Chuva e seca, eleitoras
Demorou, mas hoje petistas e
tucanos depositam a mesma esperança – e fé – numa mesma pessoa: São Pedro.
Todos, unidos, rezando pela chuva.
Um racionamento de água em São
Paulo, Estado dominado pela PSDB, seria um desastre não apenas para o
governador Geraldo Alckmin, candidato à reeleição, mas para as pretensões
nacionais de Aécio Neves.
Reparem a importância da coisa. Nas
últimas presidenciais, o PT, com Lula e Dilma, ganhou fácil em Minas e ali
acumulou boa vantagem. Em compensação, o PSDB ganhou direto em São Paulo, com
FHC, Serra e Alckmin. Neste ano, Aécio vai dar uma lavada em Minas. Se os
tucanos mantiverem a vantagem em São Paulo, a coisa fica boa para eles.
Ou seja, a chuva na Cantareira,
principal reserva de água da região metropolitana de São Paulo, é um fator eleitoral
crucial.
Do mesmo modo, se Dilma for
obrigada a promover um racionamento de energia elétrica, cairá nos
reservatórios secos um dos seus discursos mais fortes: o de criadora e gerente
de um novo e eficiente setor elétrico. Aquela que reduziu as tarifas.
A coisa é tão dramática para os
dois lados que, com algum realismo político – cinismo, vá lá – PT e PSDB
poderiam fechar um negócio: um raciona a energia, outro a água paulista, e
todos colocam a culpa em São Pedro.
Assim: sabe, o sistema físico é bom
nos dois casos, mas o que se pode fazer contra as forças divinas? Ou, para os
não crentes, o que se pode fazer diante de uma aberrante alteração climática?
Aliás, viajando mais um pouco, os dois lados poderiam anunciar algumas medidas
ambientalistas.
As duas providências – os
racionamentos e as políticas ambientais – seriam do interesse da Nação.
Técnicos do setor, informalmente, se não em público, dizem que, nas
circunstâncias meteorológicas atuais, já seria ao caso de ao menos ter
preparado e anunciado tanto o racionamento de energia quanto o de água. No
mínimo, um consumo seletivo deveria estar em curso. Por exemplo: restrições
negociadas com os maiores consumidores.
Seria um caso em que interesses de
dois partidos divergentes coincidiriam entre si e com os do país – que,
certamente, não precisa de um racionamento descontrolado de água em São Paulo e
de energia em alguns estados.
Verdade que há aí um desequilíbrio
político. O racionamento de água seria estadual. O de energia, nacional. Por
outro lado, também é verdade que um desastre em São Paulo, maior colégio
eleitoral, não seria um fato apenas estadual. Tudo considerado, tucanos
poderiam oferecer alguma compensação aos petistas – tipo parar de colocar fogo
na briga PMDB/Dilma ou esquecer a investigação sobre a Petrobras.
Enfim, jeito tem, na brincadeira ou
a sério.
Mas isso fica mais para especulação
divertida porque o clima de divisão do país está mais pesado que a seca. Os
dois lados continuam rezando para São Pedro, mas com pedidos trocados: que chova
nos meus reservatórios, mas não nos deles.
Com duplo racionamento, Campos poderá aparecer na TV com Marina, ela
falando: “eu não dizia?” E Campos: “pois agora vamos fazer”
Sem negócio, ficamos assim: se
houver duplo racionamento, talvez os prejuízos partidários se equilibrem. E
parece ser esta a expectativa comum, não confessada, de cada lado: se a seca
determinar um duplo racionamento, dá empate no desastre; se chover e acabar o
problema, empate de novo, no alívio. Só haverá prejuízo partidário individual
se apenas um lado for obrigado a fazer o racionamento.
Para o país, é claro, o melhor
seria o empate no alívio. Para o PSDB, um apagão cairia como benção dos céus.
Para o PT, a falta de água em São Paulo poderia ser o golpe final no reinado
tucano e nas pretensões de Aécio.
Não parece que essa seja uma
estratégia pensada e montada por cada partido. Na verdade, os dois estão agindo
mais no improviso, na torcida e no medo – o que fala mal a respeito dos dois.
E por falar nisso, o governador
Eduardo Campos observa tudo de um cenário privilegiado: ele não terá culpa de
nada. Se houver duplo racionamento, ele poderá reforçar seu discurso de
administrador mais eficiente e com olhos no futuro, contra os dois adversários.
Sem contar que terá a seu lado Marina Silva, que deixou o PT e o governo Lula
porque não topavam suas políticas ambientais. Campos poderá aparecer na tevê,
ao lado dela, ouvindo da vice: eu não dizia? E Campos: pois agora vamos fazer.
Assim, eis o caderno de questões:
a) a falta de chuva e um racionamento
duplo derrubam Dilma e Aécio;
b) chuvas boas, mas localizadas,
derrubam uma ou outro;
c) chuvas para todos deixam o
cenário como está.
Eduardo Campos ganha na primeira e
na segunda, fica na mesma na terceira.
Engraçado, não? Há muito mais que água
nesse clima. (veja)
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