A energia eólica, aquela
energia elétrica produzida pela velocidade dos ventos, tem crescido
exponencialmente no país ao longo dos últimos anos. Em 2011, a potência
instalada era de 2 GW (GigaWatts). Em agosto de 2023, segundo a Associação
Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (ABEEólica) a potência instalada
em 12 Estados ultrapassou 26 GW, com cerca de 916 parques eólicos e mais de
10.178 aerogeradores instalados. Isto representa aproximadamente 13,2% da
matriz elétrica nacional.
O modelo de expansão adotado
para esta tecnologia foi o da geração centralizada, ou seja, a produção de
energia elétrica em grande escala, a partir da instalação de centenas, mesmo
milhares de aerogeradores em áreas contínuas, formando complexos eólicos. A
geração centralizada necessita a ocupação de grandes áreas pelos equipamentos
de conversão.
No Nordeste, em particular,
as áreas preferidas pelos “negócios do vento” estão localizadas no interior
(bioma Caatinga, em áreas montanhosas, resquícios de Mata Atlântica, brejos de
altitude, fundo e fecho de pasto) e em áreas costeiras.
A procura, das melhores áreas de potencial eólico pelos empreendedores leva em conta locais onde haja constância e boa velocidade média anual dos ventos. Diferentemente do que alegam os empreendedores, são locais onde vivem populações indígenas, quilombolas, pescadores, marisqueiras, agricultores familiares. Muitos desses territórios são áreas de conservação, áreas protegidas.
O setor das eólicas tem recebido apoio incondicional para seus empreendimentos dos governos federal, estaduais, municipais. Entre outras facilidades oferecidas pelo setor público, está a flexibilização da legislação ambiental, pelo uso de um conceito negacionista, que afirma que a energia eólica é uma fonte limpa, portanto de baixo impacto.
Com esta classificação, para o
licenciamento ambiental os empreendedores são isentos de fazer estudos
socioambientais mais aprofundados como o Estudo de Impacto Ambiental e o
Relatório de Impacto do Meio Ambiente. Só é exigido o Relatório Ambiental
Simplificado (RAS).
Os impactos, conflitos e
injustiças socioambientais, cometidas pela expansão do modelo centralizado de
geração eólica no país, são denunciados desde 2014. Nos casos analisados se
constata que o setor eólico, também conhecido como “negócios do vento”, não
cumpre as boas práticas socioambientais.
É no Nordeste que os impactos socioambientais são mais evidenciados, pois a região concentra mais de 3/4 de toda potência eólica instalada no país.
Ao listar os problemas e danos causados pelos “negócios do vento” e seu modelo de expansão predatório, nos defrontamos com a questão da ocupação da terra. De fato, os contratos de arrendamento (em sua maioria) acabam expropriando as terras dos posseiros, sobretudo pela longa vigência (35 a 40 anos), com cláusulas de renovação automática, e por meio de restrição ao uso de terras comuns, provocando alterações nas dinâmicas sociais e econômicas locais.
Os danos ambientais são
distintos, dependendo do local de implantação das centrais eólicas. No caso da
zona costeira altera significativamente as características ecológicas e
morfológicas desses ecossistemas, especialmente os lacustres, os campos de
dunas e os manguezais. Esses ecossistemas são sistematicamente degradados, com
desmatamento, supressão de habitat, soterramento, impermeabilização do solo e
compactação de dunas; o que tem aumentado os processos de erosão costeira e
alterado a dinâmica hídrica das regiões e, consequentemente, a disponibilidade
de água doce.
No caso da implantação ser no
interior, afeta diretamente, e principalmente o bioma caatinga com a redução
das áreas de cultivo da agricultura familiar, o modo de vida das populações.
Dentre os efeitos negativos estão a supressão de vegetação, problemas causados
à fauna (mortandade de morcegos, pássaros), alterações do nível hidrostático do
lençol freático no processo de instalação da estrutura das torres, aterramento
e devastação de dunas, deslocamentos forçados de populações com destruições de
modos de vida de populações tradicionais, expropriação de terras (com contratos
draconianos de arrendamento), e no pagamento irrisório dos arrendantes.
Além de prejudicar a saúde das pessoas e dos animais domésticos, outro ponto de grande relevância é o impacto sonoro, relatado pelas populações que vivem próximo dos complexos eólicos. O ruído – significativo e constante – produzido pelo vento que movimenta as pás dos aerogeradores, geram distúrbios do sono, dor de cabeça, zumbido e pressão nos ouvidos, náuseas, tonturas, taquicardia, irritabilidade, problemas de concentração e memória, episódios de pânico, com sensação de pulsação interna ou trêmula, que surgem quando acordado ou dormindo.
O efeito de sombreamento causado pela projeção das pás das turbinas nas residências, conhecido como efeito estroboscópico (shadow flicker), ocorre em grande parte pelo tamanho das torres dos aerogeradores, devido à proximidade das casas, que em alguns casos chegam a distâncias próximas dos equipamentos eólicos, em torno de 150 m.
Estudos e relatos realizados
mostram os danos sociais, econômicos e ambientais causados; o que provoca
verdadeiras tragédias e sofrimentos, com perdas, prejuízos, danos, privações,
destruição de vidas e de bens, muitas vezes permanentes e irreversíveis,
cometidas pelos complexos eólicos.
Já passou a hora das empresas
ligadas aos “ negócios do vento” deixarem de simplesmente propagandear suas
responsabilidades sociais e ambientais, e não discutirem e encontrarem soluções
para as questões que resultam nos vários e importantes impactos sobre a vida
das pessoas e do meio ambiente, quando da instalação e operação dos complexos
eólicos.
A realidade das comunidades
que tiveram a experiência de convivência com os empreendimentos de geração de
energia eólica permitiu que muitas lições fossem amargamente aprendidas. Daí a
necessidade de recompensar os que foram, de alguma forma, atingidos pelo
empreendimento.
Ao reconhecer a existência dos problemas, cabe às empresas resolvê-los para que projetos futuros não cometam os mesmos erros. De modo transparente, com diálogo e respeito às populações do meio rural, levando em conta o princípio básico que a vida é mais importante. As empresas – junto com as comunidades atingidas, e as autoridades administrativas – devem apontar as soluções adequadas, e impor ao empreendedor, se for o caso, medidas de mitigação e/ou de compensação ambiental.
Como apela o título, o melhor caminho, com certeza, não é continuar fingindo que não existam problemas no arrendamento de terras, na implantação e operação dos complexos eólicos. (ecodebate)
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