Energia solar pode ser aliada ao horário de verão para superar desafios
no setor elétrico.
Nos últimos cinco anos, o cenário energético brasileiro mudou significativamente
com a expansão da energia solar. Em 2019, a capacidade instalada de energia
solar era de 5 GW; em agosto de 2024, esse número chegou a 47 GW, representando
quase 20% da matriz elétrica do país. Esse crescimento torna o impacto do horário
de verão mais relevante do que em anos anteriores, uma vez que essa fonte pode
ajudar a atender a demanda por mais tempo, evitando o acionamento de usinas
térmicas, que são mais caras e prejudiciais ao meio ambiente.
A seca severa que o Brasil enfrenta, a pior em 70 anos, reduziu a
capacidade das hidrelétricas, que respondem por 46% da capacidade de geração de
energia no país – incluindo a geração distribuída. Para compensar essa redução,
o sistema tem recorrido cada vez mais às usinas térmicas, cujo uso eleva os
custos da energia e aumenta as emissões de gases de efeito estufa.
Atualmente, o horário de maior demanda no Brasil é entre 19h e 20h,
seguido de um segundo pico entre 14h e 15h, impulsionado pelas indústrias,
segundo especialista de estudos de mercado e preços de energia da Thymos
Energia, Pedro Moro. Ele avalia que a mudança para o horário de verão já não se
trata de mudar o modo de consumo como antigamente, mas sim de ajustar a
geração. “A energia solar vai gerar uma hora a mais todos os dias, e perder uma
hora a menos no começo do dia, quando não é tão necessária. Para um consumidor
de Geração Distribuída, seria um benefício porque teria a geração na ponta. E
para o caso da inversão de fluxo, também é positivo pois reduz a diferença
entre o consumo residencial e a geração solar.
A possível volta de um horário de verão é benéfica para o setor elétrico
de forma geral, inclusive na centralizada”, afirma o executivo.
Em questão de custos, embora o retorno do horário de verão não vá reduzir diretamente o valor das tarifas para o consumidor, ele pode evitar apagões e diminuir a necessidade de acionamento das usinas térmicas, economizando cerca de R$ 400 milhões em custos operacionais. Essa economia pode aliviar o sistema elétrico em momentos críticos, especialmente durante os meses de maior risco de escassez de energia.
Caetano Mancini, meteorologista sênior da Tempo OK.
“Vemos para outubro e novembro um panorama que não é favorável para
chuva, em especial para as regiões Centro-Oeste e Sudeste. Devemos ter uma
melhora gradual a partir de dezembro, com uma possível ocorrência de La Niña, o
evento climático de resfriamento das águas do Oceano Pacífico Equatorial. É
preciso aproveitar a geração pelos próximos dois meses, pois além do tempo
úmido que se aproxima ter a chance de prejudicar a irradiação solar, existem
outros fatores imprevisíveis como a fumaça causada pelas queimadas. Em agosto,
a fumaça causou uma redução de 20% na irradiação solar, prejudicando a
geração”, disse o meteorologista Sênior da Tempo OK, Caetano Mancini, à pv
magazine.
Mancini ainda afirma que, tanto sob o ponto de vista meteorológico quanto energético, o horário de verão faz sentido. Segundo o meteorologista, a Geração Distribuída ajuda a não pressionar o reservatório ou acionar as termelétricas, o que é fundamental no cenário de tempo seco. “Hoje, a energia solar é uma matriz energética muito mais representativa do que em 2019, quando o horário de verão foi abolido. Isso tem uma contribuição enorme para o sistema, que poderia ter até mais 3 horas de sol com os dias escurecendo mais tarde”.
Fred Menezes, diretor-executivo da Armor Energia.
Já para Fred Menezes, diretor-executivo da Armor Energia,
comercializadora de energia e hub de negócios com foco no Mercado Livre, o
custo da energia também segue em alta devido ao tempo seco, com o Preço de
Liquidação das Diferenças (PLD) chegando a R$ 500 em outubro. “O cenário atual
é difícil de prever, tudo o que precisa acontecer é chover no período úmido para
que não se fale mais em crise energética. Mas enquanto isso não acontecer, os
preços continuarão crescendo”, comenta.
Menezes reforça o quanto e energia solar é relevante para o sistema interligado fora do horário de verão, e com o retorno da medida, seria ainda mais impactante: “Se não tivéssemos a energia solar para segurar esses momentos de alta temperatura, teríamos que suprir essa demanda com os reservatórios e as térmicas caras. Falando em horário de verão, o benefício da energia solar é ainda maior. Ela é capaz de segurar o horário de pico da tarde, e quando o sol começa a se pôr é justamente quando a atividade das pessoas começa a diminuir. O horário de verão é, com certeza, um mecanismo que gera um conforto para o sistema interligado neste momento de alta temperatura e grande demanda de energia”, garante o executivo.
Impacto de térmicas sendo acionadas para suprir esse pico, conforme demonstra no gráfico de preços do Custo Marginal de Operação (CMO).
Demanda da energia pelas horas do dia.
Assim, o debate sobre o horário de verão deixa de ser um “Fla-Flu” sobre
tempo de sono, e se mostra relevante como uma folga ao setor elétrico, além de
aproveitar ao máximo a geração de energia solar. Seu retorno, aliado a solar,
poderá fortalecer a resiliência do sistema diante de um cenário climático e
energético cada vez mais desafiador e imprevisível.
A Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) afirmou à pv magazine que “reconhece que o horário de verão pode ajudar a aproveitar melhor a energia solar, fonte limpa, competitiva e renovável, ao deslocar parte do consumo de eletricidade para horários com mais incidência solar. Isso pode reduzir a pressão sobre o sistema eletroenergético nos horários de maior demanda, trazendo benefícios para o setor e para a população. No entanto, entendemos que é fundamental que o governo e as autoridades competentes analisem cuidadosamente os impactos dessa medida, levando em consideração dados precisos sobre economia de energia e o efeito real no sistema eletroenergético. A decisão deve ser baseada em estudos claros, que avaliem tanto os benefícios quanto os desafios”.
A associação também se colocou à disposição do governo para colaborar na construção de soluções que contribuam para o crescimento sustentável da energia solar no Brasil. (pv-magazine-brasil)
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