‘Ecos’ de Fukushima: Divulgação de informações sobre radioatividade dos alimentos continua incompleta
A lentidão e a dissonância dos poderes públicos alimentam a desconfiança da população
A imprecisão das informações sobre a poluição radioativa da usina nuclear de Fukushima e sobre a contaminação da cadeia alimentar tem aumentado os temores dos japoneses. Para muitos, o pedido feito pelo governo à indústria de carne bovina, em 26/06/11, para comprar e incinerar toda a carne de animais que houvessem consumido feno contaminado por césio, chegou bem tarde.
Segundo o ministério da Agricultura, a operação deverá atingir os produtos originados de 2.906 animais de 16 províncias, sendo que parte deles já foi colocada à venda em dezenas de lojas de diversas marcas, como a Aeon.
O governo avalia seu custo em 2 bilhões de ienes (R$ 40 milhões). Ele ajudará a indústria do setor, mas pede para que ela procure a operadora da usina, a Companhia de Eletricidade de Tóquio, a Tepco, para obter o reembolso dos gastos.
A decisão tomada chega após a descoberta, no dia 8 de julho, dos primeiros casos de carne contaminada em níveis superiores à norma legal de 500 becqueréis por quilo (Bq/kg) de césio originário da província de Fukushima. No dia 19 de julho, o governo proibiu a venda de gado dessa região. Várias províncias decidiram realizar controles sistemáticos dos bovinos.
Essas medidas não impediram que o preço da carne despencasse em mais de 60%, prova da preocupação persistente dos consumidores sobre a segurança dos alimentos.
Desde o início da crise nuclear em março, muitos têm se recusado a comprar produtos de Tohoku, nordeste do arquipélago, que normalmente ocupam a maior parte das prateleiras dos supermercados da região de Tóquio, onde vivem 35 milhões de pessoas.
Compreensivelmente, as mães de família são as mais preocupadas. Uma pesquisa realizada em junho pela publicação semanal “Aera” revela que 76% das mães entrevistadas em Tóquio tomam cuidado com os alimentos que compram; 69% não têm dado água da torneira a seus filhos.
Essas percepções evidenciam os limites da política de controles, não centralizada, e da responsabilidade das províncias. Desde o início da crise, diversos produtos foram proibidos para venda: espinafre, leite e também chá.
Decididas caso a caso, e muitas vezes acompanhadas de discursos falando em riscos limitados, essas proibições às vezes enfrentam a hostilidade de representantes locais. A exemplo de Heita Kawakatu, governador da província de Shizuoka, que critica a proibição decidida sobre o chá. Alguns profissionais, preocupados com seus negócios, chegam a organizar campanhas de venda direta pedindo pelo “apoio” da população.
São posicionamentos que desorientam os cidadãos, que, além disso, ainda enfrentam anúncios frequentes de novos riscos em potencial. Na terça-feira, a Sociedade Japonesa de Oceanografia (SJO) pediu para que o governo controlasse de maneira mais rigorosa a contaminação da água do mar.
Pequenas quantidades de substâncias radioativas podem ter graves consequências, pois, segundo o oceanógrafo Jota Kanda, certas espécies “podem acumular até 100 vezes as quantidades de poluentes de seu ambiente”. E a contaminação deve se espalhar por toda a cadeia alimentar.
A isso se somam os limites dos controles dos produtos colocados à venda. “As autoridades só retiram amostras”, explica Kazuya Honda, da prefeitura de Koriyama, na província de Fukushima. “As pessoas não confiam e compram produtos vindos de fora.” Esse “fora” é em sua maior parte o oeste do Japão e outros países. Os profissionais da indústria de carne bovina americana esperam para 2011 um aumento de 33% na venda de carne para o Japão.
Em um contexto como esse, foi fácil para o jornal “Japan Times” lembrar, na terça-feira, que além das medidas tomadas a respeito da carne, o governo deve “realizar testes precisos de outros produtos agrícolas” e “entender que a mais completa transparência é o melhor meio de fazer com que a população volte a confiar nos produtos japoneses”. (EcoDebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário