Falta de incentivo do Poder Público é maior entrave para
popularização da energia solar
“Hoje, com 30 lacas em duas unidades, estou gerando em torno
de 900 Kw ao mês. Eu fico satisfeito de poder ligar meu ar condicionado, minha
televisão durante o dia, e saber que não estou pegando nada de ninguém. Apenas
do sol”, comemora o metalúrgico.
Enquanto no Brasil a crise hídrica chama a atenção para o futuro do
abastecimento energético pelas hidrelétricas, a ONU celebra em 2015 o Ano
Internacional da Luz. O foco é reconhecer a importância das tecnologias
associadas à luminosidade, como é o caso da geração de energia solar fotovoltaica.
Se em países como a Alemanha, referência em
energia solar, o uso deste tipo de tecnologia representa 20% da fonte de
energia do País, no Brasil esta solução ainda está engatinhando. Em dezembro do
ano passado, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) contratou
diversos novos projetos para a
implantação para a geração de energia solar, mas até então muito se dependia do
empreendedorismo individual de quem queria fazer a diferença.
Este é o caso de Getulio Hoffmann de Oliveira, que relata em
entrevista por telefone à IHU On-Line. Morador de Sapucaia do Sul, na região
metropolitana de Porto Alegre, ele instalou em 2013 um conjunto de placas de
energia solar e um alternador em sua casa, tornando-se o primeiro gaúcho a
devolver o excedente de energia para a concessionária local, a AES Sul. Hoje já
são 30 placas em sua propriedade, que produzem 900 kw por mês, e abastece um
terreno onde fica a sua casa e outras duas onde moram seus filhos e netos.
Getulio é um homem de modos simples, e que
investiu no que acreditava. Ele afirma que em sua conta de luz paga apenas as
taxas de administração local, mas reclama da falta de incentivo do Estado.
Atualmente, o governo do RS cobra 25% de ICMS
de toda a energia produzida e consumida no local. Estados como Tocantins já isentam esta cobrança, mas impostos
sob a importação das placas solares continuam sendo empecilho para quem busca
tal empreendimento.
“Esses dias vi no jornal que uma casa popular gasta, cerca de 100 kw por mês. Como
cada placa solar gera em torno de 33 kw ao mês, com três já seria possível
abastecer a casa toda durante o dia. E isso aumentando em apenas R$ 3 mil e
poucos os gastos com da construção”, sugere. Em meio a comunidades do interior
que ainda hoje não estão ligadas a rede de energia, Getulio defende
que apenas a informação vai ser capaz de sensibilizar as pessoas para as
vantagens individuais e ambientais da geração de energia.
Getulio
Hoffmann de Oliveira é metalúrgico
aposentado e engajado no uso e divulgação da energia solar fotovoltaica.
IHU On-Line- O que o levou a buscar a geração de sua
própria energia? Você já trabalhava com atividades relacionadas a eletricidade?
Getulio H.
de Oliveira- Eu sempre
tive vontade de produzir energia elétrica para que o nosso ambiente ficasse
agradecido. O primeiro passo foi pensando no meio ambiente, mesmo. Eu sou
metalúrgico aposentado, mas na comunidade de Pixirica em Morrinhos do Sul (180 km de Porto Alegre), onde eu
morava, a maioria das casas quem fez a ligação elétrica fui eu. Já na
comunidade em que eu nasci, em Rio do Pinto –
hoje o município de Itati, há 123 km da Capital – até hoje não se tem energia
elétrica.
IHU On-Line- E acredita que foi a falta de luz em Rio do
Pinto que te incentivou a pensar em alternativas para a eletricidade?
Getulio H.
de Oliveira- Com certeza.
Porque quando eu comecei a ficar com 12, 13 anos de idade, eu pensava no meu
pai. Ele tinha colocado um moinho de
moer milho que funcionava dia e noite na comunidade. Seria muito fácil colocar
um dínamo ou um alternador nesse moinho, mas não as pessoas não tinham informação
para isso. Não tinha alguém para ir a esta pequena comunidade e explicar o que
poderia ser feito para, já na época, disponibilizar eletricidade para as casas.
O lugar já poderia estar mais avançado, mas ainda há não há luz elétrica para as famílias.
IHU On-Line- Pensando na disseminação da informação,
você costuma compartilhar com as pessoas o que é preciso para instalar seus
próprios painéis solares?
Getulio H.
de Oliveira- Muita gente
me ligou e todos os dias, praticamente, alguém me aborda para conversar sobre
isso. Quem tem muito interesse, mesmo, são os donos de supermercado – que gastam muita energia elétrica.
São eles os mais interessados em fazer esse tipo de instalação hoje.
IHU On-Line- Qual o grande entrave que estas pessoas
interessadas enfrentam?
Getulio H.
de Oliveira- O preço. São
produtos importados e as taxas de importação ainda são muito altas. É cerca de
60% para entrar no Brasil e mais 40% para entrar no estado. Hoje uma placa
custa em torno de R$ 925, aqui no Rio Grande do Sul. É preciso além das placas
um inversor – que vai modificar a energia e a ligar a rede com a mesma
qualidade que a da AES Sul – e
uma mão de obra especializada, um projeto de um engenheiro responsável. Na
minha casa, contratamos uma empresa especializada que montou o projeto, e a mão de obra
foi nossa, mas com acompanhamento. A minha foi a primeira residência gaúcha a
ter a geração de energia, então ela teve que ser muito bem feita e caprichada
para que servisse de modelo para
outras pessoas.
IHU On-Line- A concessionária deu
suporte ao projeto?
Getulio H.
de Oliveira- Sim, eu
fiquei até surpreso. A partir do momento em que meu projeto apareceu na ANEEL, eles passaram a o acompanhar de perto.
Eles fizeram várias visitas aqui em casa; um engenheiro da AES Sul sempre dava
entrevistas aqui em casa, e incentivava as pessoas a fazerem o mesmo, pois
assim haveria mais água nas represas para se poder usar durante a noite.
IHU On-Line- Você vê interesse do poder
público em incentivar essa tecnologia?
Getulio H.
de Oliveira- Não. Uma das
maiores barreiras, certamente, é o interesse do poder público. Esses dias vi no
jornal que uma casa popular gasta, em média, 100 kw por mês. Como cada placa
solar gera em torno de 33 kw ao
mês, com três já seria possível abastecer a casa toda durante o dia. E isso
aumentando em apenas R$ 3 mil e poucos os gastos com da construção.
Além disso, aqui no Rio Grande do Sul o governo cobra ICMS da energia de
energia para uso em casa. Se eu dou 1 kw para a AES Sul, ela me devolve 1 kw na
conta de luz. No entanto, quando esse kw volta, eu preciso pagar 25% de ICMS
pela energia que eu produzi para gastar no mesmo local. Em alguns estados, como
o Tocantins, não existe essa cobrança, mas aqui temos esse problema.
IHU On-Line- Em 2015, a ONU está
celebrando o “Ano internacional da Luz”, que promove a geração de energia
própria. O que você pensa que falta para esta tecnologia fazer mais parte do
dia a dia das pessoas?
Getulio H.
de Oliveira- Falta divulgação
pelas rádios e canais de TV. E no caso dos Estados, como o Rio Grande do Sul,
eliminar um pouco o ICMS. Não
ser mais 25%, mas talvez 15% para quem produzir energia a ser gasta no mesmo
lugar em que foi gerada. Só com esta medida, muitos donos de supermercado se
animariam mais a implantar. Eu sei porque eles sempre vem falar comigo sobre
isso.
IHU On-Line- Você acredita que esse
empreendimento traz benefícios econômicos, ou as vantagens são mais na ordem da
preservação ambiental?
Getulio H.
de Oliveira- A cada ano
que passa, a energia elétrica fica mais cara. E não sabemos como será nos
próximos dois ou três anos. Por isso eu ainda acho que é lucrativo. Ano
passado, trabalhei o ano todo sem pegar dinheiro em. Hoje, com 30 placas em duas unidades, estou gerando em
torno de 900 kw ao mês. A fatura da conta de luz vinha antes na ordem dos R$
200 ou R$ 250. Atualmente vem perto de R$ 30 ou R$ 40, que representa o ICMS, a
taxa da Concessionária e a taxa da Iluminação pública. No total, 356 kw já
foram devolvidos a AES Sul, e
a sobra da energia pretendo deixar com meus filhos e netos que moram no
terreno. Eu fico satisfeito de poder ligar meu ar condicionado, minha televisão
durante o dia, e saber que não estou pegando nada de ninguém. Apenas do sol.
(ecodebate)
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