terça-feira, 10 de dezembro de 2013

O Sol como aliado

Caso já estivessem em operação, os 13 projetos contemplados pela Chamada Estratégica Nº 13 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que objetiva fomentar a instalação de Usinas Solares Fotovoltaicas (USFs) no Brasil, teriam evitado a emissão de 6.285 toneladas de carbono equivalente (tCO2eq) em 2011 e de 11.229 (tCO2eq) no ano posterior, considerando a capacidade máxima de geração de energia elétrica das plantas. Além disso, a iniciativa também teria gerado 454 empregos diretos com a instalação das USFs. As projeções fazem parte da tese de doutorado do engenheiro agrônomo Davi Gabriel Lopes, defendida recentemente na Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) da Unicamp, sob a orientação da professora Carla Kazue Nakao Cavaliero.
De acordo com Lopes, os resultados obtidos pelo estudo, o primeiro realizado sobre a Chamada 13, indicam que a maior participação da geração fotovoltaica na matriz elétrica brasileira pode trazer importantes benefícios socioambientais para o país. “Além de não emitir gases de efeito estufa [GEEs] depois de instalada, a usina solar pode colaborar para a criação de empregos e a geração de renda, fatores mais que desejáveis para um país em desenvolvimento como o Brasil”, destaca o pesquisador, que contou com bolsa de estudo concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
O autor da tese explica que antes do lançamento da Chamada 13, em 2011, o Brasil contava, praticamente, com painéis fotovoltaicos operando somente em sistemas isolados. Ou seja, os equipamentos, instalados em residências, por exemplo, não estavam interligados à rede de distribuição. A ação da Aneel pretendeu justamente estimular tanto as empresas públicas quanto privadas que atuam na geração, distribuição e transmissão de energia a investir na construção de USFs que pudessem ser conectadas à rede. Os recursos têm origem no montante que essas empresas são obrigadas a aplicar em programas de eficiência energética e em pesquisa e desenvolvimento (P&D).
Conforme Lopes, cerca de 100 projetos foram apresentados para participar da Chamada 13, mas somente 18 foram aprovados pela Aneel. Desses, entretanto, cinco desistiram de dar sequência às propostas. Dos 13 que sobraram, somente a CPFL Energia colocou a sua usina em operação. Inaugurada no final de dezembro de 2012, a unidade instalada na Subestação Tanquinho, em Campinas, exigiu investimentos da ordem de R$ 13 milhões, para produzir 1.090 MW. Participam do empreendimento, além da empresa proponente, pesquisadores da Unicamp – Lopes entre eles – e três empresas colaboradoras: Hytron, Eudora Solar e Instituto Aqua Genesis. Os demais projetos aprovados ainda estão em fase de planejamento ou os seus responsáveis estão providenciando licitações para a aquisição de equipamentos e contratação de serviços.
Para desenvolver a pesquisa, o engenheiro agrônomo baseou-se nas normas estipuladas pela Aneel e também nas informações obtidas por meio de um questionário que ele enviou às responsáveis pelos 13 projetos contemplados. Nem todas, porém, enviaram respostas. “Apenas a CPFL (já em operação) e a CESP, que deu início ao processo de licitação para a instalação da sua planta, responderam ao questionário. Para suprir a falta de dados das outras usinas, eu recorri às informações disponibilizadas pela Aneel, que promove reuniões periódicas com as empresas para acompanhar a evolução dos projetos. Mesmo assim, ainda ficaram faltando alguns elementos importantes para fazer as projeções acerca da não emissão de gases de efeito estufa. Para contornar essa deficiência, usei os indicadores da planta da CPFL, que serviu de referência para todo o trabalho”, esclarece Lopes.
Assim, para estipular a quantidade de toneladas de carbono que teriam deixado de ser lançadas na atmosfera pela operação dos projetos participantes da Chamada 13, o pesquisador partiu inicialmente da capacidade de energia gerada pelas usinas, que é de 25.619 MWh/ano, suficientes para abastecer algo como 125 mil residências por 12 meses. Depois, ele se baseou na metodologia adotada pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCC, na sigla em inglês) da Organização das Nações Unidas (ONU). Os parâmetros obtidos serviram para alimentar o software PVsyst (versão 6.1.0) que simula a energia elétrica gerada de Sistemas Fotovoltaicos Conectados à Rede (SFCR).
MDL - As usinas fotovoltaicas, acrescenta Lopes, podem ser incluídas no conceito de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), instituído pelo Protocolo de Quioto para auxiliar as iniciativas voltadas à redução das emissões de gases de efeito estufa em países em desenvolvimento. Cada tonelada de CO2 equivalente deixada de ser emitida ou retirada da atmosfera se transforma em uma unidade de crédito de carbono, chamada Redução Certificada de Emissão (RCE), que tanto pode ser negociada no mercado mundial, como se fosse uma ação, como também diretamente vinculada a um país desenvolvido que investiu em projetos de MDL em países como o Brasil, China e Índia. Os principais compradores desses papéis são os países desenvolvidos, que desejam reduzir as emissões de GEEs de uma maneira mais barata que investir em projetos em seu próprio território.
Entretanto, observa o pesquisador, a redução das emissões constitui apenas um fator que a ONU exige para classificar um projeto como MDL. “Além disso, ele também precisa atender a outras exigências, como contribuir para o desenvolvimento sustentável, criação de emprego, geração de renda e transferência de tecnologia”, diz Lopes. Ao todo, segundo o autor da tese de doutorado, a Chamada 13 deverá envolver investimento da ordem de R$ 300 milhões. Ocorre, no entanto, que praticamente dois terços desse valor serão destinados à compra de equipamentos importados.
Ainda assim, cerca de R$ 90 milhões deverão ficar no país, referentes aos custos para instalação, operação e manutenção das usinas fotovoltaicas. “Isso evidencia que, ao serem multiplicadas, as plantas podem contribuir para incrementar diversos setores industriais que fazem parte da cadeia de geração de energia solar fotovoltaica. Nesse sentido, é recomendável que o Brasil adote políticas públicas consistentes que possam fomentar esse setor”, entende o autor da tese, que acrescenta: todos os equipamentos usados na geração fotovoltaica são passíveis de reciclagem.
Ótimas condições - O Brasil é um país privilegiado em termos de insolação. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA), que considera os dados do relatório “Um Banho de Sol para o Brasil”, elaborado pelo Instituto Vitae Civilis, o país recebe energia solar da ordem de 1.013 MW/h anuais, o que corresponde a cerca de 50 mil vezes o seu consumo anual de eletricidade. Os Estados brasileiros recebem, em média, entre 3 e 8 horas por dia de insolação. O Nordeste é a região de maior radiação solar, com média anual comparável às melhores regiões do mundo, como a cidade de Dongola, no deserto do Sudão (África), e a região de Dagget, no Deserto de Mojave, na Califórnia (EUA).
Apesar de todo esse potencial, reconhece Lopes, o país tem um número praticamente inexpressivo de equipamentos que convertem energia solar em elétrica quando comparado ao que ocorre, por exemplo, em alguns países da Europa. Isso é decorrência, entre outros fatores, dos altos custos dos equipamentos. “Como a nossa matriz elétrica está fortemente baseada na hidroeletricidade, que é barata e renovável, o país nunca chegou a investir fortemente em outras fontes igualmente renováveis, como a fotovoltaica. Na Europa, essa lógica se inverte. Como a produção de eletricidade a partir das usinas térmica e nuclear é muito cara e acarreta sérios impactos ambientais, a alternativa da energia fotovoltaica torna-se economicamente viável”, esclarece o autor da tese.
Com a crescente cobrança por parte da sociedade brasileira, que tem exigido cada vez mais a incorporação de fontes “limpas” na matriz energética nacional, essa tendência começa a mudar no país. “E é importante que mude mesmo. Nos períodos de estiagem, o Brasil tem usado cada vez mais as termelétricas para suprir o consumo da população. Isso tem feito com que as emissões de gases causadores de efeito estufa dobrem de um ano para outro em relação ao MWh gerado, o que já nos obrigando a acionar um sinal de alerta”, analisa Lopes. (ambienteenergia)

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