Quatro anos depois, produtos de
Fukushima sofrem com ‘maldição’
Quatro anos já se
passaram desde o terremoto e o tsunami que devastaram o litoral nordeste do Japão.
Desde então, a população local, aos poucos, se reestruturou.
Mas a economia da
província de Fukushima, que enfrentou ainda o vazamento da usina nuclear de
mesmo nome, não consegue retomar os trilhos - e lidar com o preconceito contra
os produtos locais, uma verdadeira "maldição".
Os setores que mais
sofrem são o agropecuário, o de pesca e o de turismo. O medo de que os produtos
estejam contaminados afasta o consumidor e também turistas, apesar das
garantias das autoridades de que eles são completamente seguros para consumo
humano.
Uma pesquisa feita
pela Agência Japonesa de Assuntos do Consumidor mostrou que esse temor cresceu
ainda mais no ano passado, mesmo o governo adotando medidas restritas de
medição do nível de radioatividade de produtos locais.
O Ministério da
Agricultura, Pesca e Floresta admitiu que está difícil convencer os japoneses,
e mais ainda os estrangeiros, de que os produtos são realmente seguros.
A desconfiança em
relação à carne bovina da região, por exemplo, fez com que ela ficasse 10% mais
barata do que a produzida em outras regiões do país.
Em 2010, um ano
antes da tragédia, Fukushima vendeu 153 toneladas de produtos agropecuários
para outras regiões e também para o exterior. No ano seguinte, após o desastre,
foram apenas 17 toneladas e a situação só piorou.
Em 2012, a
província vendeu apenas 2 toneladas de produtos.
Promoções
Alguns
supermercados fazem promoções e vendem pacotes embalados de legumes e vegetais
quase duas vezes maiores do que o habitual pela metade do preço. Mesmo assim,
os produtos ficam encalhados.
"Muitos
lojistas não dizem abertamente que não vão comprar produtos de Fukushima, mas
eles nunca compram", reclama Hiroyuki Kurahashi, 41, proprietário de uma
fábrica de saquê - um dos produtos mais tradicionais da região - e presidente
da Associação de Produtores de Saquê de Fukushima.
Desde o desastre de
2011, Kurahashi não para de receber telefonemas de consumidores preocupados.
"Um deles me disse que recebeu nosso saquê de presente de um amigo e
perguntou como fazer para devolvê-lo para nós. Eu disse para jogar fora o
conteúdo se não quisesse beber, mas ele disse que isso poderia contaminar seu
lugar", conta.
O peixeiro Takayuki
Ueno, 46, que gerencia um pequeno negócio perto do porto, também não tem muitas
esperanças de uma reviravolta no mercado. "Essa situação deve se estender
por uns 10 anos", calcula ele.
Os cálculos de Ueno
batem com a estimativa do governo, que diz que o setor pesqueiro da região
levará dez anos para voltar à situação anterior ao tsunami.
Enquanto os peixes
não saem da geladeira na mesma velocidade que chegam, o peixeiro conta com a
ajuda financeira do governo.
"Não tem outra
alternativa. Então, temos de tocar a vida", suspira.
Voluntários
Enquanto a situação
não melhora, voluntários de todo o Japão continuam ajudando a população da
região.
Em Fukushima, por
exemplo, a organização sem fins lucrativos The People organiza grupos para
ajudar agricultores no plantio e na colheita de algodão orgânico.
O produto é
utilizado na confecção de camisetas e de bonecos artesanais.
As lembrancinhas
são feitas pelas famílias que vivem em casas provisórias e o dinheiro
arrecadado ajuda na renda dessas pessoas.
Kaoru Kanabe,
coordenadora da organização, explica que sem a ajuda de voluntários o projeto
não sobreviveria.
"Parte do
dinheiro arrecadado com a venda dos produtos vai direto para os agricultores e
moradores que perderam tudo com o tsunami ou que tiveram de abandonar suas
casas por causa da explosão da usina nuclear", conta.
Desde que foi
iniciado, em 2012, cerca de 12 mil pessoas colaboraram com o projeto até agora.
O brasileiro
Hidekichi Hashimoto é um dos que vão para a região devastada pelo tsunami
sempre que pode.
"Já vim umas
35 vezes e acredito que, como ser humano, é o mínimo que posso fazer para
ajudar", justifica ele, que sempre volta com sacolas cheias de produtos
locais, os quais distribui aos amigos.
Governo local
Um dos maiores defensores
e entusiastas na promoção dos produtos de Fukushima é o novo governador da
província, Masao Uchibori, eleito em outubro passado.
Desde que assumiu o
governo, ele vem investindo pesado em campanhas de divulgação. Recentemente,
ele organizou um evento em Tóquio que contou com a presença dos embaixadores da
Nova Zelândia, da Austrália, do Canadá e da Grã-Bretanha.
Na ocasião, eles
comeram bolinhos de arroz e outras iguarias de Fukushima para demonstrar apoio
à província.
"A explosão da
usina causou um grande impacto negativo na província e ainda sofremos as
consequências", disse Uchibori.
Por isso, o
governador defende que o governo do primeiro-ministro Shinzo Abe reavalie com
muita calma os planos de retomar o uso da energia nuclear.
"Quando
instalaram a usina em Fukushima nos disseram que era seguro e nada de errado
poderia acontecer. Descobrimos, da pior forma, que tudo não passava de uma
mentira", critica o governador. (bbc)
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