Há 12 anos, a engenheira
química Luisa Fernanda Rios Pinto, de 37 anos, deixou a Colômbia, seu país de
origem, para cursar mestrado na Unicamp, em Campinas. O objetivo inicialmente
era estudar a extração de betacarotenos (pró-vitamina A) do óleo de palma, por
meio de um processo chamado destilação molecular.
Porém, em 2010, ela conheceu
uma proposta da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(Capes), em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), de pesquisa
de microalgas para alimentar peixes. Foi um divisor de águas em sua carreira.
Ao descobrir o potencial das microalgas para produção de biodiesel –que já
começava a ser discutido em outros países – resolveu tentar doutorado no tema.
E não parou mais. Até o ano
passado foi bolsista de Pós-doutorado da Fundação de Amparo à Pesquisa (FAPESP)
e pesquisadora de pós-doutorado no ALGAE R&D Centre da Murdoch University
em Perth, Austrália (2016), quando trabalhou com Navid Moheimani (um dos
principais nomes mundiais no tema).
Atualmente pesquisadora da
Unicamp, onde orienta alunos que também se interessam pelo cultivo de
microalgas e seu uso, Luisa quer ampliar o acesso ao seu estudo e conhecimento
na produção de produtos, cinética de reações, processos de separação
convencionais e não convencionais e purificação a partir da biomassa de
microalgas.
Porém, é possível que você,
leitor(a) desta reportagem, ainda esteja se questionando qual a relevância
desse estudo, uma vez que não temos biodiesel ou bioetanol a partir do cultivo
de microalgas nos postos de combustíveis.
Note: ainda não temos, porém,
segundo a pesquisadora, não há dúvidas de que chegaremos a essa realidade.
“Hoje, tudo tem que ser pensado enquanto ciclo de vida. Ou seja, se eu fosse
montar uma biorrefinaria, eu teria que questionar os impactos dela, seja para a
população, seja para o meio ambiente. Quando falamos em biocombustíveis a
partir do cultivo das microalgas estamos falando em um ciclo completo, uma vez
que elas possuem o potencial de transformar o CO2 emitido pela própria
refinaria em oxigênio de novo”, explica.
Isso porque as microalgas –
que são organismos unicelulares que crescem tanto em água doce quanto em água
salgada – são responsáveis pela transformação do gás carbônico em oxigênio.
“Elas garantem a produção de até 50% do oxigênio do planeta, sendo extremamente
importantes para a humanidade”, destaca Luisa.
De
acordo com a pesquisadora, existem três frentes de estudos envolvendo as
microalgas, uma delas, evidentemente, é na produção de biodiesel. A segunda é a
partir de sua concentração de lipídios, voltada para o desenvolvimento de
alimentos (entre os quais o óleo de microalgas, que já é fabricado nos Estados
Unidos) e uso na indústria cosmética. Além de serem fonte de proteína para
peixes, que naturalmente já se alimentam delas em seu habitat natural. “Dizem
que as microalgas têm cheiro de peixe, quando na verdade é o contrário”, diz Luísa.
Ao verificar o potencial das
microalgas para produção de biodiesel, a colombiana Luisa Fernanda Rios Pinto
mudou o foco de seu trabalho.
Projeto
Atualmente, de acordo com
Luisa, um dos principais bloqueadores do uso de biocombustível a partir do
cultivo da microalga é o preço. Como ainda é um processo em desenvolvimento, a
tecnologia encarece o produto. Segundo estudos, o valor seria até 60% a mais,
quando comparado aos demais biocombustíveis.
Um exemplo que ajuda a
entender está no óleo de microalgas para a culinária, que já é comercializado
em países como os Estados Unidos. “Aqui no Brasil, acredito que isso deva
chegar aos mercados no ano que vem. Porém, ele deverá custar até três vezes
mais do que o óleo de soja”, diz. Para ela, inclusive, o produto deveria ser
comparado aos azeites, tamanho sua propriedade nutritiva.
Por este motivo, ela vem
estudando o cultivo de microalgas numa reação supercrítica – em altas
temperaturas – avaliando a possibilidade de acelerar etapas no crescimento e,
portanto, baratear o custo. Porém, ainda sem sucesso. Além disso, atualmente
orienta um aluno que estuda caminho semelhante, mas com outra técnica de
cultivo.
O debate sobre a relevância
do tema, especialmente neste momento, onde nos preocupamos com as consequências
do aquecimento global, por exemplo, é para a pesquisadora fundamental. “Todos
nós podemos cultivar microalgas em casa e, num futuro não muito distante, quem
sabe cada um de nós poderá produzir seu próprio biocombustível?”.
Atualmente, ela mantém um
canal no Instagram para ampliar o acesso a informações sobre o tema (Woman In
Science). O próximo passo é ter um blog, cujo lançamento está previsto ainda
para esse ano.
Rede pública
Luisa é orientadora de
pesquisas de três alunos de escolas públicas de Campinas, selecionados pela
Universidade: Larissa Alves, Luana Silva, ambas de 17 anos, e Kaysa Américo, de
16 anos. Como parte da política de disseminar o conhecimento e construir uma
geração que pense no futuro do Planeta, o programa permite levar a ciência aos
jovens. No caso do trabalho com Luisa, o trio estuda como o cultivo de
microalgas responde ao uso de nutrientes, observando sua capacidade de acumular
lipídeos (o que permite, por meio da biomassa, a produção dos bicombustíveis).
“Outra curiosidade está no
uso das microalgas como emulsificantes para sorvetes ou mesmo maioneses”, diz a
professora, sendo esse o estudo de uma aluna sua de doutorado. Luisa lembra
ainda de um estudo realizado por ela, na Austrália, que aponta o uso eficaz de
microalgas na suinocultura. Explica-se: geralmente quando é feita a
higienização do local onde os porcos vivem, a água utilizada é descartada na
natureza, porém, contaminada. As microalgas mostraram eficiência para que a
água pudesse ser reutilizada”.
Fotossíntese
As microalgas são organismos
unicelulares e microscópicos que vivem em meios aquáticos e têm uma
característica curiosa: embora não sejam plantas, são capazes de realizar
fotossíntese e se desenvolver utilizando luz do sol e gás carbônico.
Elas se reproduzem muito
rapidamente, gerando grandes quantidades de óleo e biomassa em pouco tempo. A
produtividade, segundo pesquisas, pode ser de até 100 vezes maior do que os
cultivos agrícolas tradicionais. E justamente por isso vem chamando a atenção
de setores que necessitam de grandes quantidades de matéria-prima, como o de
biocombustíveis.
Já
existem pelo menos quatro empresas no Brasil produzindo microalgas: duas no
Nordeste, com foco em nutrição humana e animal, e outras duas no interior de
São Paulo, já atendendo indústrias de cosméticos e rações, ou projetos para
tratamento de efluentes. Contudo, há ainda muito que avançar no conhecimento e
desenvolvimento de tecnologias para impulsionar o setor.
Petrobras e Embrapa já
demonstraram interesse pelo uso na área de biocombustível. E os estudos vêm
ganhando força no País. (biodieselbr)
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