sábado, 18 de julho de 2015

Luz no fim do túnel

A baixa quantidade de chuvas e os consequentes apagões mostraram que está na hora de o Brasil ampliar sua matriz energética. As fontes eólica, solar e nuclear são as principais saídas.
Como mostrou a Revista da FIEC em sua edição de fevereiro, os apagões ocorridos nos últimos anos serviram para que governos e especialistas chegassem, definitivamente, a dois consensos: o atual sistema energético do Brasil não dá mais conta de suas demandas e há urgência para diversificar a matriz energética, sob pena de o país parar nos próximos anos se nada for feito, já que todas as fontes geradoras, incluindo as termelétricas, estão ligadas a todo vapor, literalmente.
A falta de energia é um dos responsáveis pelo atraso do Brasil, com reflexos diretos no baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), o menor entre os países emergentes. Os cofres do governo também sofrem prejuízos bilionários, uma vez que arca com os custos da geração de energia, além de manter a conta do consumidor sob controle. Estima-se que essas manobras sangraram os cofres públicos, nos últimos dois anos, em 19 bilhões de reais.
Diferente de países desenvolvidos, que cuidaram de buscar alternativas para esse setor décadas atrás, a estratégia brasileira, durante muitos anos, foi centralizada apenas na matriz hidrelétrica. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME), quase 70% da energia elétrica brasileira são provenientes da hidroeletricidade. Uma energia limpa, mas com sérios inconvenientes. Primeiro, o seu potencial gerador fica em áreas de pouca densidade urbana e muito distante (especificamente na Região Norte) dos maiores centros consumidores.
Isso enseja vultosos gastos em gigantescas linhas de transmissão, ocasionando, por sua vez, desperdício de energia até a chegada ao destino final. Sem contar que os milhares de quilômetros de ligações deixam o sistema vulnerável às intempéries e queimadas, apontadas, pelo próprio governo, como causas de vários blecautes.
O outro problema do uso das hidrelétricas é a sua dependência das chuvas para funcionar. Se São Pedro não abrir as torneiras por dois anos consecutivos, é certo que haverá dificuldades no ano seguinte, como agora, quando o santo não está sendo generoso e o governo precisou acionar as usinas térmicas, mais poluentes e caras. Se este ano não chover forte até maio, teremos em 2015 de muito sufoco para todos os setores produtivos.
Some-se a isso o fato de estar havendo uma redução gradual da capacidade de regularização do sistema elétrico no país por parte das hidrelétricas. É o que mostra um estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Segundo o relatório, em 2001, a capacidade de regularização do Sistema Interligado Nacional (SIN) era de 6,27 meses, ou seja, se os reservatórios estivessem completamente cheios haveria energia armazenada sob a forma de água capaz de atender à demanda sem a necessidade de geração complementar a partir de outras fontes, por esse período. Já em 2012, a capacidade de regularização do sistema baixou para 4,91 meses, queda de quase 25% em comparação ao que foi verificado onze anos antes.
Conforme a Firjan, a capacidade de regularização dos reservatórios está caindo em função da inclusão de mais usinas a fio d’água na matriz, cujo modelo de produção não necessita de amplo reservatório e de gigantescas estruturas. Na fio d’água, não são necessárias a geração e a manutenção de grande estoque de água e de barragem, uma solução encontrada para evitar não inundar cidades e áreas verdes. Esse sistema está sendo implementado na construção da Usina de Belo Monte; Santo Antônio e Jirau também usam o mesmo modelo.
“O potencial hidrelétrico brasileiro está no Norte, onde o regime de chuvas é concentrado e dependente da hidrologia”, explica Tatiana Lauria, especialista em competitividade industrial e investimentos da Firjan. Se a demanda de energia seguir em trajetória ascendente e a ampliação do parque hidráulico for sustentada quase exclusivamente por usinas a fio d’água, a expectativa da Firjan é que a perda da capacidade de regularização do sistema atingirá 3,35 meses em 2021, uma queda de 50% frente a 2001.
Ainda indispensáveis
Quando há escassez de chuva aliada ao forte calor, o preço da energia elétrica dispara por causa do aumento do consumo dos eletrodomésticos, como ar-condicionado e ventilador. Foi isso que ocorreu com a energia de curto prazo, quando, em fevereiro passado, chegou a 822,83 reais por megawatt-hora (MWh). O recorde anterior, de 684 reais por MWh, foi entre 30 de junho e 6 de julho de 2001, época em que foi decretado racionamento de energia pelo governo, mas não havia geração térmica.
Hoje, para atender à demanda, todo o sistema térmico de geração, construído no Brasil em menos de dez anos, teve de entrar em operação. No mercado de curto prazo, distribuidoras e grandes indústrias compram energia para necessidades imediatas.
Atualmente, movidas pela queima de combustíveis fósseis, como carvão, óleo ou gás, mais caros e poluentes, as usinas termelétricas são indispensáveis e vêm ganhando cada vez mais estímulo para entrar em operação, porque são mais rápidas para se construir e podem ser instaladas em locais perto das regiões de consumo, reduzindo o custo com torres e linhas de transmissão. É fato que, se não fossem elas, o Brasil teria entrado em colapso nos últimos anos.
Na região Nordeste, sua produção já é superior às demais. Em 16 de fevereiro deste ano, as termelétricas passaram a ser responsáveis pela maior parte da energia gerada, superando, pela primeira vez na história, a energia oriunda das hidrelétricas. A informação foi confirmada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Segundo o órgão, dos 7 337 MW médios, 3 688 MW médios vieram das térmicas, naquele mês. As hidrelétricas da região geraram 3 347 MW médios.
Ainda segundo o ONS, mesmo com o acionamento de todas as térmicas, o total produzido no Nordeste não tem sido suficiente para atender às necessidades da região. Em 16 de fevereiro, a carga demandada nos nove estados nordestinos foi de 8 771 MW médios, quase 20% superior ao total gerado. O déficit tem sido suprido pelas hidrelétricas do Norte. Em toda a região, são 27 térmicas instaladas. No Ceará, quatro estão operando: a Termoceará (da Petrobras), a Termofortaleza (grupo Endesa) e duas da Energia Pecém. Segundo governo federal, estão em construção mais 35 termelétricas em todo o país.
Alternativas
Em meio às atuais críticas ao deficiente setor elétrico nacional, ganha força as discussões sobre o aproveitamento de outras fontes de energia no Brasil. A saída mais discutida passa pela exploração de alternativas renováveis e o aproveitamento do potencial das regiões. Para os especialistas, nenhum investimento será capaz de suprir, a curto prazo, as atuais necessidades do sistema, mas, nos próximos anos, é preciso uma força tarefa, unindo todas as matrizes disponíveis, para acabar com a dependência das chuvas.
“Não adianta o governo fazer um decreto e tentar implementar tudo ao mesmo tempo. Os custos estão baixando. A soma de pequenas contribuições pode levar o país a um melhor desempenho energético”, diz o coordenador do Laboratório de Energia Solar da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Arno Krenzinger.
Hoje, as fontes renováveis mais promissoras para produção de energia elétrica no Brasil são a solar, a eólica e atômica. Dentre as desculpas usadas pelos governos anteriores para não investir nessas matrizes está o fato de serem muito caras. De fato, a energia solar, por exemplo, chegou, na década de 1990, a ser até dez vezes mais onerosa do que a hidrelétrica. No entanto, a realidade atual é outra. De acordo com os últimos leilões promovidos pelo governo, o preço da energia eólica tem sido equivalente à hidrelétrica. Já a térmica e a solar são, ainda, três vezes mais caras.
Renovável e competitiva
Segundo o boletim da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), divulgado em fevereiro deste ano, a capacidade instalada dessa fonte no país vai aumentar quase 300% em seis anos. Levando em conta os parques que estão em construção e a energia já contratada, o setor saltará dos atuais 3 445,3 MW para 13 487,3 MW, energia suficiente para abastecer mais de 20 milhões de casas no país. Com isso, até 2018, a participação da eólica na matriz energética brasileira vai saltar dos atuais 3% para 8%.
O levantamento mostra que a capacidade instalada dos parques eólicos no Brasil somou 2 181 MW ao final de 2013, um acréscimo de 18% (340 MW) na comparação com dezembro de 2012. No período, o número de usinas em funcionamento saltou de 76 para 90, resultado da conclusão de projetos do segundo leilão de fontes alternativas (em 2010) e do segundo e terceiro leilões de reserva (2009 e 2010).
O informativo também aponta que, em dezembro de 2013, o fator de capacidade médio (produtividade) das eólicas brasileiras foi de 36%, sendo que variou de um mínimo de 24% em abril a um máximo de 47% em outubro. Segundo dados do Wind 2012 Annual Report, este desempenho coloca o Brasil à frente de Estados Unidos (33%), Espanha (24%), Alemanha (19%) e China (18%) em relação à produtividade dos parques eólicos.
O maior aumento da capacidade, no ano de 2013, foi registrado na região Nordeste, que atingiu 1 451 MW provenientes de 60 usinas, o que representa 67% da capacidade total de eólicas do país, frente à representatividade de 63% em dezembro de 2012. Já a região Sul soma capacidade de 703 MW, correspondente a 29 usinas, enquanto que o Sudeste, com uma única usina geradora, possui 28 MW da fonte.
Ainda de acordo com a Abeeólica, a potência gerada por meio da energia eólica no Ceará já é suficiente para abastecer o estado do Amapá, quase o Acre e quase o dobro de Roraima. Isso porque o total gerado de 671 megawatts – números de fevereiro – abastece um local com cerca de 750 000 habitantes. O Ceará conta com 22 parques eólicos em operação, com a perspectiva de gerar em breve mais 1,7 gigawatts.
“A energia eólica está enfrentando a maior taxa de crescimento no Brasil, que é o maior investidor de eólica no mundo, principalmente no Nordeste. No momento, o maior investimento está no Rio Grande do Norte, depois na Bahia e no Ceará”, afirma Elbia Melo, presidente da Abeeólica.
Ela explica que nenhuma fonte pode substituir ou concorrer com a outra. Todas são complementares à geração de energia hidrelétrica. “A questão de a produção de energias se complementar vai se concretizando a partir do custeio. O valor do megawatt da eólica custa 110 reais, enquanto o da hidrelétrica está entre 100 reais e 105 reais. Valores bem próximos. Para o futuro, espera-se que o Brasil continue investindo e se aprimorando na geração de energia limpa”, diz Elbia Melo.
Pioneiro nesse tipo de empreendimento no Nordeste, o Ceará começou bem cedo a instalação dos primeiros parques eólicos da região (em 1992 iniciou os estudos de mapeamento eólico, resultando nos primeiros parques eólicos do mundo construídos sobre dunas: o da Praia da Taíba, com capacidade de 5 MW, e o da Prainha, em Aquiraz, com 10 MW), atrás apenas do Rio Grande do Sul (o primeiro do Brasil). No entanto, fatores como os atrasos nas linhas de transmissão e a dificuldade para liberação das licenças ambientais fizeram com que o Rio Grande do Norte e a Bahia conseguissem atrair mais investimentos. Hoje lideram o processo, com 88 e 109 parques em construção, respectivamente. No Ceará, há 70 novas obras em andamento.
Energia solar
Assim como a eólica, a energia solar é uma fonte inesgotável e limpa. E se considerarmos que o Brasil tem uma das maiores incidências de raios solares do planeta, em especial no Nordeste, onde em muitos estados, como o Ceará, o período de insolação chega próximo dos 300 dias por ano, surge a inevitável pergunta: por que não usamos essa tecnologia em larga escala? A resposta é sempre a mesma. Má vontade e falta de planejamento dos governantes.
Como há décadas só se enxergava no Brasil a energia proveniente das águas, poucos foram os desbravadores da matriz solar, considerada atualmente uma alternativa muito promissora para enfrentar os desafios da expansão da oferta de energia com baixo impacto ambiental. As aplicações dessa fonte podem ser divididas em dois grupos: energia solar fotovoltaica – aproveitamento da luz solar para conversão direta em energia elétrica, utilizando painéis fotovoltaicos; e a energia térmica (coletores planos e concentradores) relacionada basicamente aos sistemas de aquecimento de água.
Conforme dados do relatório Um Banho de Sol para o Brasil, do Instituto Vitae Civilis, o Brasil recebe energia solar da ordem de 1 013 MWh anuais, o que corresponde a cerca de 50 000 vezes o seu consumo anual de eletricidade. De acordo com o Atlas Solarimétrico do Brasil, iniciativa da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf), o Nordeste é a região de maior radiação solar, com média anual comparável às melhores regiões do mundo, como a cidade de Dongola, no deserto do Sudão, e a região de Dagget, no Deserto de Mojave, Califórnia (EUA).
Os primeiros empresários que apostaram na energia solar por aqui só conseguiram produzir e vender equipamentos no final da década de 1970. Hoje, com mais de cem indústrias fabricando esses produtos, o maior uso dessa fonte energética no país está concentrado no segmento de aquecedores, tornando-se um forte aliado na preservação do meio ambiente, já que uma parcela significativa de toda a energia gerada no Brasil é consumida na forma de calor e aquecimento direto.
Conforme o Balanço de Energia Útil, publicado pelo Ministério de Minas e Energia (MME), somente com aquecimento doméstico de água para banho, via chuveiro elétrico, são gastos anualmente bilhões de quilowatt hora (kWh) de energia elétrica que poderiam ser supridos com aquecedores solares.
Apesar do muito que se tem para evoluir, o relatório 2013 da International Energy Agency (IEA) mostra que existem no Brasil 8,4 milhões de metros quadrados de área de coletores solares térmicos instalados, o que coloca o Brasil na quinta posição no ranking mundial na utilização de energia solar térmica. De acordo com a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), o setor produziu, em 2012, mais de 1 milhão de metros quadrados de coletores solares, cerca de 50% para piscinas e 50% para banho.
Os setores que mais se utilizam dessa tecnologia são o residencial e o de serviços, como hotéis, restaurantes, pet shops, clubes, lavanderias e hospitais. A indústria também já está começando a experimentar os aquecedores, ainda que de forma pontual, informa a entidade.
O relativo sucesso da geração foto térmica não se repete quando o assunto é o aproveitamento da luz solar para a produção de eletricidade. O Brasil está vários anos atrasado em relação a muitos países da Europa, Estados Unidos, China e Japão. A Alemanha, por exemplo, detém 31% do mercado global e é responsável por 44% da energia solar produzida na Europa, com 32,411 gigawatts (GW) da capacidade instalada. Já a Itália, terceira no ranking, tem 16% da produção da energia solar mundial, com capacidade instalada de 16,3 GW.
Apenas em abril de 2012, com a Resolução 482 da Aneel, o governo abriu perspectivas para que os brasileiros gerem sua própria energia por meio do mecanismo de net-metering, onde é possível instalar uma usina solar (placas fotovoltaicas) no telhado e, com o uso de um relógio de medição bidirecional, trocar energia com a distribuidora. Pelas regras, indivíduos ou empresas podem instalar pequenos sistemas de microgeração de até 100 kW e minigeração entre 101 kW e 1 MW de potência e ‘vender’ o excesso para as concessionárias por meio do recebimento de um crédito. Além desse estímulo, haverá um desconto de 80% durante dez anos da taxa de conexão.
Além da energia solar fotovoltaica, a microgeração poderá também contar com tecnologias de turbinas eólicas, geração por meio de biomassa a partir de resíduos urbanos sólidos ou esgotos e até de resíduos agrícolas, sem contar outras tecnologias que ainda surgirão. O valor do equipamento solar varia de acordo com a energia que se pretende produzir. Em uma casa com consumo médio de 300 kWh por mês, o proprietário gastará, em média, entre 5 000 reais e 10 000 reais com a estrutura para captação de eletricidade.
Não precisa ser especialista para entender que se os equipamentos fossem barateados pelo governo, milhões de pessoas poderiam gerar sua própria eletricidade, evitando a dependência das usinas e linhas de transmissão. O atraso da energia solar fotovoltaica no Brasil se deve, segundo o consultor da GIZ – Agência de Cooperação Técnica Brasil-Alemanha, Carlos Faria Café, a um forte lobby para manter as usinas e o negócio na mão de poucos: “A energia solar é a mais barata de todas, mas os projetos não saem das prateleiras das universidades porque contraria os interesses do governos e dos grandes investidores das hidrelétricas”.
Infelizmente, a falta de vontade dos órgãos públicos não é “privilégio” do Brasil. Tanto que a primeira usina de energia solar em escala comercial da América Latina só passou a funcionar em 2011, no município de Tauá, no interior do Ceará, a 337 quilômetros de Fortaleza. Localizada no Sertão dos Inhamuns, e à época pertencente à EPX Energia, do ex-bilionário Eike Batista, a usina tem capacidade instalada de 1 MW. Desde que começou a funcionar, tem atraído a curiosidade de turistas, estudantes e investidores internacionais, que mostram interesse em instalar outras usinas no município e empresas de suprimento.
A Usina Solar Tauá abriga cerca de 5 000 painéis fotovoltaicos, e contou com investimento inicial de 10 milhões de reais. Hoje pertencente ao grupo Eneva, a meta é chegar a 50 MW. A energia elétrica produzida no local é injetada no Sistema Interligado Nacional e suficiente para abastecer até 1 500 famílias. Com a expansão prevista nos planos da empresa, o número sobe para até 75 000 famílias, equivalente ao suprimento de três vezes o número de domicílios de Tauá.
Energia nuclear
Em novembro de 2013, a empresa europeia de energia nuclear Areva assinou um contrato de 1,25 bilhão de euros com a Eletrobras Eletronuclear para a conclusão da construção de um reator para a usina de Angra 3, no Rio de Janeiro. A companhia é de origem francesa – país que tem mais de 60% de sua matriz elétrica oriunda da energia atômica – e vai fornecer equipamentos e serviços de engenharia, além de instrumentação digital e sistema de controle ao empreendimento brasileiro. Angra 3 terá capacidade para gerar 1 405 MW e está prevista para começar a funcionar em maio de 2018. O orçamento total do projeto está estimado em 13,93 bilhões de reais.
No momento, as usinas Angra I e II geram o equivalente a 30% do que é consumido no Rio de Janeiro. Com a terceira unidade, prevê-se chegar a 60%. Juntas, as duas usinas fecharam o ano de 2013 gerando 14,6 milhões de MWh em 2013 – a terceira melhor marca da história da Eletrobras Eletronuclear até agora. Essa energia seria suficiente para suprir, ao mesmo tempo, as residências das cidades de Manaus, Belo Horizonte e Porto Alegre, durante um ano.
O contrato com a Areva representa o interesse formal do governo em apostar fortemente nessa polêmica fonte geradora. Segundo o presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro, o Plano Nacional de Energia (PNE) 2030 colocou a fonte de geração nuclear novamente na pauta de expansão do setor elétrico brasileiro. A intenção é fazer com que ela cresça dez vezes até 2050 e passe a responder por 20% da matriz energética.
Para tanto, a ideia inicial é colocar em operação, nos próximos 20 anos, mais quatro novas usinas, duas no Nordeste e duas no Sudeste, elevando a geração nuclear para 7,3 mil MW. “As quatro novas usinas podem gerar investimentos de cerca de 25 bilhões de reais, considerando o atual valor da usina de Angra 3”, acredita Othon.
O preço para produção da energia nuclear é um dos incentivadores do programa de desenvolvimento energético nacional. Conforme as contas da Eletronuclear, as gerações a diesel e a óleo combustível passam de 600 reais por MWh; já o preço da energia nas usinas de Angra dos Reis fica em 135,28 reais por MWh. “Esse valor está abaixo até mesmo do de fontes consideradas renováveis, como as Pequenas Centrais Hidroelétricas (PCHs) que foram concedidas no leilão A-5, que negociou energia por um período de 30 anos a 154 reais por MWh”, garante Othon.
A escolha dos locais para as novas centrais planejadas no país ficará a cargo do MME e deverá ser feito por escolhas políticas. Quanto à tecnologia utilizada, Othon aposta que será a mesma utilizada nas usinas de Angra, a chamada PWR: “Essa tecnologia é a mais utilizada na França e na Alemanha e facilita a reciclagem do combustível utilizado”.
Pré-sal de urânio
A energia atômica é produzida a partir do beneficiamento do urânio – um elemento químico encontrado na natureza. Retirado das minas, em forma de rocha, 99,3% é do tipo 238, o mais comum. O 0,7% restante é urânio 235. Este é o usado para geração de energia e para a construção de bombas atômicas. No Brasil, 99% de sua utilização são voltados à geração de energia. O 1% restante é utilizado na medicina e na agricultura.
Segundo dados da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o país possui atualmente a sétima maior reserva de concentrado de urânio do mundo, com 309 000 toneladas, atrás de Austrália, Cazaquistão, Rússia, África do Sul, Canadá e Estados Unidos. Vale destacar que tal potencial foi alcançado apenas com a exploração da Mina de Caetité, no município de Lagoa Real (BA).
O presidente das Indústrias Nucleares do Brasil (INB), uma companhia de economia mista vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aquilino Senra, diz que o país tem potencial para alcançar a primeira posição desse ranking nos próximos anos: “Considerando as reservas ainda não exploradas, há um ‘pré-sal de urânio’ no Brasil em termos de potencial energético, mas são necessários bilhões em investimentos para isso se tornar realidade”.
Dados da INB mostram que os investimentos necessários até 2020 para aumentar a participação da energia atômica na matriz energética do país são de 2,42 bilhões de reais, sendo 64% (1,55 bilhão de reais) destinados à fase do enriquecimento do material, ou seja, à separação dos átomos de maior potencial energético (U235) dos átomos comuns da substância (U238) por meio de centrífugas.
O próximo passo será a exploração da Mina de Itataia, localizada no município de Santa Quitéria, no Ceará, e a duplicação da Caetité. Estas obras são indispensáveis porque as duas usinas de Angra já consomem todo o urânio beneficiado no país. Em 2012, foi preciso importar o produto.
Para o Ceará, a usina trará muitos benefícios [caso não haja problemas ambientais] a uma das regiões mais áridas do sertão nordestino. A previsão é que sejam investidos cerca de 870 milhões de reais no projeto, entre recursos próprios da empresa Galvani e financiados pelo BNB. Com a tecnologia de exploração já desenvolvida, serão construídas duas unidades industriais. Numa serão fabricados fertilizantes fosfatados e fosfato bicálcico (matéria-prima da Galvani), este último voltado para ração animal. Noutra unidade será produzido o yellowcake, como é conhecido o concentrado de urânio.
A previsão é que os empreendimentos gerem em torno de 4 000 empregos diretos e indiretos, além de trazer diversos benefícios nas áreas de transporte (construção de rodovias e ferrovias), comunicação, educação e saúde. A estimativa é que a mineração de Itataia comece a operar em 2017. No momento, as obras aguardam licença ambiental do IBAMA.
A reserva deve produzir, na primeira fase, 180 000 toneladas anuais de fosfato e 1 200 toneladas/ano de urânio. Já na segunda etapa, que começa em 2022 e prossegue até que os recursos da mina sejam exauridos, serão produzidas 240 000 toneladas/ano de fosfato e 1 600 toneladas/ano de urânio. Segundo a Galvani, as reservas minerais lavráveis são de 65,6 milhões de toneladas de fosfato e de 80 000 toneladas de urânio. A mina também permitirá a exploração de outros produtos, como o mármore.
Visão de futuro
Em 27/12/13 o estado de Pernambuco promoveu o primeiro leilão de energia solar do Brasil, numa aposta ousada que trouxe boas expectativas para os investidores de tal fonte. Vale destacar que, em 2013, a solar ficou de fora dos grandes leilões de energia promovidos pelo governo federal, e a nova resolução da Aneel para promover a instalação de painéis solares em casas e estabelecimentos comerciais teve poucas adesões.
Numa ação ousada e pioneira, o governo pernambucano contratou seis projetos de empresas da Alemanha, Itália, China, Espanha e Brasil para instalar painéis e gerar energia no interior do estado. O governo estima quase 600 milhões em investimentos. Ao todo, esses projetos somam 122 MW de energia. Isso significa que Pernambuco vai gerar seis vezes mais energia do que é produzido atualmente no país.
A intenção é transformar o interior em um polo de energia solar brasileiro. Mas, para isso, um passo decisivo será conseguir baixar os custos de produção. Uma comparação com a energia eólica mostra a diferença: enquanto o leilão de solar ficou na casa dos megawatts, a da eólica foi contratada em gigawatts. (fiec)

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