Enquanto no mundo o número de
reatores nucleares em operação diminui, segundo o Relatório Anual da Indústria
Nuclear no Mundo (2020), o país planeja investir centenas de bilhões de reais
na expansão das usinas nucleares, conhecidas como “chaleiras atômicas”. Mesmo
declarado “país falido”, sem recursos, diante de investimentos grandiosos e
prioritários para uma necessária recuperação econômica e sanitária, os
nucleopatas insistem, sorrateiramente, em gastar “nosso rico dinheirinho” para
atender unicamente seus interesses econômicos particulares.
São múltiplos interesses que
estão presentes na expansão das atividades nucleares no país, não se resumindo
somente na retomada da construção de Angra 3, e de mais 6 usinas no Complexo de
Itacuruba/Pernambuco, a beira do Rio São Francisco, conforme prega o Plano
Nacional de Energia (PNE) 2050. Da mineração do urânio, a produção de energia
elétrica. Do acionamento de submarinos nucleares à produção de armamentos
nucleares. Todas estas atividades estão incluídas nos planos do governo
federal, em particular a mineração do urânio, visto como uma “commodity” no
mercado mundial.
Está em andamento uma
campanha orquestrada, e presente na mídia, sobre as vantagens do uso da energia
nuclear em nosso país. Os “lobistas em ação” (associações, consultores,
militares, políticos, acadêmicos, empresários, grandes corporações financeiras
e de mídia, grandes construtoras) tentam convencer o “inconvencível”. Que o
nuclear é uma fonte energética necessária à diversificação da matriz elétrica,
barata, limpa, e cujo risco de acidente inexiste. As falácias e mentiras são
muitas, mas com o apoio da mídia corporativa, repetindo e repetindo, tenta-se
instaurar a “voz única”, enganando os incautos.
Aspecto constatado pelo
missivista, é que os “lobistas em ação” são na verdade os mesmos personagens
que criticaram, boicotaram e retardaram, em anos, a expansão das fontes
renováveis de energia no país, em particular a inclusão da energia eólica e a
solar na matriz elétrica brasileira. Este é um “detalhe” a ser considerado, nas
discussões, de como são tomadas as decisões sobre a política energética.
A núcleo eletricidade é cara,
e sem dúvida incidirá para o aumento das tarifas, hoje no Top 5 das mais caras
do mundo. Ela é “suja”, pois os dejetos radioativos (lixo atômico) desta
indústria continuam irradiando radiação mortal por milhares de anos. E
lembrando que até o presente, não existe local definitivo e seguro para
armazená-los. Sem deixar, é claro, de mencionar e denunciar interesses
militares no setor nuclear.
Voltando as decisões tomadas
recentemente pelo governo federal, existe um claro desacordo entre o que diz a
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que prevê, em seu Artigo
21, Inciso XXII, que “compete à União explorar os serviços e instalações
nucleares de qualquer natureza e exercer o monopólio estatal sobre a pesquisa,
a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de
minerais nucleares e seus derivados”. O Artigo 177, Inciso V, dispõe que
“Constituem monopólio da União a pesquisa, a lavra, enriquecimento e
reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais
nucleares e seus derivados”. E, ainda, em seu Artigo 225, Inciso VII, §6°, a
Constituição estabelece que “As usinas que operem com reator nuclear deverão
ter sua localização definida em lei federal, sem que não poderão ser
instaladas”.
A inconstitucionalidade das
ações governamentais consiste na tentativa de “privatizar” processos do chamado
ciclo do combustível nuclear, que são de competência estatal.
Consórcio Santa Quitéria é exemplo,
formado entre empresa privada com fundo norueguês e as Indústrias Nucleares do
Brasil/INB para a implantação de um parque minero-industrial para exploração de
potássio e urânio, em Santa Quitéria, sertão cearense.
Medida Provisória/MP 998, aprovada
pela Câmara Federal e pelo Senado, dependendo agora de sanção presidencial, que
beneficiou escancaradamente o reinício das obras de Angra 3 (está sendo
construída em Angra dos Reis-RJ desde 1984, paralisada dois anos mais tarde,
retomada em 2009 e novamente interrompida em 2015). Com aproximadamente 60% dos
trabalhos concluídos, necessita de mais de 15 bilhões de reais para sua
finalização, com previsão para entrar em operação comercial no final de 2026.
Esta MP transferiu ao
Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) a decisão de outorga para a
exploração de Angra 3 (prazo de 50 anos, prorrogáveis por mais 20 anos, e deve
garantir o suprimento de energia por pelo menos 40 anos).
Ambas movimentações recentes
merecem um olhar rigoroso e fiscalizador da sociedade diante da legislação
existente. Discutir amplamente a pretensão de “nuclearizar” o Brasil para as
gerações futuras. Somente a mobilização da sociedade poderá impedir mais esta
insanidade que está sendo cometida, aumentando drasticamente a probabilidade de
tragédias contra a vida em nosso planeta.
A pandemia é uma tragédia
nacional, como afirma a Organização Mundial de Saúde, com mais de 250 mil
mortes, e com um iminente colapso de todo o sistema de saúde, público e
privado. O dirigente, funcionário público no 1, é um negacionista da ciência.
Apontado como o principal responsável pela escalada desenfreada do vírus, o que
levou o país no Top2 do número de mortes, é o mesmo que tomou a decisão de
tornar o país uma porta de entrada da indústria e dos interesses nucleares na
América Latina.
Os homens e mulheres de boa
vontade podem esperar que reatores nucleares em nosso país podem melhorar a
vida de nossa população? Gerarão emprego e renda?
Em recente artigo de opinião “quem assiste à própria morte sem reagir não merece viver”, o jornalista Noblat, nos fala da tragédia causada pela pandemia e as ações do (des)presidente. Finaliza o texto fazendo uma pergunta: “Que tipo de povo é o brasileiro que compactua inerte com tudo isso”?
Sem dúvida não podemos aceitar esta inércia. É hora de reagir. No caso nuclear, parcela majoritária da população brasileira não tem a informação contraditória, nem as críticas feitas ao governo. Assim fica mais difícil avaliar, pela falta de transparência, o que está acontecendo, e as repercussões das decisões tomadas.
Logo, cabe à sociedade civil
organizada pautar o debate nuclear, pois a “boiada” caminha rapidamente.
(ecodebate)
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