segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Os obstáculos para o plano de termelétricas

O Brasil acaba de se livrar de nove meses de racionamento no consumo de energia elétrica, mas continua tateando soluções permanentes que o livrem da ameaça de nova escuridão.
A recuperação do nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas autorizou o país a retomar o uso da capacidade elétrica instalada. O afastamento do problema imediato, porém, está dificultando a viabilidade econômica das usinas térmicas, idealizadas para funcionar como uma espécie de estepe em caso de crises como a enfrentada pelo país ao longo do ano passado e, num prazo mais longo, contribuir para a diversificação da matriz energética brasileira.
À medida em que os reservatórios foram ganhando boa distância dos níveis críticos, os investimentos em usinas termelétricas foram esmorecendo. Nas duas últimas semanas, a Petrobras - a maior investidora na geração térmica - e a Eletrobrás anunciaram a decisão de cancelar projetos de investimentos. E o mesmo estado de espírito tem tomado investidores privados.
Do ponto de vista negocial, a deliberação é absolutamente compreensível. Afinal, os últimos dados disponibilizados pelo Operador Nacional de Energia (ONS), indicam a possibilidade de o mercado vir a contar com excesso de energia elétrica graças aos índices de armazenamento dos reservatórios, do atual patamar de consumo e da capacidade de nova geração. As perspectivas traçadas por esse cenário praticamente inviabilizam economicamente as usinas térmicas, cuja energia é muito mais cara do que a elétrica.
O problema, contudo, não se restringe às decisões estratégicas e empresariais relativas à continuidade ou cancelamento de investimentos. A questão é como desfazer uma estratégia que ajudou a livrar o país da escuridão, mas, agora, tornou-se um transtorno oneroso, embora indispensável. Afinal, o Brasil continua na dependência das hidrelétricas e sem a alternativa de outras matrizes.
No auge da crise, as usinas térmicas emergenciais (movidas a óleo e a diesel) e aquela previstas no chamado Programa Prioritário de Termeletricidade (movidas a gás) foram, junto com o racionamento, as únicas alternativas disponíveis. A ameaça de paralisação do país, o desconhecimento da duração da crise e a antiga urgência de diversificar a matriz energética nacional levaram ao planejamento de uma quantidade de usinas que hoje se mostra super dimensionada ante a perspectiva de abundância de abastecimento elétrico.
O resultado é que muitas das usinas térmicas previstas não devem sair do papel. Mas o país tampouco pode deixar de tocar esses projetos e correr o risco de ficar sem o estepe. Ao mesmo tempo, assim como as estatais que já abandonaram alguns investimentos, o capital privado também não se anima a aplicar recursos em um negócio que, além de caro, só funcionará a pleno vapor se outra crise se configurar.
Hoje, o Brasil tem de sustentar um modelo energético emergencial e improvisado, amparado por "seguros". Desde 1º de março, as tarifas estão mais caras para pagar as térmicas emergenciais, que precisam continuar de prontidão. Agora, na tentativa de reanimar a iniciativa privada a correr o risco de investir, o governo estuda a implantação de um novo "seguro" - que também será pago pelo consumidor.
Diante da dificuldade de impor a cobrança de duas apólices para um único risco, as autoridades estão empenhadas, neste momento, em descobrir uma fórmula para criar um seguro de transição.
A falta de planejamento que caracterizou o setor energético nos últimos anos conduziu o Brasil ao exercício do método conhecido como tentativa e erro, pautado pelo improviso imposto pela premência. À sombra do fim do racionamento, continua à procura de soluções para um problema que apenas se afastou da fase crítica. No mundo dos negócios, as circunstâncias ditam a continuidade ou não dos empreendimentos, mas a questão energética não pode ser tratada com tanto risco por um país.

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