O que dizem da energia limpa
e quem fica com o ‘menor impacto’
Em dois documentários feitos sob a perspectiva dos
atingidos pela indústria eólica – um realizado pelo CPT (Conselho Pastoral da
Terra) Bahia, Energia
Eólica: a caçada pelos ventos! (2013) e
outro, Vento Forte,
realizado pelo CPP (Conselho Pastoral dos Pescadores) e lançado esse ano –
acompanhamos os relatos dos danos ambientais e sociais causados pelas (várias)
empresas de geração de energia eólica.
Para quem acompanhou as transformações causadas pelas
usinas hidrelétricas, o esquema se repete: contratos abusivos, audiências
públicas de fachada, devastação da flora e fauna, controle sobre a água (ao
menos no período da construção), desapropriação e remoção de comunidades
tradicionais.
Assim como no caso das hidrelétricas no Madeira se
propalava que usinas a fio d’água eram sinônimo de energia limpa, o senso comum
diz que as usinas eólicas também geram energia limpa. A fonte é renovável, não
é? Falar de “impacto” é pouco, porque o dano não pode mais ser mitigado.
Trata-se de transformações em que o desgaste provocado é irreversível. A
remoção de pessoas é uma constante. A disputa por territórios é perpetuada.
Grandes obras de infraestrutura implicam em remoções forçadas de comunidades
inteiras, sejam obras para a Copa, as Olimpíadas, ou para geração de energia.
Para onde vai essa energia toda?
A energia produzida ali não se destina ao entorno.
Assim como Santo Antônio e Jirau tiveram sérios problemas em relação às linhas
de transmissão, as usinas eólicas estão criando elefantes brancos mal
planejados. Aqui se aplica bem a frase perolar proferida por um colega:
“Primeiro atiram a flecha, depois correm com o alvo, pra tentar fazer a flecha
acertar o alvo.”
Com tais “regras do jogo”, não há nenhuma fonte limpa.
31 novas usinas solares foram contratadas pelo Governo em leilão realizado no
ano passado. A novíssima fonte se reúne à matriz energética nacional repisando
os trilhos da concentração econômica, licenciamento e instalação compulsória
nos locais mais propícios à maximização da geração, o que significa novas levas
de remoções sumárias e efeitos ambientais “imprevistos”.
Não estamos fazendo opção por fontes com “menor
impacto”. Todas as fontes estão sendo inventariadas para serem utilizadas
extensivamente, como demonstra o projeto de expansão do parque nuclear
brasileiro no vale do rio São Francisco, ou as dezenas de novas hidrelétricas
na Amazônia, projetadas para serem instaladas até 2018. A escolha já foi feita
em nome dos conglomerados eletrointensivos que ficam muito contentes em poderem
ostentar selos de “sustentabilidade”. Os documentários anunciam uma nova
geração de moinhos de gente, que mesmo assim se apresentam como negócios
limpos.
No modelo que temos hoje, a indústria eletrointensiva
é a maior consumidora de energia, e sua demanda é infinita: nunca se produziu
tanta energia no Brasil e nunca se pagou tão caro por ela. Tem alguma coisa
errada nessa conta. Será que, com nosso poder de organização e planejamento,
não somos capazes de repensar esse modelo predatório de geração de energia?
Lou-Ann Kleppa autora do artigo, é professora da
Universidade Federal de Rondônia (Unir), graduada em Letras pela Universidade
de São Paulo, tem mestrado e doutorado em Linguística pela Universidade
Estadual de Campinas (SP), e doutorado sanduíche em Neurolinguística pela
Radboud University Nijmegen. Foi diretora do documentário “Entre a cheia e
o vazio”. (ecodebate)
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