Não podemos perder o protagonismo dos biocombustíveis, diz Adriano Pires.
Enquanto o mundo tem 14% de fontes renováveis na matriz energética, o Brasil se destaca com mais de 40%. Para atingir esta saudável liderança, o estímulo ao desenvolvimento e uso dos biocombustíveis foi e é fundamental.
Verificamos nos últimos meses, antes da crise do coronavírus, um importante crescimento da participação do etanol hidratado como combustível para os veículos do Ciclo Otto e o percentual de biodiesel na mistura com o diesel fóssil vem crescendo ano a ano, atingindo 12% em março de 2020.
A crise que estamos enfrentando tem dois fatores que devem ser entendidos e tratados de formas distintas. A pandemia da covid-19 provocou uma forte redução na demanda mundial dos combustíveis líquidos, devido ao isolamento social recomendado pela OMS, e a reação da Arábia Saudita, aumentando a sua oferta de petróleo, a ação feita pela Rússia, de não reduzir a sua produção.
Isso causou uma forte e brusca queda nos preços internacionais do petróleo bem como de seus derivados. A explicação principal seria a tentativa de inviabilizar a produção de shale nos Estados Unidos e mesmo a produção dos biocombustíveis.
Os dois fatores citados acima estão, também, provocando no Brasil uma forte queda na demanda pelos combustíveis líquidos. O consumo de etanol está caindo algo como 45% em linha do que está ocorrendo no ciclo Otto (gasolina e etanol).
“A indústria brasileira de etanol e biodiesel dificilmente irá resistir a esta crise. Portanto, são necessárias ações urgentes para que a indústria consiga passar por essa tormenta”.
Seria favorável ao setor, o aumento da alíquota da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide-Combustíveis) para a gasolina. Isso ajudaria na competitividade no presente do etanol frente a gasolina e estaríamos criando um colchão para usar quando os preços do petróleo voltassem a crescer.
Outra medida, possível, seria a criação de uma linha de financiamento do BNDES atrelada ao programa federal RenovaBio, de forma a garantir ao menos a manutenção dos investimentos em produtividade.
Também seria bem-vindo uma warrantagem da produção de abril e maio, com 6 bilhões de litros para serem vendidos em dois anos e financiamento do governo como garantia de estoque para tirar o excesso de produção do mercado.
A ausência de medidas em auxílio aos biocombustíveis pode acometer, ainda neste ano, um pedaço relevante dos mais de 1 milhão de empregos do setor no interior do Brasil. Em função do novo cenário, a meta de comercialização de 28,7 milhões de Créditos de Descarbonização (CBios) do RenovaBio em 2020, deveria ser revista.
Uma nova meta precisa ser definida antes de 27 de abril, data originalmente prevista para início da comercialização de CBios. No entanto, o novo volume precisa de aprovação do comitê do RenovaBio e no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), procedimento que pode se estender por cerca de 90 dias.
Caso essa indefinição não atrapalhe o início da comercialização, cria-se uma alternativa positiva aos usineiros. A venda de CBios pode representar certo alívio às empresas que estão com dificuldades financeiras e, os valores reduzidos podem ser atrativos às distribuidoras.
Ainda há grande incerteza sobre a evolução da pandemia de coronavírus e as restrições necessárias para conter a propagação. O que é certo é que teremos nas próximas semanas e meses uma grande volatilidade do preço do barril de petróleo.
Cortes de produção futura acontecerão, mas com a queda abruta da demanda no presente os preços continuarão baixos. Portanto, é preciso que medidas concretas sejam tomadas para que o setor de biocombustíveis se fortaleça e consiga resistir a crise.
Esta proposta, que vem sendo discutida e apoiada pelos diversos agentes que atuam na cadeia de suprimentos dos combustíveis líquidos, permite que:
- Petrobras continue com sua política de preços alinhada ao mercado internacional;
- Preserva a viabilidade do mercado de biocombustíveis;
- Favorece a criação de ambiente de negócio com atratividade para realização de investimentos, inclusive a venda de parte das refinarias da Petrobras;
Para viabilização do uso, imediato, da Cide, (sem noventena) o Congresso precisa aprovar uma PEC em regime de urgência, podendo ser avaliada a possibilidade de ajuste no PIS/Cofins até o efetivo uso da Cide. E mais adiante a troca do PIS/Cofins pela Cide.
Não podemos perder o protagonismo na transição energética mundial. O governo e o Congresso, entendendo a gravidade da situação, precisam agir com celeridade.
Adriano Pires é sócio
fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE); com mais de
30 anos de atuação, ele tem mestrado em planejamento energético pela UFRJ e
doutorado em economia industrial pela Universidade Paris XIII. (biodieselbr)
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