolver um trabalho mundial de combate às armas e usinas nucleares. Ele desenvolve um grande trabalho em Chernobyl, de assistência às famílias vítimas do desastre.
Outras organizações atuam nesse sentido. No dia 12 de março desse ano, em ocasião do primeiro ano do acidente de Fukushima, um grupo francês protestou contra as usinas da França. Essa organização lançou um apelo para que no mundo todo se fizesse alguma coisa. Em mais de 110 países houve mobilizações nesta data. No Brasil as manifestações foram pequenas, restritas a dez cidades, conduzidas e introduzidas pela Coalizão e pela Articulação.
Nota:
[1] O acidente radiológico de Goiânia, amplamente conhecido como acidente com o Césio-137, foi um grave episódio de contaminação por radiatividade ocorrido no Brasil. A contaminação teve início em 13 de setembro de 1987, quando um aparelho utilizado em radioterapias das instalações de um hospital abandonado foi encontrado, na zona central de Goiânia, no estado de Goiás. Foi classificado como nível cinco na Escala Internacional de Acidentes Nucleares.
O instrumento deixado no hospital foi encontrado por catadores de um ferro velho do local, que entenderam tratar-se de sucata. Foi desmontado e repassado para terceiros, gerando um rastro de contaminação, o qual afetou seriamente a saúde de centenas de pessoas. O acidente com Césio-137 foi o maior acidente radiativo ocorrido fora das usinas nucleares. (EcoDebate)

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Impactos da crise nuclear no Japão

Os deletérios impactos da crise nuclear no Japão
O artigo aborda o acidente nuclear no Japão em 11 de março de 2011. Em decorrência do terremoto seguido de tsunami, foram danificados três dos seis reatores existentes no complexo Daiichi-Fukushima. Ocorreram explosões, seguidas da liberação de materiais radiativos ao meio ambiente. São mostrados os efeitos danosos nos casos da exposição do homem a radiações. Comenta-se a existência do principal nó górdio da geração nucleoelétrica, que é a produção do indescartável lixo atômico.
Em sua forma clássica, ao ser bombardeado por nêutrons, o urânio 235 gera como subprodutos de fissão o bário 142 e o criptônio 91, acrescidos da liberação de outros três nêutrons e geração de energia sob forma de calor. E isso pode ser representado pela equação: 235U + n ® 142Ba + 91Kr + 3 n [1,9 x 107 kcal/g 235U]. Os três nêutrons liberados colidem com outros átomos de urânio 235, que acabam por sustentar a chamada reação em cadeia. Nesse processo, há a produção de cerca de 30 produtos primários de fissão, com meias-vidas que variam de 30 segundos (ródio 106) a 30 anos (césio 137).
Dentre eles, além do césio, os mais preocupantes por serem deletérios aos seres vivos são o iodo 131, o próprio bário 140 (12,8 dias) e o estrôncio 90 (28 anos). No caso do iodo radiativo, ele produz nos homens diversos tipos de cânceres dos quais o mais comum é o da tireoide. Além disso, a literatura registra baixa na contagem de plaquetas e com consequentes sangramentos, inflamação e fibrose nos pulmões, sangramento no estômago e intestino delgado, queda de 50% nos glóbulos brancos e alteração na estrutura do DNA (o que é gravíssimo, já que a pessoa irradiada transmitirá informações genéticas erradas à progênie). Para mitigar seu terrível impacto, o que se costuma fazer é indicar a ingestão de iodeto de potássio. Pois, saturado de iodo estável, o corpo humano excreta o iodo radiativo por suor, urina e fezes. O caso do césio é mais complexo, já que, liberado na atmosfera, ele se deposita nas lavouras e contamina por longo período de tempo os vegetais com os quais nos alimentamos. O césio radiativo é potencial formador de câncer nos tecidos nervosos. De igual maneira, as emissões de estrôncio e bário radiativos são danosas, de vez que, ao se alimentar nas pastagens, os mamíferos os ingerem fixando-os no leite que deles consumimos. E isso é de extrema gravidade, pois, por serem metais alcalino-terrosos, eles se fixam nos nossos ossos, constituídos preponderantemente de cálcio. E como os raios atômicos do bário, estrôncio e cálcio são de dimensões próximas umas às outras, muito provavelmente ocorrerão trocas atômicas. E, com isso, a possibilidade da ocorrência de cânceres de ossos em virtude de o estrôncio ou bário radiativos permutarem de lugar com o cálcio. Naturalmente, é oportuno salientar que os maiores impactos incidem sobre as crianças, de vez que elas estão sujeitas às maiores multiplicações (e velocidades) de crescimento e produção das células.
Vale mencionar que o método clássico da descontaminação do césio 137 se dá pelo emprego, como agente quelante, de solução do azul da Prússia (ferrocianeto de ferro, de fórmula estrutural Fe7N18C18), assim chamado por ter sido usado antigamente no tingimento da cor azul nos uniformes militares prussianos. Na verdade, ao quelar, o césio forma-se um precipitado de cor castanha, o que comprova a eficiência do método.
Mesmo assim, as notícias envolvendo os recentes acidentes nucleares no Japão são altamente preocupantes. Se há quase 66 anos a catástrofe atômica para eles proveio do espaço aéreo, pelo lançamento de bombas atômicas por bombardeiros norte-americanos, dessa vez ela teve sua origem no tsunami formado no mar. É relevante mencionar que só no dia 6 de agosto de 1945 Hiroshima foi devastada. E, naquele ato, foram destruídos 13 quilômetros quadrados. O que resultou na morte instantânea de população estimada entre 70 mil e 250 mil pessoas. Contudo, por efeito da radiação residual, morreram até 31 de dezembro daquele mesmo ano outras 80 mil pessoas. E até hoje, os habitantes de Hiroshima e Nagasaki que sobreviveram têm carimbados nas suas cédulas de identidade a inscrição hibakusha (o que na língua nipônica significa “vítima das bombas”).
O que desejamos é que os planos de evacuação das regiões atingidas em território japonês sejam eficazes, evitando, com isso, a reedição da ocorrência de novos hibakushas. Danos ao meio ambiente, contudo, são inevitáveis e inexoráveis. É o oneroso preço da utilização de tecnologia ainda não amadurecida da fissão nuclear, que se mostrou problemática desde os anos 1960 do último século. Afinal, de lá para cá, já ocorreram no mundo todo ao menos sete acidentes nucleares de grandes proporções, envolvendo inúmeros óbitos. É impossível, no entanto, quantificar o número de mortes, já que muitas delas se deram em instalações nucleares secretas. Expediente esse, aliás, amplamente usado pelas nações que se utilizam ou desenvolvem pesquisas nucleares, sempre sob o pérfido e pífio argumento de tratar-se da imperiosa necessidade de preservação do chamado “segredo de Estado”.
Para agravar ainda mais o imbróglio, ao menos uma das unidades do complexo nuclear de Daiichi-Fukushima emprega o MOX como combustível. O MOX, abreviatura de Mixed Oxide (mistura de óxidos), é o combustível no qual um dos constituintes é o plutônio, numa proporção variável entre 3% e 10%. O plutônio é um elemento químico pesado, inexistente na natureza e que foi criado artificialmente em 1940 como um dos subprodutos do processamento de urânio pelas usinas nucleares. Os principais e mais perigosos isótopos são o plutônio 238 (meia-vida de 88 anos). E o 239 (meia-vida de 24 mil anos. Atenção! você não leu ou entendeu de forma equivocada. São 240 séculos mesmo). Trata-se de uma das substâncias mais radiotóxicas e perigosas das quais se têm notícia. Para isso, basta dizer que a inalação ou ingestão de um milionésimo de grama do plutônio 239 é simplesmente fatal.
Por todos esses dramáticos antecedentes, somos compelidos a postular as mais profundas e sensatas revisões nos projetos de implantação de eventuais (e desnecessárias, ao menos neste momento) novas plantas nucleares no Brasil. Afinal, temos na água das chuvas o fuel (combustível) de custo zero para o país. Além da enorme abundância das fontes renováveis de energia, representadas pela geração solar, biomassas, eólica e maremotriz.
O indescartável descarte do lixo atômico
O principal problema da fissão nuclear é a produção de rejeitos radiativos (também chamado lixo atômico), que podem emitir radiações ionizantes por milhares de anos. Como exemplo crucial mencionamos o plutônio 238, cuja meia-vida é de 88 anos. Caso mais dramático ainda é o do plutônio 239, com meia-vida de 240 séculos. Inexiste solução prática e, tampouco, em nivel mundial para o problema. Pois não se pode acelerar o processo do decaimento radioativo de um isótopo senão respeitar o seu tempo de meia-vida. Parte dos rejeitos podem ser reaproveitados como o 239Pu gerado nos reatores. E essa foi a opção adotada pelas autoridades nucleares do Japão de empregar o MOX numa das unidades do complexo de Fukushima.
Tradicionalmente os rejeitos nucleares são classificados em três tipos: (1) HLW (High Level Waste), que é o combustível irradiado pelo núcleo; (2) ILW (Intermediate Level Waste), representado pelo material metálico que entrou em contato com o combustível nuclear ou com o reator; e (3) LLW (Low Level Waste), que engloba as roupas de proteção, equipamentos de laboratório ou algum outro material que tenha tido contato com o material radiativo.
Os rejeitos do tipo ILW e LLW devem ser armazenados em locais fechados e blindados até que a atividade radiativa decaia em nível de baixo impacto ambiental. Já os rejeitos HLW devem ser isolados por milhares de anos. Algumas soluções já foram levantadas por pesquisadores. Até mesmo a possibilidade de enviar o lixo atômico para o espaço sideral. Onde em elevadíssimas altitudes a radiatividade é mais intensa ainda. Essa saída, contudo, esbarra na baixa confiabilidade no lançamento de foguetes. Prova disso é que, por volta de 1985, uma espaçonave tripulada norte-americana da missão Challenger explodiu 30 segundos após o seu lançamento da base de Cabo Canaveral.
Outras soluções sempre temporárias envolvem o sepultamento dos resíduos de alta radiatividade em minas subterrâneas de sal. É o que faz a Alemanha por supor que, como estruturas geológicas antigas e estáveis, as minas salinas desativadas se manterão íntegras por longo período de tempo. Já os Estados Unidos optaram por enterrar os rejeitos em regiões desérticas. Há décadas eles depositam o lixo atômico em túneis construídos no deserto do Arizona. E ainda está em fase de discussões acaloradas e de grandes polêmicas a escolha como local para depósito desse tipo de rejeito em Yucca Mountain (no Estado de Nevada e a 100 km de região habitada).
Situação em Angra
Em Angra dos Reis (RJ), que conta com duas centrais nucleares em operação e a terceira planta em fase de construção, os resíduos de baixa radiatividade (na maior parte luvas e equipamentos contaminados) são guardados em contêineres alojados em galpões de concreto construídos em prédio anexo às usinas.
Os de média atividade também ficam em galpões, mas recebem tratamento especial. “Garras” de metal empilham os recipientes que armazenam os líquidos do circuito fechado que passam pelos reatores, em galpões envoltos por concreto. O operador dessas “garras” fica em uma antessala protegida por vidros reforçados por chumbo para evitar contato com a radiação.
Ainda não foi definido, segundo o governo, o destino final do preocupante e sempre perigoso lixo nuclear brasileiro. Porém, as usinas são obrigadas a armazenar o material provisoriamente. Em 2019, esgota-se o espaço nos depósitos intermediários de Angras I e II. Ainda estão em andamento (sempre segundo o poder público) estudos para a construção de um depósito definitivo, onde os rejeitos de baixa e média atividade descansarão até que se tornem menos nocivos. Mas, por enquanto, nada foi decidido. O início do funcionamento de Angra III, previsto para dezembro de 2015, está condicionado à construção de um depósito definitivo.
Já os rejeitos de alta radiatividade, constituídos pelo combustível nuclear após sua utilização, são armazenados em uma “piscina” junto aos reatores. Embora alguns países reutilizem esse tipo de rejeito, as autoridades do Brasil dizem ainda não ter planejado reciclá-lo. O certo é que esse tipo de material deve permanecer com a usina permanentemente e sob cuidado, mesmo depois de ela ser descomissionadas (o que no jargão técnico significa ser desativada). (EcoDebate)

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Energia eólica é competitiva no Brasil?

A energia eólica é realmente competitiva no Brasil?
Desde a implantação do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), a energia eólica tem experimentado uma trajetória de forte difusão no Brasil. Após ser a fonte de geração com maior participação no programa (1.422 MW), a energia eólica passou a ter participação crescente nos leilões de expansão do sistema elétrico brasileiro.
Primeiramente, parques eólicos foram selecionados em leilões orientados para fontes com menores impactos ambientais (leilões de reserva – LER e leilões de fontes alternativas – LFA).
Posteriormente, no leilão de expansão com antecedência de três anos (A-3) ocorrido em 2011, aproveitamentos eólicos venceram o certame competindo diretamente com as demais fontes de geração.
Por intermédio do Proinfa e dos leilões, já foram contratados 7 GW de capacidade de geração eólica no Brasil. Desse total, 1,4 GW está em operação. O Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) considera que em 2020 a capacidade instalada de centrais eólicas no Brasil alcançará 11 GW.
Como a tabela I ilustra, essa trajetória foi acompanhada da redução do preço médio da energia eólica negociada nos leilões e do aumento do fator de capacidade dos projetos de parques eólicos.
Tabela I
Capacidade – Fator de Capacidade - Preço
MW                 %                                R$/ MWh
PROINFA - 1.422 - 37% - 270,32
LER 2009 - 1.806 - 43% - 148,40
LER 2010 - 528 - 51% - 122,69
LFA 2010 - 1.520 - 43% - 134,13
A-3 2011 - 1.068 - 45% -       99,48
LER 2011 - 861- 50% - 99,54
A competitividade da energia eólica no Brasil demonstrada nos leilões impressionou até mesmo especialistas setoriais, pois não é observada em outras experiências. Nos países em que a energia eólica se desenvolveu de forma mais significativa, os subsídios são bastante significativos. Alguns fatores podem explicar a vantagem da produção brasileira de energia eólica, como ventos mais favoráveis – principalmente no nordeste brasileiro -, complementação com a geração hidrelétrica e possibilidade de “estocagem indireta” de energia através dos reservatórios das usinas hidrelétricas. Essas características permitem ao Brasil lidar melhor com a intermitência da geração eólica, que é o principal limitante de sua difusão em sistemas predominantemente termelétricos.
O fator de capacidade considerado nos projetos brasileiros é substancialmente mais elevado do que a experiência internacional. Segundo a tabela II, o fator de capacidade médio observado nos dez países de maior capacidade de geração eólica é de apenas 21%. Ou seja, metade do fator médio considerado em projetos no Brasil.
Tabela II
País – 2008 – 2003/2007
Estados Unidos – 24% - 26%
Alemanha – 19% - 18%
Espanha – 22% - 25%
China – 12% - X
Índia – 18% - X
Itália – 16% - 19%
França – 19% - 22%
Reino Unido - 30% - 26%
Portugal – 23% - 23%
Dinamarca – 25% - 23%
Boccard (2009) aponta que há uma tendência de superestimação do fator de capacidade de parques eólicos projetados em relação ao que é observado no caso europeu. Segundo o autor, enquanto as estimativas do fator de capacidade da energia variam em um intervalo entre 30 a 35%, os valores observados da razão da energia produzida e da capacidade instalada são inferiores a 21% no período 2003-2007. O autor enfatiza que dessa forma, os custos são aumentados em dois terços e a redução de emissões decorrente da instalação dos parques eólicos é 40% inferior à planejada.
Os dados de geração observada nos parques eólicos brasileiros, publicados pelo ONS nos boletins mensais de geração eólica, sugerem que fenômeno parecido pode ocorrer no Brasil. A tabela III apresenta os fatores de capacidade estimados e observados das usinas eólicas operadas centralizadamente pelo ONS. O valor observado corresponde à razão entre a geração média observada e a capacidade de geração das usinas. Na região sul, o fator de capacidade observado é idêntico ao projetado, 31% na média. No entanto, na região nordeste, onde as usinas contam com fator de capacidade projetados mais elevados, os valores observados são bastante inferiores aos projetados. Na média, o fator de capacidade projetado é de 42% e o observado de 32%. Ou seja, as usinas eólicas do nordeste produziram 25% menos do que foi projetado (e contratado).
Tabela III
Usinas – Região - Fator de Capacidade Projetado - Fator de Capacidade Observado
OSÓRIO – S - 32,0%            - 29,1%
DOS ÍNDIOS – S - 30,0% - 28,9%
SANGRADOURO – S - 33,0% - 31,7%
CIDREIRA I – S - 32,5% - 33,7%
CHATO I – S - 26,5% - 27,6%
CHATOII – S - 26,5% - 29,1%
CHATOIII – S - 37,0% - 39,4%
RIO DO FOGO – NE - 34,0% - 31,5%
PRAIA FORMOSA – NE - 39,0% - 26,7%
ICARAIZINHO – NE - 43,0% - 42,1%
CANOA QUEBRADA – NE - 43,5% - 34,5%
BONS VENTOS – NE - 43,8% - 32,2%
ENACEL – NE - 43,5% - 27,7%
VOLTA DO RIO – NE - 47,0% - 33,3%
PRAIA MORGADO – NE - 50,0% - 25,5%
ALEGRIA I – NE - 32,0% - 21,8%
M SECO 3 – NE - 48,8% - 38,5%
M SECO 2 – NE - 46,2% - 41,3%
M SECO 1 – NE - 47,3% - 38,3%
M SECO 5 – NE - 50,4% - 29,4%
MÉDIA S – X - 31,4% - 31,4%
MÉDIA NE – X - 42,3% - 31,7%
Ainda que o período de observações seja limitado para as usinas que começaram a operar em 2010 e 2011, alguns fatos são marcantes. Nenhuma das 13 usinas eólicas da região nordeste alcançou o fator de capacidade previsto. O fator de capacidade alcançado é quase metade do projetado em algumas usinas, como Mangue Seco 5 (valor observado 42% inferior ao projetado) e Praia Morgado (49% inferior ao projetado).
As novas usinas eólicas que foram selecionadas através de leilões e que devem entrar em operação nos próximos anos contam com estimativas de fatores de capacidade mais elevadas que as usinas que já estão operando. Se confirmada a tendência apontada por Boccard (2009) e essas usinas não alcançarem o nível de operação projetado, as condições que propiciaram a difusão da energia eólica em bases competitivas no Brasil são colocadas em xeque.
Com menores fatores de capacidade, as eólicas são relativamente mais caras. Considerando a diferença observada no nordeste como parâmetro, as eólicas seriam 33% mais caras do que o seu valor nos leilões. Em termos gerais, o impacto seria um maior custo operacional que o previsto no sistema elétrico e uma distorção na seleção de tecnologias, pois outras fontes poderiam ser selecionadas. Para os empreendedores, fatores de capacidade inferiores aos projetados podem implicar em prejuízos. Segundo as regras dos leilões, eventuais diferenças entre energia gerada e projetada podem ser compensadas ao longo dos anos. Mas se o diferencial anual é superior a 10%, há previsão de multa e aquisição de energia para suprir a diferença no mesmo ano.
Outro problema que as usinas eólicas têm enfrentado no Brasil é cumprimento do cronograma de obras. Segundo o acompanhamento da Aneel, apresentado na tabela IV, dos 6,4 GW de expansão de geração eólica até 2015 apenas 24% não enfrenta qualquer problema para a entrada em operação. 70% da expansão é classificada em “amarelo” pela Aneel, indicando possíveis atrasos no andamento das obras ou na obtenção de licença.
Tabela IV
Situação - MW          
Sem impedimentos - 1.540 - 24%
Com impedimentos - 4.524 - 70%
Graves problemas - 377 - 6%
Esses problemas não inviabilizam a difusão de energia eólica, mas, certamente, colocam questionamentos quanto à trajetória de êxito competitivo observada até recentemente. Como a fonte eólica tem vantagens ambientais que não são incorporadas economicamente no Brasil, o sobre custo pode se justificar. No entanto, é essencial que o fator de capacidade seja acompanhado para que os mecanismos de incentivo sejam desenhados de forma adequada e a expansão ocorra em bases sustentadas. (ambienteenergia)