A expansão de energia
Essas contas de energia são sempre bastante controversas. Existe um planejamento que avalia sempre uma demanda futura e, portanto, tenta suprir essa necessidade com a construção imediata de hidrelétricas e usinas com outras fontes de energia. Nós vimos que, no ano passado, em função da desaceleração econômica, o Brasil não consumiu tanta energia quanto se esperava.
São questionáveis as informações técnicas relacionadas à construção dos cenários utilizados para alimentar a modelagem sobre as projeções de consumo energético. Historicamente, o Setor Elétrico tem feito projeções com base na premissa do crescimento da economia baseado em taxas acima das atuais e que geram “previsões” irreais do consumo energético. Por exemplo, em 1987, a projeção para 2005 foi 54% acima do consumo verificado. As projeções com horizontes mais curtos também sempre foram superestimadas. Por exemplo, em 1999, o consumo projetado para 2005 foi 14% maior que o ocorrido.
A correlação do aumento de consumo de eletricidade com o PIB não se comprova e, portanto não pode ser usada como norteadora do planejamento. Jamais o consumo de eletricidade vai crescer 5%, 10% ao ano e até mais, como foi durante os anos 1940 a 1990, quando o país estava ainda se eletrificando. Hoje, o país está praticamente eletrificado, de um modo ou de outro, embora a eletrificação por meio da rede rural ainda prossiga, e embora o Luz para Todos seja um investimento necessário e considerável na ampliação dos mercados para geração e distribuição.
O fato de o consumo de energia no Brasil ter sido sempre superestimado criou e cria expectativas de projetos de obras de grande porte que nunca precisariam ser construídos, e distorções que impossibilitaram, ao longo do tempo, o planejamento racional sustentável do futuro energético do país.
As projeções feitas pela EPE da demanda de energia elétrica para os próximos anos indicam um forte crescimento do consumo a partir de 2010, justificadas na análise otimista das boas perspectivas para a economia brasileira no mesmo período. Em função dessa visão da economia brasileira, as projeções de demanda de energia elétrica para o período 2009-2018 partiram de uma trajetória esperada de crescimento do PIB de 0,5% em 2009, 6% em 2010 e, daí em diante, 5% ao ano, em média, entre 2011 e 2018.
Estas análises estão contidas no Plano Decenal de Expansão de Energia (PDEE), produzido pela EPE para orientar as ações e decisões relacionadas à expansão da produção de energia nos próximos dez anos.
Embora o Brasil, seja um dos países com maior possibilidade de ter uma matriz energética relativamente limpa e renovável, “recorre à energia suja” em seu Plano Decenal de Expansão de Energia. Dos 55 mil MW de nova potência previstos nesse documento, nada menos que 20,8 mil MW (quase 40%) virão de fontes térmicas, aí incluídas as usinas a gás, carvão, diesel, óleo combustível ou biomassa, além das nucleares; até 2017 serão 68 novas unidades movidas a combustíveis fósseis, com 15,44 mil MW; e as emissões na área passarão de 14,43 milhões de toneladas anuais para 39,3 milhões de toneladas – na hora em que o mundo, assustado com as mudanças climáticas, procura reduzir as emissões.
Essas evidências desnudam que a política energética do Brasil não está baseada nos interesses reais e maiores de um desenvolvimento sustentável, a curto, médio e longo prazo. O foco é de interesses político partidários a serviço de interesses econômicos de grandes grupos multinacionais.
O PDEE prevê uma grande expansão nas usinas termelétricas, consideradas hoje uma das fontes mais poluentes de geração de energia e um grande vilão no combate às mudanças climáticas. O plano prevê a criação de 82 usinas termelétricas nos próximos dez anos, 74 delas de fontes fósseis. Hoje, existem no Brasil 77 térmicas instaladas, e se todas as usinas previstas no PDE forem concretizadas, as emissões de gases de efeito estufa provenientes de termelétricas no país subirão 172%. Uma completa contradição, com o Plano de Mudanças Climáticas lançado recentemente pelo Governo Federal, se comprometendo em reduzir a emissão de gases de efeito estufa.
Quadro preocupante é o que mostra o Plano Decenal: enquanto as usinas eólicas passarão de 0,3 para 0,9% da potência instalada no país, as biomassas (bioeletricidade) passarão a responder por 2,7% (hoje, 1%), as usinas térmicas aumentarão sua participação de 0,95 para 5,7% (mais de 500%). A expansão pífia prevista para a energia eólica contrasta com a as informações do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), que afirma que os ventos poderiam atender a pelo menos 60% de todo o consumo nacional de energia, já que em mais de 71 mil km2 do território nacional a velocidade dos ventos é adequada. Não por acaso, que Europa, Ásia e Estados Unidos estão investindo pesadamente nessa área e na energia solar.
Logo o que se constata é que os atuais Planos de Energia Elétrica não refletem uma visão de sustentabilidade. O Governo Federal tem priorizado obras de grande porte e alto impacto negativo para a sociedade e o ambiente, além de privilegiar tecnologias caras e ultrapassadas. Desta forma, reproduz um modelo energético arcaico, não traz avanços para o setor e agrava os problemas já existentes. O Brasil pode e deve promover um modelo energético sustentável nacional e regional e assumir uma posição de destaque internacional ao desenvolver seu enorme potencial em eficiência energética e energias renováveis.
O que a sociedade brasileira vem condenando e não aceita mais é a falta de transparência sobre as escolha das opções energéticas, impedindo que ela tenha informações, e se manifeste, sobre como e onde seu dinheiro está sendo investido. Os custos econômicos, ambientais e sociais de usinas nucleares no Nordeste do Brasil, assim como de hidroelétricas na Amazônia, são altíssimos, e nada pode explicar tamanha insistência com projetos tão desnecessários para o país e tão ineficazes em termos de geração de energia elétrica. (EcoDebate)
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