Três anos depois do acidente nuclear, a luta contra a
radiação de Fukushima
Após sofrerem
contaminação radioativa, moradores de Namie, cidade nos arredores da usina
nuclear, foram evacuados e agora controlam, eles mesmos, o seu estado de saúde.
Há dois casos de câncer entre crianças.
Minako Fujiwara
lembra com tristeza de seu cachorro, que morreu em junho do ano passado. “Ele
perdeu os pelos do pescoço, e a pele escureceu”, conta a japonesa de 56 anos.
Tais sintomas também foram registrados em animais de Chernobyl. O cão de Minako
morreu provavelmente por excesso de radiação. Quando a cidade de Namie, a nove
quilômetros da usina nuclear de Fukushima, foi evacuada, a família teve que deixar o animal para trás.
Fora pressão alta,
Minako não teve até agora qualquer problema de saúde. Mas o médico Shunji
Sekine, de Namie, teme consequências radiológicas também para seres humanos. Em
seu consultório, agora em Nihonmatsu, nas redondezas de um assentamento de
contêineres que abriga 230 famílias retiradas de Namie, ele examina quase
diariamente as tiroides dos habitantes da cidade abandonada. Segundo ele,
principalmente crianças e adolescentes estão ameaçados pela captação de iodo
radioativo.
“Até agora faltam
estudos maiores, mas eu vejo uma conexão entre o acidente nuclear e o câncer”,
diz o médico, que até a sua aposentadoria no Hospital Universitário de
Fukushima trabalhava como especialista em câncer de tiroide e de mama.
Cerca marca zona de isolamento em Namie
Segundo dados
oficiais do início de fevereiro, em cerca de 250 mil crianças e adolescentes
examinados foram encontrados 33 casos de câncer, ou seja, 13 ocorrências a cada
100 mil habitantes. A cifra é quase quatro vezes maior que a média mundial para
todas as faixas etárias.
Mesmo assim, a
administração de Fukushima não pretende publicar detalhes relevantes sobre os
casos de câncer. Todas as perguntas de Sekine, como, por exemplo, sobre o
antigo endereço das crianças com câncer e sobre o seu grau de contaminação
permaneceram sem respostas sob alegação de respeito à privacidade de dados. Em
vez disso, o assessor de saúde da administração municipal e principal
especialista em tiroide do Japão, Shunichi Yamashita, tenta acalmar os ânimos:
“Ainda não chegou a hora de se fazer qualquer afirmação. Para tal, ainda temos
de esperar novos exames.”
Autoridades se calam
Mas a cidade de Namie
não quer esperar pela ajuda do governo – não é a primeira vez que uma cidade é,
de certa forma, esquecida. Quatro dias após a explosão do reator, em 15 de
março de 2011, veio a ordem para evacuar Tsushima, no noroeste. Os moradores
foram então enviados para dentro de uma nuvem radioativa invisível e sofreram
mais radiação do que se tivessem ficado em casa. As autoridades em Tóquio
sabiam muito bem disso devido às previsões de computador. No entanto, elas se
calaram, porque temiam pânico.
Devido a essa
experiência traumática, Namie coleta o máximo possível de dados sobre os
efeitos radioativos, como diz o chefe do departamento de saúde local, Norio
Konno. “Queremos manter o controle sobre a saúde de nossos moradores”, afirmou.
Se alguém quiser
pedir uma indenização da Tepco, então precisa de provas judiciais. Por esse
motivo, Namie adquiriu, por conta própria, um scanner corporal, que se encontra
agora no assentamento de evacuados em Nihonmatsu. Todos os moradores com menos
de 40 anos podem ser examinados, uma vez por ano, para constatar a presença de
Césio 134 e 137. O Estado só oferece essa possibilidade apenas a cada dois
anos.
Até agora, metade dos
moradores de Namie aceitou esse exame extra. No entanto, alguns se recusaram a
participar de forma consciente. Kazue Yamagi conta sobre sua filha de 21 anos,
que se recusa a examinar a tiroide. “Ela se mudou de Fukushima e evita todas as
notícias na TV”, disse a mãe da jovem, com tristeza na voz. “Ela também não
quer se casar. Ela diz que, como vítima da radiação, não tem mais futuro.”
O médico Shunji Sekane examina a tiroide de uma
criança
Estigma
Os Hibakusha, como
são chamadas as vítimas da radiação de Hiroshima e Nagasaki, são estigmatizados
até hoje no Japão. Por esse motivo, também para os que foram retirados de
Fukushima deve haver uma lei de apoio como houve para as vítimas das bombas
atômicas, exige o chefe do departamento de saúde local. “As pessoas de Namie
também se sentem como Hibakusha. Os seus genes contaminados serão herdados
ainda por gerações”, afirma Konno.
Konno distribuiu
passaportes de radiação a todos os moradores, da mesma forma que os usados em
Hiroshima e Nagasaki. No passaporte, uma coluna, por exemplo, lembra o portador
sobre a prevenção do câncer e o exame de leucemia.
Entre os 3.200 jovens
moradores de Namie, houve até agora dois casos de câncer de tiroide. A cifra
surpreendeu Shinjii Tokonami, especialista em radiação da Universidade
Hirosaki, que assessora a cidade de Namie: “É maior do que o esperado.
Possivelmente, o motivo disso está na grande precisão dos aparelhos. É preciso
esperar cinco anos e depois mais cinco anos”, disse o especialista. “Então
podemos dizer alguma coisa.”
Mas ele já tem uma
tese própria: na verdade, deveria haver até mais casos de câncer de tiroide do
que aqueles já constatados. Mas os moradores da costa comem grande quantidade
de algas que contêm iodo, disse Tokonami. Por isso, nas tiroides de muitos
jovens, sobrou pouco lugar para o iodo contaminado que o reator nuclear
espalhou sobre Fukushima. (ecodebate)
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