Resíduos de
tratamento de esgotos: rejeitos orgânicos, óleos, graxas podem ser aproveitados
na geração de energia.
Pesquisa da Escola de
Engenharia de São Carlos (EESC) da USP demonstra o potencial de reuso e de
aproveitamento de resíduos gerados nas estações de tratamento de esgoto (ETEs)
como fonte de energia. Durante o trabalho foram avaliados os aproveitamentos de
três diferentes tipos de resíduos removidos no tratamento preliminar dos
esgotos: óleos e graxas, rejeitos removidos no gradeamento e areia. Além da
geração de energia pela queima de rejeitos orgânicos e produção de biogás,
resíduos de areia podem ser usados na construção civil. Os resultados do
trabalho são apresentados na tese de doutorado de Nayara Batista Borges do
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Hidráulica e Saneamento do Departamento
de Hidráulica e Saneamento (SHS) da EESC.
Coleta dos resíduos nos gradeamento grosseiro e fino:
(a) modo convencional de disposição nas caçambas e (b) dispositivo condutor
utilizado na pesquisa.
Atualmente, a disposição final dos detritos é feita
em aterros sanitários, o que gera um alto custo que atinge até 50% do gasto
operacional de uma ETE. Como referência para a pesquisa, foi escolhida a ETE
Monjolinho em São Carlos (interior de São Paulo), que tem capacidade de atender
258 mil habitantes e possui sistema preliminar destinado à remoção de rejeitos
pelas etapas de gradeamento (fino e grosseiro) e desarenador, equipamento que
tem a função de realizar a separação física, por diferença de gravidade, e ao
mesmo tempo decantar os sólidos de maior tamanho.
Os detritos removidos nas
unidades de gradeamento grosseiro e fino foram separados e agrupados de acordo
com a tipologia de matéria orgânica sujeita à decomposição — como restos
de alimentos, animais, fios de cabelo, galhos e folhas — além de
plásticos, papéis, tecidos, pedras e outros. Posteriormente, avaliou-se o
potencial energético desses resíduos mediante realização da análise do poder
calorífico, que é a quantidade de energia por unidade de massa (ou de volume,
no caso dos gases) liberada na oxidação de um determinado combustível.
No total, após o processo de
secagem em uma estufa do tipo agrícola, a queima dos rejeitos captados nas duas
unidades de gradeamento geraram 1.094 KWh de energia, o que corresponde à
economia de R$ 437,70, e considerando os R$ 18,70 de despesa com o transporte e
disposição das cinzas, obteve-se o lucro de R$ 419,00.
Etapas do procedimento de
limpeza e secagem da areia residual: (a) preliminar, (b) peneiramento, (c)
lavagem e (d) secagem.
Geração de energia
Ressalta-se que esses custos
referem-se apenas aos gastos operacionais, pois não foi realizada a análise
envolvendo os cálculos de implantação e manutenção do incinerador. A
pesquisadora destacou que a geração de energia utilizando os restos removidos
nos gradeamentos de apenas uma estação de tratamento de esgoto não seria
rentável, tendo em vista sua baixa produção e o elevado custo de implantação de
equipamentos para esse fim. Uma possível solução para viabilizar a queima dos
detritos seria enviá-los às centrais de geração de energia de resíduos sólidos
urbanos.
Verificou-se também o elevado
potencial de aproveitamento da sobra de areia, removida dos desarenadores, como
agregado miúdo na incorporação de argamassas para revestimento e preparação de
concreto não estrutural, desde que seja submetida ao procedimento de limpeza e
secagem. “Ao aproveitar a areia removida, além de diminuir danos ambientais por
sua disposição inadequada, pode-se reduzir impactos decorrentes da extração
desse material em rios a ser destinado para a construção civil”, explicou
Nayara.
Nessas condições,
comprovou-se a viabilidade técnica e econômica de utilização da areia residual,
pois ela apresentou menores custos: um total de R$ 3.530,43 em comparação à
disposição em aterro sanitário, que gera o custo de R$ 4 mil. “Essa diferença
pode ser ainda mais significativa para ETEs de grande porte. Portanto, sob o
ponto de vista econômico, é mais vantajoso aproveitar a areia do que dispô-la
em aterros sanitários”, afirmou.
Nayara ainda obteve
resultados a partir da gordura removida dos desarenadores. O trabalho
demonstrou que a degradação do material reduz cargas orgânicas, além de gerar
biogás durante o processo anaeróbio (na ausência de oxigênio), que pode ser
consumido na própria estação. Avaliou-se também a potencialidade de produzir
biocombustível, porém os resultados dessa avaliação demonstraram que há
dificuldades técnicas e baixa potencialidade de retorno econômico.
Por fim, cabe ressaltar que a
pesquisa resultou em um dos objetivos previstos da Política Nacional de
Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010), que visa incentivar o desenvolvimento de
sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos
processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluindo a
recuperação e o aproveitamento energético. Além disso, atendeu o artigo 9 da
referida lei, que estabelece que todos os resíduos sejam reaproveitados e
tratados, e somente os rejeitos desses processos sejam dispostos em aterros
sanitários. A pesquisa foi orientada pelo professor José Roberto Campos, da
EESC, e teve a colaboração do professor Javier Mazariegos Pablos e dos técnicos
do Laboratório de Construção Civil do Instituto de Arquitetura e Urbanismo
(IAU) da USP, em São Carlos. (ecodebate)
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