A desaceleração dos negócios
nucleares nas últimas duas décadas tem relação direta com a diminuição da
competitividade econômica do setor, do perigo incomensurável que representa
para a vida no planeta a liberação de material radioativo das usinas nucleares,
e o problema ainda não resolvido de armazenamento dos resíduos produzidos (lixo
atômico), altamente tóxicos, e cuja radioatividade perdura por milhares de
anos.
Algumas das desvantagens de
se adotar uma tecnologia no mínimo polêmica, e desnecessária ao país para
produzir energia elétrica.
O pós-Fukushima levou países
pertencentes à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), como a Itália, Bélgica, Suíça e Alemanha, a paralisar e mesmo
descomissionar dezenas de usinas nucleares que funcionavam em seus territórios.
Contrariamente a esta rejeição, governantes de países nada democráticos como
China, Rússia e Índia ainda insistem em apoiar a geração nucleoelétrica.
Quando uma tragédia nuclear
acontece, as consequências vão para muito além das pessoas. Toda a
biodiversidade local é prejudicada diretamente. Pessoas que nem mesmo moram
perto do local do desastre podem ser afetadas. Alguns trágicos eventos
aconteceram nas últimas 3 décadas. O de Three Mile Island/USA,
Chernobyl/Ucrânia e Fukushima/Japão. Este último provocou o deslocamento de
mais de 120.000 pessoas que tiveram que abandonar suas casas e deixar suas cidades.
Tais tragédias tiveram ampla repercussão mundial. Todavia, acidentes menores, mas não menos graves, acontecem com certa frequência, e não são divulgados. O mais recente evento foi o vazamento de 1,5 milhão de litros de água radioativa de uma usina nuclear na cidade de Monticello, estado de Minnesota-USA. Mesmo ocorrido em 22/11/2022, somente 5 meses depois foi comunicado à opinião pública. Sem contar o alerta dos inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica-AIEA em 15/03/2023, sobre o desaparecimento na Líbia, de 2,5 toneladas de urânio natural concentrado, também conhecido como yellow cake.
Para reagir e contrapor as preocupações da sociedade quanto à guarda de material radioativo, sua proliferação, e aspectos relacionados à segurança da geração nuclear; uma nova estratégia foi montada pelos defensores da tecnologia, e de seus negócios bilionários.
Um novo modelo de reator mais
compacto e com potência inferior (<300 MW) aos tradicionais, estão sendo
oferecidos pela indústria nuclear, podendo ser totalmente construídos em uma
fábrica e levado ao local de funcionamento. Vários modelos estão em
desenvolvimento utilizando distintas rotas tecnológicas. Contudo os problemas
que ocorrem nos grandes reatores persistem.
Os Small Modular Reactors
(SMRs) ou Pequenos Reatores Modulares em inglês, é a nova tática adotada pelos
negócios nucleares, que assim esperam disseminar tais unidades por todo o
planeta. Nota-se que o termo nuclear foi omitido, no que deveria ser chamado de
Small Modular Nuclear Reactors (SMNRs), ou Pequenos Reatores Nucleares
Modulares. A omissão da palavra nuclear é uma tentativa de evitar a rejeição, a
repulsa da grande maioria da população mundial, que associa o nuclear com
morte, guerra, destruição, desgraça, bomba atômica.
No Brasil um lobby poderoso
reunido na Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades
Nucleares- ABDAN, agrega os apoiadores das usinas nucleares, propondo promover
o desenvolvimento e a aplicação da tecnologia nuclear no Brasil. Em sintonia, e
representando interesses das grandes multinacionais do ramo, com interesses em
fazer negócios, esta Associação tem obtido “avanços(?)” junto aos poucos que
decidem a política energética brasileira.
Por exemplo, conseguiram no governo do ex-ministro de Minas e Energia, o almirante Bento Albuquerque (o mesmo investigado por entrar ilegalmente no país com joias milionárias não declaradas, destinadas ao ex-presidente), a inclusão no Plano Nacional de Energia-2050 a instalação de 8 GW a 10 GW a partir da nucleoeletricidade.
Decisões sobre um tema tão polêmico e com grande repercussão para as gerações presentes e futuras mereceriam discussões, debates mais amplos e aprofundados com a sociedade. Esta discussão passa necessariamente em decidir que tipo de sociedade queremos. Se desejamos uma sociedade democrática, com justiça ambiental, defensora da paz; ou um país nuclearizado, inclusive possuindo artefatos nucleares, como a bomba tupiniquim, que certamente poderá ser viabilizada com novas instalações nucleares.
O que se espera em sociedades
democráticas é que as divergências devam ser tratadas pelo debate, discussões,
disponibilização de informações, participação popular. Todavia o terreno desta
disputa é muito desigual, pois o poder econômico dos lobistas é muito grande, o
que acaba contribuindo para uma assimetria no processo da disputa, na
divulgação das propostas, e das discussões sobre as consequências sociais,
econômicas, ambientais e tecnológicas, do uso da tecnologia nuclear para
produção de energia elétrica.
Todavia decisões monocráticas
de um colegiado, o Conselho Nacional de Política Energética – CNPE, tem
instituído uma política energética contrária aos interesses da maioria da
população. A principal característica deste colegiado, é a falta de
representatividade da sociedade organizada, além de um grande déficit de
transparência. A sociedade civil não participa das decisões tomadas.
O Ministério de Minas e
Energia- MME, também responsável pela política energética sofre há anos, um
processo de captura pelo mercado. Utilizado como “moeda de troca” pelos vários
governos, não passa de um ministério de 2º escalão, subserviente a grupos que
defendem somente seus interesses particulares, e/ou de grandes empresas. Do
ponto de vista técnico foi completamente esvaziado.
Outra instituição, com grandes poderes decisórios, é a Agência Nacional de Energia Elétrica-ANEEL. É comum que membros desta agência reguladora tenham seus diretores envolvidos em polêmicas, denúncias gerando grande desconfiança junto à sociedade. O escândalo mais recente é de um ex-diretor escolhido pelo novo governo secretário executivo do MME, o número dois do ministério, envolvido em vários casos obscuros e ainda não explicados, enquanto era diretor da ANEEL (https://piaui.folha.uol.com.br/cheiro-de-enxofre/).
Existe um clamor da sociedade brasileira de participação social, de uma maior transparência nas políticas públicas. E porque não na área energética? Neste caso é fundamental a criação de espaços democráticos igualitários, de interlocução, de participação cidadã, na formulação e tomada de decisão. Ações no sentido de promover o engajamento da sociedade, para defender seus interesses junto ao Estado brasileiro, fortalecem e garantem nossa democracia. (ecodebate)
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