Estimativas conservadoras da entidade apontam para uma contratação de 20
GW já no final desta década.
Em seis
anos o setor de geração eólica passou de uma simples coadjuvante na matriz
elétrica nacional para se tornar a principal fonte de contratação em leilões.
Tanto que a perspectiva para os próximos cinco anos é de passar fontes
tradicionais como a térmica em participação na capacidade instalada no país e
ficar atrás apenas da geração hidrelétrica. Segundo a presidente executiva da
ABEEólica, Élbia Melo, que participou do Brazil Wind Power 2014, entre os dias
26 e 28 de agosto de 2014, no Rio de Janeiro, em 2020, o Brasil deverá alcançar
a marca de 20 GW dessa fonte. Isso porque o segmento está passando do
momento de consolidação para o da sustentabilidade. Ela aponta que as autoridades
perceberam isso.
Contudo,
como todas as fontes, a eólica possui seus gargalos e desafios. A transmissão e
o crescimento no mercado livre são os principais pontos a serem desenvolvidos
por aqui. Até porque no país já há uma verdadeira indústria que levará o Brasil
a se tornar um polo de exportação.
Veja a seguir os principais trechos da
entrevista:
Qual é o momento que o setor vive hoje no país?
Élbia Melo: O setor eólico vive momento de consolidação indo já
para a chamada sustentabilidade de longo prazo. Esse momento é de
consolidação porque toda aquela discussão da eólica na matriz elétrica e o
potencial que teria foi superada. A fonte demonstrou ao longo dos últimos três
anos que é de fato competitiva e de potencial enorme no país. Nesse ano ficou
claro que a eólica contribui com a matriz, para a geração de energia e
acrescenta à necessidade de energia em momentos de escassez hidrelétrica
como temos visto atualmente. E tudo isso está sendo compreendido
pelos policy makers, que demoraram um pouco para ter essa
compreensão, de que se pode contar com a eólica e colocar na matriz como uma
fonte confiável e que guarda água nos reservatórios e que contribui com o país
em momentos em que mais se precisa de outras fontes de energia.
Além
disso, traz grande desenvolvimento para as regiões com os efeitos das
externalidades positivas nas regiões onde estão os parques, mostrando um fator
que não se esperava e que surpreendeu fortemente, principalmente no semi árido.
Um terceiro ponto é a cadeia produtiva. O país, de fato, está desenvolvendo uma
cadeia de fabricantes e com a perspectiva futura de exportação para a América
Latina e África do Sul. A fonte contribui para a geração de energia reduzindo a
emissão de CO2 e redução de custo de térmicas ao passo que temos
mais capacidade instalada e mostramos como essa fonte é importante para o país.
De 2004 para cá foi a segunda fonte mais contratada, é a segunda mais
competitiva. E a segunda mais contratada do país. Em quanto tempo podemos esperar esse fato?
Élbia Melo: De tudo que contratamos até agora em leilões a
previsão é de encerrar 2018 com 14,2 GW, isso representa de 8% a 9 % matriz.
Essa é a foto do momento, não podemos esquecer que temos leilão todos os
anos. Temos um número que é até conservador de que com isso, em 2020, teremos
20 GW de eólica, elevando a participação a algo entre 12% e 13% da matriz
elétrica nacional. Atualmente essa colocação é das térmicas com 10% e biomassa
em terceiro com 9%. Mas, considerando que não há gás e não haverá até lá para
crescer, não há dúvidas que em 2020 seremos a segunda fonte em termos de
participação na matriz elétrica nacional.
Depois de um ano de recorde de contratação da fonte
em 2013 quais são os desafios que os agentes do setor têm a enfrentar?
Élbia Melo: Os 4,7 GW foram espetaculares, mas não esperamos que
esse número se repetirá. Sem dúvida teremos grandes contratações nos
próximos anos, mas em 2013 foi para recuperar 2012. Mas independente disso
continuaremos com um patamar de 2,3 GW ao ano no mínimo, também uma expectativa
conservadora. Em termos de desafios ainda são muitos até porque estamos
crescendo muito rápido e exponencialmente. Há desafios e gargalos
regulatórios o principal é a transmissão. A despeito de se ter resolvido essa
questão para aqueles parques parados que estão entrando em operação comercial,
e até por isso se mudou o modelo de contratação, a transmissão ainda é um
gargalo. Foi estabelecido pela política energética que a transmissão deve ser
contratada antes dos parques, mas esse modelo tem que de fato começar a
acontecer.
A
transmissão deve ter tratamento simétrico para o ACR e ACL porque hoje há
prioridade para o regulado. Existe todo um mercado o livre quer crescer, com
sede de contratação e não pode, porque não tem a garantia da
transmissão. Em segundo lugar, há o desafio da logística de transporte de
equipamentos. O país se tornou uma fábrica de equipamentos, temos pás de até 60
metros, aerogeradores que precisam ser transportados como cargas especiais e
como somos um país que utiliza a estrada como meio de transporte há grande
problema. Falta eficiência para o transporte em navios e transporte de
cabotagem, esses são grandes desafios para o transporte. Melhorar a regulação
do transporte e melhorar a qualidade das estradas.
Em leilões a energia eólica já mostrou que é
competitiva mas ainda há dúvidas quanto a viabilidade da fonte para o mercado
livre. Como essa questão avançou este ano e há perspectivas para que a fonte
alcance de forma definitiva o ACR?
Élbia Melo: O desafio no mercado livre não é diferente das demais
fontes. Os projetos novos voltados para esse segmento têm característica
importante: os compradores de energia não fazem contratos de longo prazo,
preferem o curto prazo. Isso porque ele é o dono de indústria que não quer
se expor às incertezas da economia e ficar contratado em energia mas não ter a
demanda por seu produto. Pelo outro lado, o vendedor precisa de PPAs de longo
prazo para conseguir o financiamento no BNDES. Para qualquer fonte é assim.
Esse é um nó de difícil solução e que tentamos desatar há dez, quinze anos.
Estamos estudando em parceria com a Abraceel um modelo de contrato que possam
ser substituíveis. Nesse modelo você entrega um contrato de cinco anos e ali
pelo quarto ano começa a substituí-lo por outro, é como se fosse um swap de
contratos como garantia aos bancos. Além disso, um mecanismo de seguro para a
sazonalidade da eólica com uma seguradora.
Existe
demanda grande do mercado livre para a eólica e hoje não temos o modelo
adequado de financiamento. Mas precisamos ter ainda ideia de sinal de
investimentos de longo prazo, uma perspectiva de longo prazo. Acontece no
Brasil todo e não somente com o setor eólico, precisamos de um sinal
macroeconômico, de um planejamento mais próximo da realidade e que dê
sinal mais claro em termos de política energética. O modelo do setor coloca
como tripé a segurança de fornecimento, a modicidade tarifária e estabilidade
de regras. Contudo, a forma de perseguir esses objetivos tem variado muito.
Isso traz insegurança ao mercado que não sabe que parte do modelo que o governo
perseguirá em um determinado momento.
A CCEE informou que entre janeiro e junho de 2014 a
capacidade instalada dos parques eólicos no Brasil apresentou um acréscimo de
1.207 MW e alcançou 3.388 MW, o que representa uma expansão de 55,3%. Quais são
as perspectivas de crescimento e de competitividade do setor?
Élbia Melo: Existem fatores que determinam a
competitividade e a energia eólica é relativamente nova em termos de sua
viabilidade econômica. Não tem mais de 20 anos. A tecnologia eólica ainda
não alcançou o limite de desenvolvimento e continuará a evoluir no longo prazo.
Outro fator é estrutural, a vantagem natural do Brasil, é a natureza dos ventos
que temos, que é imutável. Temos 36% de fator de capacidade e isso com os
parques do Proinfa. Se olharmos apenas os novos que estão instalados no País
chegamos a 40% com as novas tecnologias. Fara efeito de comparação, na China,
um dos grandes geradores de energia eólica, o fator é de 18%. Há os fatores
conjunturais que melhoram e pioram e que estão ligados à economia e não podem
ser controlados pelos agentes. Mas do ponto de vista da energia eólica o que
nos deixa em posição confortável é que o Brasil tem potencial de 350 GWonshore,
três vezes o que temos instalados em nossa matriz elétrica. Portanto, do
ponto de vista da oferta estamos tranquilos.
Você esteve na moderação do painel
fabricantes/fornecedores do BWP, este foi um dos pilares para o desenvolvimento
do mercado nacional eólico. Nesse painel discutiu-se questões políticas atuais,
o futuro do Brasil como uma indústria eólica, suas estratégias de expansão,
conteúdo local e a possibilidade de se tornar um hub exportador. Em sua visão,
esses assuntos já estão equacionados?
Élbia Melo: Não. Não estamos com tudo equacionados mas, diria que
estamos próximos de equacionar. Fizemos um estudo recente sobre o
estágio das cadeias de componentes, tivemos reuniões com a Abimaq e
teremos mais encontros com o BNDES. A despeito do prazo muito curto das regras
para o Finame, a indústria está se virando para desenvolver a cadeia produtiva.
Temos os gargalos e desafios e estamos avançando a uma velocidade que
surpreende, não acreditávamos que pudesse se desenvolver assim. Mas, a
cadeia precisa atrair mais fornecedores de componentes. Por exemplo, as flanges
e forjados, que são mais pesados. Hoje temos fabricantes, mas a capacidade de
produção não atende a necessidade. Há aumento de custo nesses equipamentos com
o chamado custo Brasil, estamos produzindo mais caro, mas quando BNDES colocou
essa regra do Finame sabia disso. Mas em contrapartida a esse custo mais
elevado vamos trazer P&D, inovação e geração de empregos para ao Brasil, é
um trade off. (gasnet)
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