E se houvesse um acidente nuclear em uma usina
instalada no Rio São Francisco?
O acidente mais grave que pode
ocorrer em uma usina nuclear é a liberação de material radioativo para o
ar-terra-água. Nunca uma usina poderá explodir tal qual uma bomba atômica. Por
uma razão simples. O combustível usado na usina tem uma concentração do
material físsil bem inferior do que a usada em uma bomba nuclear. Ou seja, o
urânio que se presta a fissão nuclear (reação química com quebra do núcleo de
um átomo com a liberação de grande quantidade de energia) no reator de
uma usina, o urânio 235, tem uma concentração em torno de 3 a 5%. Enquanto para
aplicações militares ultrapassa 85%.
Assim é errôneo pensar, e
comparar uma usina para produzir energia elétrica como uma bomba nuclear.
Portanto uma bomba nuclear e um reator nuclear são coisas
diferentes. Todavia acidentes existem nas usinas, e são classificados em
uma escala introduzida pela AIEA (Agência
Internacional de Energia Atômica) no ano de 1990.
A Escala Internacional de Acidentes Nucleares e
Radiológicos (INES – International Nuclear Event Scale) estabelece
uma escala de gravidade de incidentes e acidentes nucleares, facilitando assim
a compreensão e as medidas para enfrentar o evento. Ao todo são 7 níveis, sendo
os 3 primeiros de incidentes e os 4 subsequentes acidentes. O acidente mais
grave ou superior (nível 7) consiste no vazamento em larga escala, para fora da
usina, de material radioativo, com efeitos amplos sobre a saúde da população
e do meio ambiente. Sendo reconhecido nos níveis 6 e 7 os acidentes de
Chernobyl, na Ucrânia (1976), o de Three Mile
Island na Pensilvânia-USA (1979), e o de Fukushima no Japão (2011).
As normas e procedimentos
internacionais impostas para garantir as condições de segurança de uma usina
núcleo-elétrica são muito rígidas. E a probabilidade de um acidente de
grandes proporções acontecer é pequena, mas mesmo assim sempre existe. Por
muito tempo, e ainda hoje, os defensores da energia nuclear vendem a imagem de
que as usinas estão imunes a acidentes, o que não é verdade. Não existe risco
zero de acontecer um acidente, mesmo o de nível 7.
E ai que está toda a questão, e
a pergunta que não quer calar. Vale o risco de instalar uma usina, sabendo que
um acidente pode provocar uma tragédia sócio-econômica-ambiental de grandes
proporções, local, regional e mesmo planetária? Sem dúvida, não existe
nada de tão assustador do que um acidente com radiação liberada para o meio
ambiente, atingindo toda forma de vida.
No planejamento governamental,
declarado prioritário pelo atual governo, está o desenvolvimento do programa
nuclear, que prevê a conclusão de Angra III, projeto elaborado na década de
1970, cuja construção foi iniciada na década de 80. Sua construção sofreu
interrupção, sendo reiniciada em 2009, e suspensa novamente em 2015, após
revelações de denúncias de corrupção. Estima-se que serão necessários mais
17 bilhões de reais para a conclusão desta obra.
A construção de novas usinas
nucleares no Brasil, também estaria nas prioridades governamentais, com
a construção de mais 8 usinas nas regiões Nordeste e Sudeste. No caso da
região Nordeste, este empreendimento estaria localizada ao longo do rio São
Francisco em locais já estudados pela Eletronuclear (Atlas Nuclear de
Localização de Centrais Nucleares no Brasil). Um desses locais anunciados foi o
município de Itacuruba no sertão pernambucano.
A denúncia dos grupos
contrários as usinas nucleares em nosso país, no caso do Nordeste
particularmente, alerta para uma situação gravíssima. A contaminação
radioativa, caso haja vazamento, de um rio que percorre 5 estados nordestinos,
e atende a mais de 500 municípios ao longo de sua bacia. Estamos falando de
algo em torno a 20 milhões de pessoas impactadas. Sendo que esta
região concentra 28% da população brasileira, e 15% do PIB (Produto Interno
Bruto).
Então, o que seria do Rio da
Unidade Nacional, com relação a vida existente ao longo de seu percurso e de
seus afluentes que dependem da água do rio, no caso de vazamento radioativo, e
de sua contaminação? Por mais que setores interessados defendam a
construção de usinas, minimizando, e mesmo desdenhando a possibilidade de
um acidente nuclear, ele existe, pode acontecer, e já aconteceu em outros
países.
No caso de um acidente, os
principais gases que poderiam vazar para a atmosfera seriam o césio 137, aquele
do acidente de Goiânia em 1987 (considerado maior acidente radiológico do
mundo), e o iodo 131. O césio provoca náusea, vômito e diarreia; ingerido
em grandes proporções, mata em poucas horas. O iodo 131 em grandes quantidades,
provoca tumores malignos em órgãos internos do corpo humano. Também ocorre
escape de isótopos de nitrogênio e argônio radioativo.
Os reflexos de um acidente de
tal natureza afetaria o turismo na região, provocando uma debandada geral. Pois
quem visitaria um lugar que sofreu um acidente radioativo, mesmo que as
autoridades digam que está tudo sob controle? Não haveria visitação,
é o que deve pensar a esmagadora maioria dos turistas que visitam todos os
anos, e aportam à região bilhões de reais. Esse dinheiro desapareceria.
A liberação de radiação
atingiria a água do rio. O gás em função das condições atmosféricas poderiam
ser espalhados a várias centenas e mesmo milhares de quilômetros, atingindo as
aves e animais e populações ribeirinhas. Além de se infiltrar no solo,
inviabilizando a agricultura e criação de animais, podendo atingir e contaminar
o lençol freático. Desequilibraria todo o ecossistema local. A pesca seria
afetada, e toda renda proveniente desta atividade desapareceria da noite para o
dia.
Para
uma simples análise sobre o significado financeiro de uma tragédia nuclear,
levemos em conta o custo total do acidente de Fukushima. Incluindo a
descontaminação e as indenizações às vítimas, o custo pode chegar a 125 bilhões
de dólares – 100 bilhões de euros), segundo a empresa Tepco, que administra a
central nuclear destruída pelo tsunami em 11 de março de 2011. A catástrofe de
Fukushima, a mais grave do setor desde Chernobyl (Ucrânia) em 1986, provocou
grandes emissões radioativas no ar, no solo e nas águas da região, e forçou
cerca de 100.000 pessoas a abandonarem suas casas. Imagine agora o
significado desta catástrofe para um pais como o Brasil, que tem a
economia capenga, e com tantas demandas, ainda teria condições de suportar tal
dispêndio?
Sejamos claros: trata-se da
possibilidade de uma catástrofe que afetará muitas gerações, tornando
inabitável esta parte do Brasil. Pode ser evitada, caso decidamos não construir
usinas nucleares, e apoiarmos outras opções disponíveis, como as fontes renováveis
de energia abundantes em todo país. (ecodebate)
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