Veja o que muda
Linha de montagem do
Chevrolet Bolt em Orion (EUA)
UOL Carros visitou linha de
montagem do Chevrolet Bolt e conversou com especialista para responder à
pergunta.
Muito se fala sobre as
dificuldades de fabricar um carro elétrico. Mas, afinal, a diferença é tão
grande assim para um veículo convencional a combustão? Para responder essa
pergunta UOL Carros visitou a fábrica do Chevrolet
Bolt em Orion (EUA), na região metropolitana de Detroit, e conferiu de
perto como se dá o processo.
O primeiro detalhe que chamou
nossa atenção foi o fato de que o monovolume 100% elétrico compartilha a mesma
linha de montagem com os compactos Sonic hatch e sedã. Seria de se esperar
que o modelo tivesse um espaço totalmente dedicado à sua produção, como ocorre
com o BMW i3 em Leipzig (Alemanha), mas não é o que acontece com o Bolt.
Em relação ao Sonic há
apenas dois momentos de distinção na montagem. O primeiro ocorre na montagem do
tanque de combustível, que no caso do elétrico representa o acoplamento do
conjunto de baterias ao assoalho do carro. O segundo está na seção que
integra a carroceria ao conjunto motor-transmissão-suspensões, já que o Bolt
dispõe de um propulsor elétrico.
Há também, obviamente, o fato
de que é preciso produzir baterias para equipar um, enquanto o outro vê
seu sistema de propulsão surgir numa fábrica de motores comum. De resto, os
processos de estamparia, solda, pintura e montagem são idênticos.
Isso passa longe de
significar que a produção de um elétrico esteja 100% assimilada pela indústria
automotiva. Para entender melhor onde estão os atuais gargalos conversamos com
Ricardo Takahira, membro da comissão de híbridos e elétricos da SAE Brasil
(associação nacional de engenharia automotiva).
Mais complexo com menos peças
Um trem-de-força de um
veículo convencional, formado por propulsor, caixa de câmbio e demais elementos
do sistema de transmissão, reúne mais de 5 mil peças. Todas elas são
substituídas por não mais do que algumas dezenas delas num modelo elétrico.
Aí temos o paradoxo: mesmo
sendo mais simples em termos de número de componentes, o carro elétrico é
tecnologicamente muito mais complexo e custa praticamente o dobro de um veículo
convencional.
Veja os exemplos de Bolt
e Sonic: enquanto o primeiro custa entre US$ 15 mil e US$ 20 mil nos EUA, sem
contar impostos estaduais, o segundo parte de US$ 36 mil e alcança
salgados US$ 43 mil.
Tanto a brincadeira é cara
que a venda desse tipo de automóvel se torna inviável se não houver subsídios
governamentais, mesmo em países com mercados mais maduros.
Por que isso acontece?
Elencamos três razões abaixo:
1. Custo da unidade motriz
As atuais baterias de
íon-lítio ainda são muito mais caras de se desenvolver e produzir do que
um conjunto de propulsão a combustão. Assim, enquanto o trem-de-força de
um carro movido a combustão não representa nem 30% do custo total de
produção, num elétrico o percentual não será menor do que 40%, podendo
chegar a 50%.
"Ainda não houve o amadurecimento do
domínio tecnológico", aponta Takahira. O mais curioso, segundo ele, é que
os custos não vêm apresentando queda nos últimos anos. "Os engenheiros
estão fazendo um trabalho excepcional para aumentar a autonomia e reduzir os
tempos de recarga, só que a chegada dessas novas soluções não permite que os
preços caiam", afirma.
Plataforma do Chevrolet Bolt:
elétrico demanda milhares de peças a menos do que um carro comum, mas ainda
assim custa muito mais caro para produzir.
2. Complexidade das demais
tecnologias
Se a fonte energética é uma
bateria cheia de eletricidade, todas as conexões com o restante do automóvel
também têm de funcionar eletricamente. Portanto, a proliferação de módulos,
centrais eletrônicas e chicotes elétricos representam um gasto extra na
construção de um veículo desse tipo.
Além disso, o projeto acaba
modificando outros componentes que, num veículo a combustão, funcionariam de
maneira mais simples pelo uso de sistemas puramente mecânicos.
"Acelerador, freios,
tudo é operado eletronicamente num carro elétrico. Os freios, por exemplo,
utilizam uma bomba elétrica de vácuo no lugar do servofreio e
incluem regeneração da energia cinética dissipada nas frenagens. É um
sistema bem mais complexo, e caro, que o de um automóvel comum", explica o
especialista da SAE Brasil.
É por isso que, durante a
fabricação, a bateria precisa estar 100% carregada, pois é preciso ter energia
de sobra para configurar determinados módulos. "Num carro 'normal', com
meio litro de combustível você ajusta tudo que precisa para completar a
montagem", compara.
Detalhe: por conta dessa
bateria carregada, até a formação humana precisa ser incrementada na
fábrica de carro elétrico e montagem de seus componentes. Há
normas internacionais determinando a obrigatoriedade de treinamento para que um
funcionário possa mexer com componentes acima de 48 Volts.
"O perigo de um
curto-circuito é grande, podendo provocar incêndio e queimaduras severas. O operador
precisa saber o que está fazendo e como agir em caso de emergência",
comenta Takahira.
3. Logística reversa
Diferentemente de um veículo
a combustão, praticamente não existe manutenção em um elétrico. Parece uma
ótima notícia, mas a verdade é que, tal qual um celular, a bateria possui um
ciclo de vida limitado e tende a ter sua autonomia gradativamente reduzida ao
longo dos anos.
Quando ela precisar ser
substituída, será necessária a troca e o descarte de todo o conjunto, o
que também acarreta custos elevados. UOL Carros já contou qual é o custo,
por exemplo, no cado do BMW i3, praticamente o valor do modelo novo.
"No preço de um carro elétrico já está
embutida a logística reversa da bateria, que terá de ser enviada provavelmente
a um país como Estados Unidos ou Japão quando descartada. Não é um processo
simples", esclarece o membro da SAE.
Calma que há pelo menos uma
boa notícia: motor elétrico e módulos eletrônicos, se bem projetados e
utilizados, podem durar toda a vida útil do automóvel sem demandar reparos.
Muito pouco para uma realidade em que o carro elétrico ainda se mostra tão mais
caro e complexo, mas já é algum alento. (carros.uol)
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