segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Principal desafio da energia solar é político

Principal desafio da energia solar é político, afirmam especialistas
Até 2024, a Agência Nacional de Energia Elétrica estima que o Brasil terá 1,2 milhão de telhados com painéis solares fotovoltaicos. A quantidade, contudo, ainda é considerada abaixo do potencial do País, na avaliação de especialistas do setor.
O uso da energia solar tem sido cada vez mais visto como um fator importante para a otimização e diversificação da matriz elétrica brasileira, abastecida em grande parte pelas hidrelétricas. Até 2024, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estima que o Brasil terá 1,2 milhão de telhados com painéis solares fotovoltaicos. A quantidade, contudo, ainda é considerada abaixo do potencial do País, na avaliação de especialistas do setor.
Em audiência pública realizada nesta terça-feira (30) pelas Comissões de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; e de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, representantes dos setores acadêmico, produtivo e governo apontaram o desafio político como o maior obstáculo para expandir a energia solar no Brasil, cuja capacidade pode chegar a 30 mil gigawatts (GW) – 200 vezes a capacidade total instalada no País hoje, que é de 143 GW.
Para começar a aproveitar todo esse potencial, políticas públicas estratégicas precisariam ser implementadas para estimular o uso da fonte nacionalmente. “Duas peças são muito importantes para expandir a solar e ambas estão nas mãos do Congresso: liberar o FGTS para o brasileiro comprar o sistema fotovoltaico, porque é o governo que usa o FGTS; e constituir uma cadeia tributária diferenciada para os componentes do sistema fotovoltaico, com isenções”, afirmou a coordenadora de Campanha de Energias Renováveis do Greenpeace Brasil, Barbara Rubim.
A especialista lembrou que em 2012, o Greenpeace lançou ao governo federal o desafio de criar políticas públicas que permitissem ao Brasil ter, até 2020, 1 milhão de telhados solares. “Na época foi vista como uma meta absurda, e hoje sabem que é possível. Se mexêssemos em peças que geram maior impacto, conseguiríamos chegar em 2030 com um aumento de 623% de casas solarizadas. Isso significaria cerca de 8 milhões de telhados solares no Brasil, residenciais e comércio. Além disso, conseguiríamos ter, só com geração solar distribuída, mais de duas vezes a energia projetada para hidrelétrica de São Luís de Tapajós”.
Apesar de ser tecnicamente e economicamente possível, o professor doutor de Engenharia Elétrica do Laboratório de Fontes Renováveis da Universidade de Brasília (UnB), Rafael Shayani, reforça que a energia solar não deslanchou ainda no País devido, essencialmente, a dois fatores: o conservadorismo presente no setor elétrico brasileiro, ainda atrelado às hidrelétricas, aliado à falta de vontade política para mudar esse cenário. Prova disso, ressalta o docente, é que a fonte solar atualmente representa apenas 0,02% da matriz elétrica nacional.
“O desafio maior realmente é político. O Brasil, o mundo e o setor elétrico precisam de uma nova orientação, uma nova política, que supere as dificuldades trazidas pelas mudanças climáticas. Podemos continuar na visão tradicional e conservadora das hidrelétricas, e causar mais impactos ambientais, ou fazer essa mudança de paradigma adotando a energia solar”, alertou.
Segundo Shayani, para o uso da fonte solar avançar é necessário que governos considerem os custos diretos da geração de eletricidade com as hidrelétricas e as termoelétricas – mais caras e poluidoras -, e suas implicações futuras, em especial ao meio ambiente e à saúde da população.
“Quanto custa alagar árvores na Amazônia com as hidrelétricas? Quanto custa para o sistema de saúde ter mais poluição? Essa visão política que precisamos ter para então utilizar as inovações tecnológicas como o painel fotovoltaico. Ele gera bens para o governo e meio ambiente, evita a construção de novas usinas, garante energia para o crescimento do País e reduz perdas para o setor elétrico. É preciso visualizar e quantificar esses ganhos”, disse o professor.
Produção
Além da falta de políticas públicas, o setor tem dificuldades na produção dos painéis fotovoltaicos. Segundo o assessor da Área de Geração, Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica da Associação Brasileira da Indústria Elétrica Eletrônica (Abinee), Roberto Barbieri, apesar de o Brasil ter uma das maiores reservas de minério de silício do mundo – material para produzir os módulos fotovoltaicos -, ainda assim as placas são feitas em sua maioria com produtos importados.
“Temos o material, mas a indústria nacional não está participando desses fornecimentos. Exportamos o silício metalúrgico a US$ 2,5 o quilo, e quando trazemos uma célula fotovoltaica com esse silício, importamos ela a US$ 44 o quilo. Está aí uma grande agregação de valor que o Brasil está deixando de fazer porque não temos um pedaço da cadeia produtiva, que demanda investimento e uma política estratégica”, comentou Barbieri.
De acordo com o especialista, o Brasil possui em Minas Gerais empresas metalúrgicas que atuam nessa área e estão dispostas a atender a cadeia produtiva fotovoltaica. “Mas elas precisam de um empurrão, um incentivo, uma política firme para termos a cadeia fotovoltaica toda. A vontade é política, e se queremos ter a presença solar na nossa matriz de forma significativa, temos que ter controle sobre essa produção de energia”, ressaltou.
Na Capital
Uma política voltada ao estímulo da energia solar tem sido desenvolvida no Distrito Federal, segundo o secretário adjunto de Estado do Meio Ambiente do DF, Carcius Azevedo. Contudo, vários entraves são recorrentes na tentativa. “O Executivo é onde mais precisa de eficiência e renovação. É um desafio podermos implementar políticas de fato inovadoras e que aconteçam em um período de tempo exequível”, pontuou.
Um exemplo citado pelo secretário foi na tentativa de instalar recentemente placas fotovoltaicas em escolas públicas da região. “Nos deparamos com um conjunto de dificuldades estruturantes. O recurso era de uma emenda parlamentar, mas que dizia respeito a aquisição de placas, não instalação. Não existia verba no orçamento para instalação. Além disso, não existia quadro técnico no governo capacitado para instalar as placas solares nas escolares. Foram diversas amarras”, lembrou.
Atualmente, outras políticas no setor solar estão em andamento no Distrito Federal. De acordo com o secretário, o governador do DF, Rodrigo Rolemberg, pretende lançar um decreto que institui o Programa de Estímulo a Energia Solar, com recursos voltados para capacitação de jovens adultos na instalação das placas em escolas. “A gente precisa criar mecanismos inteligentes e reais que façam com que essa política seja de fato implementada.” (ecodebate)

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