O carvão é cada vez
menos utilizado nos Estados Unidos para a geração de energia
Usina
termelétrica a carvão
O fim da era do
carvão: ”Agora a Terra volta a respirar” – A agência norte-americana EIA
anunciou que apenas 36% das necessidades energéticas do país são cobertas por
fontes poluentes. Em comparação ao ano anterior, registrou-se uma queda de 20
pontos percentuais. Mérito da mobilização dos cidadãos. O objetivo é acabar com
a utilização em todo o mundo até 2030.
A análise é de Mark
Hertsgaard (www.markhertsgaard.com), membro
da New America Foundation de Washington, nos EUA, e correspondente para o meio
ambiente do jornal The Nation.
Eis o texto.
O carvão é cada vez
menos utilizado nos Estados Unidos, e essa é uma excelente notícia para o clima
da Terra. A Energy Information Administration (EIA, agência do governo dos EUA
especializada em análises energéticas) anunciou que, no primeiro quadrimestre
de 2012, apenas 36% das necessidades energéticas globais dos EUA foram obtidas
do carvão, o tradicional combustível fóssil mais poluente em termos absolutos e
que produz a maior quantidade de dióxido de carbono.
É como dizer que, em
comparação com o ano anterior, registrou-se uma impressionante redução de 20
pontos percentuais. A EIA prevê uma nova queda até o fim do ano, deixando
entender claramente que, para o carvão – que durante muitas décadas forneceu a
imensa maioria da energia nos EUA –, prospecta-se uma histórica suspensão.
Ainda mais
encorajador é o fato – em grande parte desconhecido – que está por trás dessa
considerável redução na utilização do carvão. À cobertura dos principais meios
de comunicação vai o mérito de ter feito reduzir o preço do gás natural (o
principal concorrente do carvão), e também ao anúncio do dia 27 de março, por
parte do governo Obama, de estabelecer limites mais rígidos para as emissões de
gases de efeito estufa produzidos pelas usinas norte-americanas. Certamente,
esses dois fatores desempenharam um papel importante.
Igualmente
fundamental foi um terceiro fator: a tenaz rebelião que teve início a partir de
baixo, justamente da população, que freou a construção já programada de pelo menos
166 usinas energéticas alimentadas a carvão. Os ativistas foram ajudados: o
preço do gás natural em diminuição e o declínio generalizado da demanda por
eletricidade devido à crise financeira tornaram o carvão em uma escolha
questionável.
Em todo caso, foi o
ativismo da base que transformou essa criticidade em uma derrota para todos os
efeitos: a afirmação é de Thomas Sanzillo, ex-vice-controlador do governo do
Estado de Nova York, que colaborou com a Beyond Coal. “Se os ativistas não
tivessem intervindo para falar com os reguladores do governo e com as redações
dos jornais, continuando a defender que o carvão seria uma péssima escolha, a
construção das usinas continuaria”.
Diferentemente da
atividade de lobby dos principais grupos ambientalistas dominantes que exercem
pressão sobre o Capitol Hill pela “cap-and-trade” (programa de redução das
emissões), o ponto de força do movimento Beyond Coal deve ser buscado no
trabalho não alardeado de políticos do varejo: ativistas que falam com os
vizinhos e os amigos, que perseguem a mídia local, que lotam as salas de
audiências onde se fala de normativas, que protestam antes da aprovação das
leis estatais, que apresentam exposições legais e assim por diante.
Além disso, o
movimento que lutou contra a utilização do carvão não é formado pelos suspeitos
de sempre: além dos ambientalistas, dele fazem parte aqueles que lutam pela
energia limpa, profissionais da saúde, líderes comunitários, expoentes
religiosos, agricultores, advogados, estudantes e voluntários como Verena Owen,
uma jovem do Illinois que provou ser tão capaz a ponto de ser contratada para
ajudar Mary Anne Hitt, diretora da campanha Beyond Coal.
Os benefícios para a
saúde são imensos: “Todos os anos, as usinas movidas a carvão provocam mais de
200 mil ataques de asma no país, muitos dos quais em crianças”, dissera em
julho de 2011 o prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, referindo-se aos
dados da Agência de Proteção do Meio Ambiente dos EUA. E acrescentara que “a
poluição por carvão mata todos os anos 13 mil norte-americanos e nos custa
centenas de bilhões de dólares pelos tratamentos médicos”.
Isso ajuda a explicar
por que o prefeito bilionário de Nova York se comprometeu a doar 50 milhões de
dólares do seu próprio bolso para apoiar a próxima fase da missão da Beyond
Coal, que, além de deter a construção de novas usinas já programadas, passará a
tentar fechar as já existentes, para substituí-las por outras de energia limpa.
“O nosso objetivo é fechar um terço das usinas a carvão existentes em todos os
EUA (cerca de 500) até 2015 e acabar com a utilização de carvão em todo o mundo
até 2030″, diz Bruce Niller, diretor sênior da campanha Beyond Coal junto ao
Sierra Club, que hospeda a organização.
Esse resultado,
porém, que marca uma reviravolta epocal na luta contra o aquecimento do clima
continua sendo ignorado, não apenas fora dos EUA, mas também por boa parte dos
próprios norte-americanos. Por quê? Principalmente porque a mídia e classe
política norte-americana avaliam as questões de utilidade pública através dos
olhos da Washington oficial. Ali, a opinião prevalecente era de que a lei
“cap-and-trade” era o limite absoluto aceitável pelo sistema político
norte-americano. Mesmo quando essa opção presumivelmente realista foi rejeitada
em 2010, muitos observadores – incluindo alguns ambientalistas – chegaram à
conclusão de que os EUA eram incapazes de passar para a ação de forma
significativa. As grandes corporações poluidoras eram muito fortes, enquanto a
opinião pública estava muito confusa e indiferente.
Segundo a Beyond
Coal, não é assim: “Essa campanha demonstrou que podemos agir de Estado em
Estado, de central em central, de cidade em cidade”, defende Hitt. A campanha
organizou a população dos ativistas em nível local em torno de objetivos
concretos e tangíveis: o seu ar, a sua água, o clima que os seus filhos
herdariam. Ela se absteve de lançar mensagens vagas, preferindo apoiar uma
única demanda clara – “No New Coal”.
Em essência, assim
como o movimento Occupy Wall Street, a campanha Beyong Coal demonstrou que o
status quo não pode tudo e que, quando um grande número de pessoas se coaliza,
dando origem a um poder político de nível local, elas realmente podem mudar o
mundo. E talvez até o planeta. (EcoDebate)
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