quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Goiânia e Fukushima: lições (não) aprendidas

Em 13 de setembro completaram-se 25 anos do acidente com césio-137 em Goiânia, considerado o maior sinistro radiológico do mundo. A radiação de uma cápsula de césio abandonada em um ferro velho atingiu mais de 6 mil pessoas e gerou 6 mil toneladas de material radioativo.
Também na mesma semana passada, a crise nuclear em Fukushima (Japão) completou 18 meses. As combinações dos desastres naturais com a falta de segurança dos sistemas de resfriamento do complexo nuclear resultaram no derretimento do núcleo de três reatores e, consequentemente, no alastramento de radiação por uma área de 13 mil quilômetros quadrados, obrigando 146 mil pessoas a se deslocarem.
Até hoje, o governo e as autoridades nucleares falham em reconhecer o número correto de impactados em Goiânia e alterar a fiscalização nuclear no Brasil de forma a impedir que novas fatalidades aconteçam. A gestão do setor continua confusa; a mesma agência governamental exerce as funções díspares de fomento e fiscalização de atividades nucleares.
No início do mandato da presidente Dilma Rousseff, esperava-se que o governo fizesse uma grande reformulação na Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). Curiosamente, o pacote de mudanças previamente anunciado acabou adiado, em função do acidente de Fukushima, e nunca se concretizou.
No Japão, a moral do setor nuclear não anda muito melhor. O Comitê Japonês de Investigação concluiu, em relatório, que as autoridades foram ineficientes na reação ao acidente nuclear de Fukushima. O estudo apontou que tanto o operador dos reatores quanto o órgão regulador japonês falharam em oferecer medidas de mitigação adequadas, por excesso de confiança na segurança das usinas nucleares.
No Brasil, o que se seguiu após o desastre do césio-137 foi o avanço do projeto atômico, com a inauguração da usina de Angra 2, em 2000, e a retomada das obras de Angra 3, em 2009.
Nem os desdobramentos mundiais do acidente de Fukushima foram suficientes para interromper a empreitada. Alguns países, como EUA e França, já paralisaram seus planos de expansão nuclear; outros, como Alemanha, Itália e Suíça, planejam a desativação de suas centrais até a próxima década. Todos os reatores europeus estão sendo submetidos a testes de segurança para reavaliar sua verdadeira vulnerabilidade a acidentes.
Parte dos recursos para a construção de Angra 3 viria de bancos europeus, intermediados por fiança alemã, desde que fosse comprovado, dentro dos atuais critérios, que as usinas do complexo de Angra são seguras e resistem a impactos naturais. Mas novamente o risco de acidentes vem sendo minimizado pelas autoridades nacionais, que tardam em providenciar respostas adequadas às limitações de segurança das usinas de Angra, jamais projetadas e testadas para funcionarem em regiões de solo desfavorável e sujeitas a deslizamentos, o que dirá outras intempéries.
Pelo menos no campo energético, o Japão está fazendo sua lição de casa. Desligou todos os seus 53 reatores e resistiu ao aumento da demanda energética no verão do hemisfério norte, lançando mão de medidas de eficiência energética. O programa de incentivo a energias renováveis já resultou na instalação de 560MW em energia solar fotovoltaica após um mês, e prevê-se um total de 2500MW em energias renováveis até março do próximo ano, o equivalente a duas usinas de Angra 3.
No Brasil, o BNDES tem investido em energias renováveis, notadamente parques eólicos. No entanto, também segue como o grande apoiador da construção de Angra 3, aportando R$ 6 bilhões ou 60% do investimento — valor que pode aumentar se o empréstimo europeu não vier.
Depois do legado dos acidentes de Goiânia e Fukushima, sem mencionar o trágico episódio de Chernobyl, na Ucrânia, não precisamos de mais vítimas para ter a certeza de que esse não é o caminho a ser seguido. Precisamos é de coragem e ousadia para apostar em uma revolução energética, investindo ainda mais em energias renováveis e aproveitando o enorme potencial brasileiro de fontes de energia eólica, solar, por biomassa e oceânica. (EcoDebate)

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