Superar a
dependência do petróleo e construir uma matriz energética 100% renovável.
“The future will be renewable-based or there won´t
be a future” - (Adolfo Rebollo, CEO of Ingeteam)
Os
Estados Unidos se envolveram em uma série de guerras visando garantir o
egoístico acesso aos recursos petrolíferos globais. As guerras do Afeganistão e
do Iraque são exemplos recentes de intervenções militares desastrosas para
todos os países envolvidos e para o mundo. Calcula-se que os EUA gastaram cerca
de US$ 6 trilhões de dólares nestes dois conflitos militares (fora as perdas de
vida humana, não humana e os desastres ambientais).
No
governo Barack Obama, os EUA gastaram anualmente cerca de US$ 550 bilhões em
despesas de guerra e no aparato bélico. Agora em 2017, o governo Donald Trump
pretende aumentar estes gastos em 10%, elevando-os para a casa dos US$ 600
bilhões anuais. O discurso oficial argumenta que são despesas para garantir a
segurança interna e a liberdade no mundo. Mas muitos críticos mostram que o
exagerado arsenal militar dos EUA tem a função de garantir o acesso do país aos
combustíveis fósseis depositados nos territórios estrangeiros.
Porém,
existe outro caminho para os EUA e o mundo. Ambientalmente, a “Era do Petróleo”
está com os dias contados (seja pelo Pico de Hubert ou pelo Orçamento Carbono).
Assim como a Idade da Pedra não acabou por falta de pedras, a “Idade do
Petróleo” vai acabar não por falta de petróleo, mas por avanços tecnológicos
que vão permitir a construção de uma nova matriz energética, não fóssil, de
baixo carbono, renovável e mais limpa do ponto de vista ambiental.
Artigo
de Tom Solomon (26/10/2016) mostra a viabilidade da transição da matriz
energética dos EUA nas próximas duas décadas. Para ele, existe uma maneira
viável de superar os combustíveis fósseis e sair da crise climática a tempo de
evitar os piores efeitos do aquecimento global. O plano se baseia no trabalho
realizado pela equipe de Mark Jacobson, da Universidade de Stanford (www.thesolutionsproject.org), que descreve um
futuro com 100% de energia renovável até 2050.
Considerando
as metas do Acordo de Paris (de dezembro de 2015) – para manter o aquecimento
global abaixo de 1,5º C. – será preciso substituir todos os combustíveis fósseis
por energias renováveis e limpas, com 50% até 2030 e com 100% até 2050. No caso
dos EUA, para transformar a matriz energética seria preciso atingir: 3.966 GW
de energia fotovoltaica (PV-solar); 2.421 GW de eólica; e 61 GW de novas
capacidades de hidroelétrica + geo + onda + maré. Para atingir 100% destes
6.448GW em 2050 e 50% até 2030 deveria haver um esforço redobrado.
Em
2015, os EUA instalaram 7,3 GW de PV solar e 8,6 GW de eólica. Se estes
acréscimos de capacidade forem mantidos seria preciso 405 anos para atingir
100% dos 6.448 GW. Portanto, é preciso investimentos maciços na área, com pelo
menos 488 gigafactories até 2029.
A
tabela abaixo mostra a estimativa do custo financeiro para a mudança da matriz
energética dos EUA. Os investimentos anuais seriam de US$ 283 bilhões. Nota-se
que este valor é menos da metade do orçamento anual de defesa, proposto por
Donald Trump, de cerca de US$ 600 bilhões.
O
custo total para a efetivação de uma matriz 100% renovável até 2037 seria de
US$ 6,3 trilhões. Isto é semelhante ao custo total gasto nas guerras do Iraque
e do Afeganistão. Por outro lado, haveria uma economia no gasto com
combustíveis fósseis, além de mitigar o efeito estufa.
O
prefeito de Chicago, Rahm Emanuel, anunciou em abril de 2017 que a cidade se
comprometeu a garantir que todos os edifícios governamentais serão alimentados
por 100% de energia renovável até 2025, o que tornaria a cidade de Chicago a
maior cidade do país a manter todas as suas instalações públicas abastecidas
por energia não fóssil.
O
que o artigo de Tom Solomon (26/10/2016) mostra é que as barreiras para uma
matriz 100% renovável são políticas, não técnicas. A resistência vem dos
setores econômicos que perderão negócios (petróleo, gás, carvão e indústria
automobilística com combustão interna), além do complexo industrial-militar.
Este
raciocínio é mundial. Relatório de 2016 do Instituto Internacional para a
Investigação da Paz de Estocolmo (em inglês SIPRI) mostra que os gastos
militares no mundo chegaram à impressionante cifra de cerca de US$
1.700.000.000.000,00 (1 trilhão e 700 bilhões de dólares), representando 2,5%
do PIB mundial.
Assim,
fica claro que é preciso inverter a lógica militarista da estratégia de
fortalecer o poder de guerra para garantir acesso aos combustíveis fósseis. Ao
invés dos gastos de morte, é preciso investir na paz e no aproveitamento das
enormes reservas de sol e vento que estão à disposição de todos os países. O
sol nasceu para todos, cabe saber transformá-lo em energia e em fonte de
progresso pacífico para a sociedade e o meio ambiente. A metade dos recursos
gastos com despesas militares seria suficiente para mudar a matriz energética
mundial e para ter uma chance de salvar o mundo do desastre do aquecimento
global.
Neste
sentido, os senadores Jeff Merkley (D-OR), Bernie Sanders (I-VT), Edward J.
Markey (D-MA) e Cory Booker (D-NJ) fizeram uma proposição legislativa visando
100% de energia limpa e renovável até 2050. O chamado “100 by Act 50”
estabelece um roteiro para uma transição para 100% de energia limpa e renovável
até 2050. É o primeiro projeto de lei introduzido no Congresso americano que
vai prever completamente uma transição de combustíveis fósseis para os Estados
Unidos, inclusive visando a segurança energética para eliminar a dependência
dos combustíveis fósseis do Oriente Médio.
Segundo
a organização Sierra Club, já existem 25 cidades nos EUA que se comprometeram a
implementar 100% de energia renovável até 2035. No início de maio, a cidade de
Atlanta, na Georgia, aderiu à campanha “Ready For 100%” e se tornou a maior
cidade do Sul dos EUA a se comprometer com o fim do uso de combustíveis
fósseis.
Portanto,
a batalha pela justiça social e pela preservação da natureza passa
necessariamente pela luta contra a corrida armamentista, pela redução dos
gastos militares, pelo desarmamento, pela harmonia entre os povos, pelo
redirecionamento da energia de guerra para a energia de paz e pela
democratização da produção e da oferta de energia renovável. (ecodebate)