Consultora da FAO criticada por defender retirada de
subsídios a esta indústria.
O biocombustível pode reduzir as emissões de gases de efeito estufa
Os
biocombustíveis podem ser uma das soluções para reduzir as emissões de gases de
efeito estufa nos transportes. No entanto, tanto a sua produção como
comercialização continuam envolvidas em debate.
Na semana
passada, em Lisboa para participar no VIII Congresso do Milho, a consultora da
Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Ann Berg,
afirmou que a produção de biocombustíveis a partir de alimentos é “é ridícula”.
“É um uso
ridículo para os alimentos quando há pessoas a morrer de fome”, afirmou
a especialista em mercado e ex-diretora da Bolsa de Chicago em entrevista à
Agência Lusa.
A
representante da FAO disse que a utilização de alimentos para produzir
combustíveis tem um impacto enorme sobre a disponibilidade e os preços,
apontando casos como o dos Estados Unidos da América onde 40% do milho
cultivado é usado em biocombustíveis. “São cerca de 125 milhões de toneladas
que dariam para alimentar 600 milhões de pessoas durante um ano”, exemplifica.
Ann Berg
advoga a retirada de subsídios a esta indústria para que o mercado livre possa
funcionar. Esta seria a forma mais eficaz de aliviar a pressão dos
biocombustíveis sobre o preço de matérias-primas básicas já que não acredita
noutros mecanismos de controlo, como o preço de desencadeamento.
Ao Ciência
Hoje (CH), Pedro Sampaio Nunes, presidente da Greencyber, comenta que não é da
mesma opinião. “Discordo totalmente da posição da consultora, é a produção de
biocombustíveis que fará descer o preço dos produtos alimentares”, afirma.
Segundo o
engenheiro, “existem muitos interesses em jogo nesta questão e a Nestlé e a
Unilever investiram meios muito significativos numa campanha mundial de descredibilização
dos biocombustíveis”. No entanto, “o caminho para a penetração cada vez mais
importantes dos biocombustíveis parece irreversível”, garante.
Sampaio
Nunes afirma que alguns consultores prestaram-se a fazer “trabalhos
pseudocientíficos na linha da argumentação da Nestlé”, que para o empresário
são “verdadeiramente criminosos” por “tentar retirar esta oportunidade única
dos países mais pobres do planeta de saírem do seu ciclo vicioso de pobreza e
de fome”.
Ainda assim,
de acordo com o presidente da Greencyber, o que está a acontecer é o contrário,
“África deve o seu recente desenvolvimento sustentado, entre outros fatores, ao
explosivo desenvolvimento do seu potencial agroindustrial, nomeadamente na
área dos biocombustíveis, que reduzem igualmente a sua elevada dependência
energética, barreira ao desenvolvimento”.
Por outro
lado, “a abundância de área cultivável disponível e a possibilidade de
aproveitá-las permite encarar com otimismo a possibilidade de se resolverem
vários problemas de uma só vez” como o desenvolvimento rural e econômico,
fixação de populações nos meios rurais e a solução da falta de alimentos
sustentam.
Fernando
Augusto dos Santos, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, também
discorda com a ideia de que a produção de biocombustíveis a partir de alimentos
é “ridícula”.
A afirmação
“parece-me perfeitamente exagerada”, diz. “É obvio que se pode questionar a
utilização de matérias-primas, nomeadamente cereais, para obtenção de
combustíveis, mas, como tudo na vida, é uma questão de bom senso, coisa que Ann
Berg não deve ter, pois terá outros interesses”, refere.
O professor
do departamento de agronomia gostaria que fosse dado maior relevo às culturas
não alimentares, como jatrofa, o que “permitiria dar trabalho a muita gente”. E
dá o exemplo do projeto da Galp, no norte de Moçambique. “Em relação aos
custos é obvio que atualmente não são comparáveis, na maioria das situações,
com exceção para a cana-de-açúcar no Brasil, mas a situação nos principais
países produtores, nomeadamente o Irã (2º produtor) e mesmo a Arábia Saudita
(1º produtor) não inspiram confiança”.
Também
contatado pelo CH, António Comprido, secretário-geral da APETRO, manifesta a sua posição quanto à produção de
biocombustíveis, apesar de não comentar a declaração de consultora da
Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura.
‘Trata-se de
uma alternativa importante aos combustíveis fósseis particularmente na área dos
transportes e, como tal deverá continuar a ser desenvolvida. É importante que
este desenvolvimento possa contribuir para uma redução efetiva das emissões de
gases com efeito estufa, numa ótica de ciclo de vida, e que respeite os
critérios de sustentabilidade assegurando que não prejudicam a produção de bens
alimentares, não utilizam indevidamente os solos e não prejudicam a
biodiversidade”, explica. (cienciahoje)
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