domingo, 12 de outubro de 2014

Eólica será a segunda fonte na matriz elétrica em 2020

Estimativas conservadoras da entidade apontam para uma contratação de 20 GW já no final desta década.
Em seis anos o setor de geração eólica passou de uma simples coadjuvante na matriz elétrica nacional para se tornar a principal fonte de contratação em leilões. Tanto que a perspectiva para os próximos cinco anos é de passar fontes tradicionais como a térmica em participação na capacidade instalada no país e ficar atrás apenas da geração hidrelétrica. Segundo a presidente executiva da ABEEólica, Élbia Melo, que participou do Brazil Wind Power 2014, entre os dias 26 e 28 de agosto de 2014, no Rio de Janeiro, em 2020, o Brasil deverá alcançar a marca de 20 GW dessa fonte. Isso porque o segmento está passando do momento de consolidação para o da sustentabilidade. Ela aponta que as autoridades perceberam isso.
Contudo, como todas as fontes, a eólica possui seus gargalos e desafios. A transmissão e o crescimento no mercado livre são os principais pontos a serem desenvolvidos por aqui. Até porque no país já há uma verdadeira indústria que levará o Brasil a se tornar um polo de exportação.
Veja a seguir os principais trechos da entrevista:
Qual é o momento que o setor vive hoje no país?
Élbia Melo: O setor eólico vive momento de consolidação indo já para a chamada sustentabilidade de longo prazo. Esse momento é de consolidação porque toda aquela discussão da eólica na matriz elétrica e o potencial que teria foi superada. A fonte demonstrou ao longo dos últimos três anos que é de fato competitiva e de potencial enorme no país. Nesse ano ficou claro que a eólica contribui com a matriz, para a geração de energia e acrescenta à necessidade de energia em momentos de escassez hidrelétrica como temos visto atualmente. E tudo isso está sendo compreendido pelos policy makers, que demoraram um pouco para ter essa compreensão, de que se pode contar com a eólica e colocar na matriz como uma fonte confiável e que guarda água nos reservatórios e que contribui com o país em momentos em que mais se precisa de outras fontes de energia.
Além disso, traz grande desenvolvimento para as regiões com os efeitos das externalidades positivas nas regiões onde estão os parques, mostrando um fator que não se esperava e que surpreendeu fortemente, principalmente no semi árido. Um terceiro ponto é a cadeia produtiva. O país, de fato, está desenvolvendo uma cadeia de fabricantes e com a perspectiva futura de exportação para a América Latina e África do Sul. A fonte contribui para a geração de energia reduzindo a emissão de CO2 e redução de custo de térmicas ao passo que temos mais capacidade instalada e mostramos como essa fonte é importante para o país. De 2004 para cá foi a segunda fonte mais contratada, é a segunda mais competitiva. E a segunda mais contratada do país. Em quanto tempo podemos esperar esse fato?
Élbia Melo: De tudo que contratamos até agora em leilões a previsão é de encerrar 2018 com 14,2 GW, isso representa de 8% a 9 % matriz. Essa é a foto do momento, não podemos esquecer que  temos leilão todos os anos. Temos um número que é até conservador de que com isso, em 2020, teremos 20 GW de eólica, elevando a participação a algo entre 12% e 13% da matriz elétrica nacional. Atualmente essa colocação é das térmicas com 10% e biomassa em terceiro com 9%. Mas, considerando que não há gás e não haverá até lá para crescer, não há dúvidas que em 2020 seremos a segunda fonte em termos de participação na matriz elétrica nacional.
Depois de um ano de recorde de contratação da fonte em 2013 quais são os desafios que os agentes do setor têm a enfrentar?
Élbia Melo: Os 4,7 GW foram espetaculares, mas não esperamos que esse número se repetirá. Sem dúvida teremos grandes contratações nos próximos anos, mas em 2013 foi para recuperar 2012. Mas independente disso continuaremos com um patamar de 2,3 GW ao ano no mínimo, também uma expectativa conservadora. Em termos de desafios ainda são muitos até porque estamos crescendo muito rápido e exponencialmente. Há desafios e gargalos regulatórios o principal é a transmissão. A despeito de se ter resolvido essa questão para aqueles parques parados que estão entrando em operação comercial, e até por isso se mudou o modelo de contratação, a transmissão ainda é um gargalo. Foi estabelecido pela política energética que a transmissão deve ser contratada antes dos parques, mas esse modelo tem que de fato começar a acontecer.
A transmissão deve ter tratamento simétrico para o ACR e ACL porque hoje há prioridade para o regulado. Existe todo um mercado o livre quer crescer, com sede de contratação e não pode, porque não tem a garantia da transmissão. Em segundo lugar, há o desafio da logística de transporte de equipamentos. O país se tornou uma fábrica de equipamentos, temos pás de até 60 metros, aerogeradores que precisam ser transportados como cargas especiais e como somos um país que utiliza a estrada como meio de transporte há grande problema. Falta eficiência para o transporte em navios e transporte de cabotagem, esses são grandes desafios para o transporte. Melhorar a regulação do transporte e melhorar a qualidade das estradas.
Em leilões a energia eólica já mostrou que é competitiva mas ainda há dúvidas quanto a viabilidade da fonte para o mercado livre. Como essa questão avançou este ano e há perspectivas para que a fonte alcance de forma definitiva o ACR?
Élbia Melo: O desafio no mercado livre não é diferente das demais fontes. Os projetos novos voltados para esse segmento têm característica importante: os compradores de energia não fazem contratos de longo prazo, preferem o curto prazo. Isso porque ele é o dono de indústria que não quer se expor às incertezas da economia e ficar contratado em energia mas não ter a demanda por seu produto. Pelo outro lado, o vendedor precisa de PPAs de longo prazo para conseguir o financiamento no BNDES. Para qualquer fonte é assim. Esse é um nó de difícil solução e que tentamos desatar há dez, quinze anos. Estamos estudando em parceria com a Abraceel um modelo de contrato que possam ser substituíveis. Nesse modelo você entrega um contrato de cinco anos e ali pelo quarto ano começa a substituí-lo por outro, é como se fosse um swap de contratos como garantia aos bancos. Além disso, um mecanismo de seguro para a sazonalidade da eólica com uma seguradora.
Existe demanda grande do mercado livre para a eólica e hoje não temos o modelo adequado de financiamento. Mas precisamos ter ainda ideia de sinal de investimentos de longo prazo, uma perspectiva de longo prazo. Acontece no Brasil todo e não somente com o setor eólico, precisamos de um sinal macroeconômico, de um planejamento mais próximo da realidade e que dê sinal mais claro em termos de política energética. O modelo do setor coloca como tripé a segurança de fornecimento, a modicidade tarifária e estabilidade de regras. Contudo, a forma de perseguir esses objetivos tem variado muito. Isso traz insegurança ao mercado que não sabe que parte do modelo que o governo perseguirá em um determinado momento.
A CCEE informou que entre janeiro e junho de 2014 a capacidade instalada dos parques eólicos no Brasil apresentou um acréscimo de 1.207 MW e alcançou 3.388 MW, o que representa uma expansão de 55,3%. Quais são as perspectivas de crescimento e de competitividade do setor?
Élbia Melo: Existem fatores que determinam a competitividade e a energia eólica é relativamente nova em termos de sua viabilidade econômica. Não tem mais de 20 anos. A  tecnologia eólica ainda não alcançou o limite de desenvolvimento e continuará a evoluir no longo prazo. Outro fator é estrutural, a vantagem natural do Brasil, é a natureza dos ventos que temos, que é imutável. Temos 36% de fator de capacidade e isso com os parques do Proinfa. Se olharmos apenas os novos que estão instalados no País chegamos a 40% com as novas tecnologias. Fara efeito de comparação, na China, um dos grandes geradores de energia eólica, o fator é de 18%. Há os fatores conjunturais que melhoram e pioram e que estão ligados à economia e não podem ser controlados pelos agentes. Mas do ponto de vista da energia eólica o que nos deixa em posição confortável é que o Brasil tem potencial de 350 GWonshore,  três vezes o que temos instalados em nossa matriz elétrica. Portanto, do ponto de vista da oferta estamos tranquilos.
Você esteve na moderação do painel fabricantes/fornecedores do BWP, este foi um dos pilares para o desenvolvimento do mercado nacional eólico. Nesse painel discutiu-se questões políticas atuais, o futuro do Brasil como uma indústria eólica, suas estratégias de expansão, conteúdo local e a possibilidade de se tornar um hub exportador. Em sua visão, esses assuntos já estão equacionados?
Élbia Melo: Não. Não estamos com tudo equacionados mas, diria que estamos próximos de equacionar. Fizemos um estudo recente sobre o estágio das cadeias de componentes, tivemos reuniões com a Abimaq e teremos mais encontros com o BNDES. A despeito do prazo muito curto das regras para o Finame, a indústria está se virando para desenvolver a cadeia produtiva. Temos os gargalos e desafios e estamos avançando a uma velocidade que surpreende, não acreditávamos que pudesse se desenvolver assim. Mas, a cadeia precisa atrair mais fornecedores de componentes. Por exemplo, as flanges e forjados, que são mais pesados. Hoje temos fabricantes, mas a capacidade de produção não atende a necessidade. Há aumento de custo nesses equipamentos com o chamado custo Brasil, estamos produzindo mais caro, mas quando BNDES colocou essa regra do Finame sabia disso. Mas em contrapartida a esse custo mais elevado vamos trazer P&D, inovação e geração de empregos para ao Brasil, é um trade off. (gasnet)

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