O crescimento de grandes
complexos eólicos no país, em particular no Nordeste, tem crescido
vertiginosamente nos últimos anos, principalmente devido a excelente qualidade
dos ventos na região, da flexibilização e da baixa fiscalização das leis
ambientais, e do preço da terra arrendada (ou comprada) ser insignificante
diante dos investimentos realizados. Tais condições têm atraído inúmeros
empreendedores nacionais e internacionais pela alta lucratividade desta
atividade, conhecida como “negócios do vento”.
Com a rápida expansão desta
agenda econômica, inúmeros impactos, conflitos e injustiças socioambientais
estão sendo detectadas, e relatadas em estudos e trabalhos realizados pelas
universidades públicas, centros de pesquisa, organizações não governamentais,
sindicatos de trabalhadores rurais, e comissões pastorais ligadas à igreja
católica.
Todavia, a propaganda com
justificativas falaciosas e tendenciosas, o uso de táticas questionáveis pelas
empresas e de sua representação nacional, a Associação Brasileira de Energia
Eólica (Abeeólica), tem confundido e omitido da opinião pública, a atual
situação nos territórios onde foram implantados os complexos eólicos. Ao mesmo
tempo o governo federal, governos estaduais e municipais têm cedido a tais
interesses econômicos, legislando a favor dos “negócios do vento”; não levando
em consideração o desastre socioambiental provocado, e o que se anuncia para os
próximos anos com o atual modelo de expansão desta tecnologia, que tem optado
pela geração centralizada, em benefício exclusivo do lucro das empresas.
Alguns dos principais efeitos
negativos identificados estão relacionados a supressão de vegetação (área para
a instalação dos aerogeradores e construção de estradas); aos problemas
causados a fauna (mortandade de morcegos, pássaros), as pequenas criações
(diminuição dos ovos, do leite, abortos, …); as alterações do nível
hidrostático do lençol freático no processo de instalação da estrutura das
torres; aos impactos sonoros e efeito “estroboscópio” afetando a saúde das
pessoas (distúrbios do sono, dor de cabeça, zumbido e pressão nos ouvidos,
náuseas, tonturas, taquicardia, irritabilidade, problemas de concentração e
memória, episódios de pânico com sensação de pulsação interna ou trêmula, que
surgem quando acordado ou dormindo); aos deslocamentos das populações com
destruições de modos de vida de populações tradicionais; a expropriação de
terras (com contratos draconianos de arrendamento) e pagamentos irrisórios dos
arrendadores.
Não se pode admitir que continue esta situação de “vale tudo”. Não é respeitado nem áreas de conservação, nem brejos de altitude, áreas indígenas, áreas quilombolas, fundos de pasto, áreas da agricultura familiar, áreas litorâneas de vocação turística, etc. É mais que urgente mudar a rota do atual modelo de expansão adotado, diante da necessidade de utilizar as fontes renováveis de energia (sol, vento, biomassa, água), na descarbonização tão necessária e urgente, para uma transição energética justa, e assim, enfrentar a emergência climática que assola o planeta.
Várias propostas para minimizar estes problemas têm sido sugeridas e discutidas. Como a priorização da produção descentralizada de energia. Não há dúvidas que grandes instalações contínuas com seus efeitos cumulativos, ocupando grandes áreas (onde existem moradores dispersos), atentam mais gravemente contra o meio ambiente e as pessoas, do que pequenas instalações eólicas. O tamanho do impacto é proporcional ao tamanho da área ocupada pelos aerogeradores, transformadores, e pela construção de estradas e acessos, além das linhas de transmissão.
No sentido de evitar e mesmo
minimizar os danos, urge tornar obrigatório o Estudo de Impacto Ambiental (EIA)
e do Relatório de Impacto de Meio Ambiente (RIMA) para tais empreendimentos.
Não é correto tecnicamente utilizar a expressão energia limpa (como de baixo
impacto ambiental) para instalações de grande porte, diante do que está
ocorrendo, e assim exigir somente o Relatório Ambiental Simplificado (RAS).
O zoneamento territorial
evitaria que determinadas áreas recebam os complexos eólicos e assim
minimizaria danos ambientais, sociais, culturais e econômicos, além de evitar a
competição entre produção de alimentos e de energia. A atualização dos Atlas
dos Ventos, talvez possa ser um caminho, se for levado em conta em sua
confecção: a) as políticas públicas ambientais; b) a localização das Unidades
de Conservação; c) áreas de proteção ambiental dos Brejos de Altitude
(Pernambuco e Paraíba); d) áreas de proteção de mananciais hídricos; e) as
áreas de “hotspot” da conservação biológica; f) zonas de produção
agroecológica; g) as propriedades rurais produtivas da agricultura familiar e
assentamentos agrícolas.
Efetivo acompanhamento e
fiscalização pelos órgãos ambientais (o que não acontece hoje) de todas as
etapas de licenciamento (prévia, instalação e operação) concedidas.
Transparência dos relatórios das equipes de fiscalização e acompanhamento com a
sua publicação, com informações sobre o atendimento ou não, das exigências
contidas nas licenças expedidas (compensação).
Os complexos eólicos têm deixado profundos rastros de destruição do meio ambiente e na vida das comunidades atingidas (exemplos não faltam). Desde a obtenção do terreno (pela compra, ou pelo arrendamento), a sua preparação (desmatamento, terraplanagem, compactação, abertura de estradas de acesso dos equipamentos), a construção das linhas de transmissão, a piora na saúde das pessoas, a desconstituição das atividades produtivas com a desestruturação dos modos de vida.
Sem que requisitos socioambientais sejam atendidos, sem o respeito pela vida das pessoas que vivem e tiram seu sustento de onde vivem, e cultivam suas tradições; os grandes complexos eólicos são insustentáveis, e no fim das contas trazem mais desvantagens do que vantagens. Assim, propõe-se a criação de territórios livres dos complexos eólicos (TLCE), que a geração distribuída seja priorizada, e que seja exigido o EIA/RIMA para o licenciamento dos empreendimentos. (ecodebate)
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