Trocar diesel por gás natural
liquefeito no transporte de carga permite economia de até 60% em São Paulo.
Agência FAPESP – A
substituição do óleo diesel pelo gás natural liquefeito (GNL) no transporte de
carga reduziria significativamente o custo do combustível e as emissões de
gases de efeito estufa e outros poluentes no Estado de São Paulo. É o que
mostra um estudo conduzido no Centro de Pesquisa para Inovação em Gás (RCGI), constituído pela
FAPESP e pela Shell.
Com sede na Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), o RCGI é um dos Centros de
Pesquisa em Engenharia (CPE)
financiados pela FAPESP em parceria com grandes empresas.
“Os maiores benefícios,
tanto no que diz respeito à redução da poluição quanto do preço dos
combustíveis, são percebidos na capital paulista e em Campinas, regiões em que
o diesel é mais caro do que no resto do Estado e que têm maior potencial de
substituição por GNL. Nossos resultados mostram que, na cidade de São Paulo, o
GNL pode ser até 60% mais barato que o diesel”, disse à assessoria de
comunicação do RCGI Dominique Mouette,
professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP e autora
principal do estudo.
Mouette coordena no centro
um projeto que estuda a viabilidade de implantar um “corredor azul” no Estado
de São Paulo, conceito surgido na Rússia para designar rotas nas quais os
caminhões usam o gás natural liquefeito em vez de diesel. Resultados recentes
da pesquisa foram publicados na revista Science of Total Environment.
Trabalhadores descarregam
caminhão em São Paulo 21/7/2018.
O GNL é obtido por meio do
resfriamento do gás natural a -163ºC. O processo de condensação reduz o volume
do combustível em até 600 vezes, tornando possível o transporte em carretas
criogênicas até mesmo para locais distantes de gasodutos.
Na pesquisa, foram
analisados quatro cenários de substituição do combustível. “No melhor deles, a
adoção do GNL reduziria em até 40% o custo do combustível, 5,2% as emissões de
CO2 equivalente [medida usada para comparar o potencial de aquecimento
de vários gases de efeito estufa]; 88% as de material particulado; 75% as de
óxidos de nitrogênio; e eliminaria as emissões de hidrocarbonetos”, disse Pedro Gerber Machado,
pesquisador do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP e coautor do
artigo.
“A metodologia considerou
inicialmente dois contextos: um para as regiões geográficas servidas por
gasodutos, denominado cenário restrito (RS); e outro abrangendo as 16 regiões
administrativas do estado, chamado de cenário estadual (SS). Os dois contextos
originaram diferentes versões do corredor azul, com respectivamente 3,1 mil e
8,9 mil quilômetros de estradas”, explicou Machado.
Segundo ele, para cada
cenário foram consideradas duas formas de distribuição de GNL: a primeira foi a
liquefação centralizada com distribuição rodoviária, que gerou dois
subcenários, um com liquefação centralizada (SSCL) e outro restrito, com
liquefação centralizada (RSCL). E a segunda forma de distribuição seria a
liquefação localmente, na região em que o combustível seria usado, o que
dispensaria a necessidade de distribuição de GNL por rodovias. Dela derivam
dois outros subcenários: o estadual, com liquefação híbrida local e central
(SSHL), e o restrito, com liquefação local (RSLL).
Custos comparados
“O cenário denominado RSLL
apresenta a menor média de diferença de preço para o consumidor final entre o
GNL e o diesel, o que significa que, neste caso, o processo de entrega do gás é
mais caro por questões de escala e de custo operacional”, disse Machado.
Já o cenário RSCL oferece
o menor preço de gás para o consumidor final: US$ 12 (RS$ 46) por MMBTU (milhão
de unidades térmicas britânicas), ao passo que o diesel, neste mesmo cenário,
custaria US$ 22 (R$ 84,5) por MMBTU. “A diferença entre o preço do GNL e do
diesel nesse cenário também é a maior de todas: US$ 10 [R$ 38] por MMBTU”,
disse o pesquisador.
Entretanto, o cenário RSLL
foi desenhado no contexto de um corredor com menor extensão e o investimento
seria de US$ 243,4 (R$ 940) por metro. Ao contrário do que acontece no SSHL,
que tem o menor valor de investimento por metro entre os quatro subcenários
(US$ 122,1 ou R$ 470 por metro).
Emissões evitadas
Segundo Machado, para o
cálculo das emissões dos gases de efeito estufa e dos poluentes foram levados
em conta apenas os dois macrocenários: o estadual (SS) e o restrito (RS).
“Quando se trata do uso de GNL, as emissões de gases de efeito estufa diferem
das de diesel por conta do metano e do óxido nitroso, ambos com potencial de
aquecimento global. Se o combustível usado é o diesel, o dióxido de carbono é
responsável por 99% das emissões de CO2-eq. No entanto, se usado o
GNL, o CO2 representa 82% das emissões de CO2-eq,
enquanto o metano é responsável por 10% e oóxido nitroso, por 8%”, disse.
No que se refere às
emissões de gases de efeito estufa resultantes da logística de transporte do
GNL, o pior cenário foi o SSCL, que corresponde a 1% do total de CO2-eq
emitido com o uso de caminhões. No SSHL, a logística representa 0,34% das
emissões, e no RSCL, a logística corresponde a 0,28% das emissões.
Quanto aos poluentes, no
cenário RS seriam evitadas 119.129 toneladas de emissões de material
particulado, 7,3 milhões de toneladas de óxidos de nitrogênio e 209.230
toneladas de hidrocarbonetos. No cenário SS, os benefícios são ainda maiores,
com redução de 163 mil toneladas de material particulado, 10 milhões de
toneladas de óxidos de nitrogênio e 286 mil toneladas de hidrocarbonetos.
Na avaliação dos autores,
a redução de 5.2% nas emissões de gases de efeito estufa observada no cenário
estadual, quando se compara a combustão de gás natural e a de diesel, talvez
não seja um resultado tão grandioso, mas há reduções consideráveis dos
poluentes locais, como óxidos de nitrogênio (75%), material particulado (88%) e
hidrocarbonetos (100%).
Em documento entregue a
Bolsonaro, ABEGÁS propõe trocar diesel por GNV em ônibus e caminhões.
Primeiro ônibus brasileiro
movido a biometano/GNV, produzido pela Scania, foi destaque em Campinas no
Fórum Brasil de Gestão Ambiental em 2017.
Apesar das vantagens
econômicas e ambientais apresentadas, o GNL ainda enfrenta barreiras
regulatórias para sua utilização generalizada no setor dos transportes. “Ele
não é regulamentado como combustível de veículos no Brasil. A maioria do GNV
[gás natural veicular] usado é gás natural comprimido, o GNC”, disse Mouette. (ecodebate)