Para economizar, Japão retoma energia nuclear
Apesar de protestos, governo quer reduzir custo para empresas e
consumidores.
A tragédia de Fukushima, em março de 2011, é revivida pelos
japoneses desde o momento em que ligam um interruptor a cada manhã. O temor de
um novo vazamento de material nuclear tornou-se viral e foi capturado pela
oposição ao governo de Shinzo Abe. Quando a conta de eletricidade chega às
residências e às empresas, o valor a ser pago causa outro tipo de assombro.
Yusuke Suzuki, economista-chefe do Mitsui Global Strategic Studies Institute,
paga US$ 300 mensais pelo consumo na casa que divide apenas com sua mulher, em
Tóquio. No verão, com o ar condicionado ligado algumas horas ao dia, a conta
vai a US$ 450.
Manifestação contra a retomada da energia nuclear.
O fechamento das 54 usinas nucleares do Japão depois da
tragédia de 2011 criou um dos piores gargalos ao plano de Shinzo Abe para
estimular o crescimento econômico. Etsuro Honda, assessor especial para
assuntos econômicos do gabinete japonês e braço direito de Abe, afirmou ao
Estado que o governo vai analisar cada usina e, a partir de meados deste ano,
liberará as que sejam comprovadamente seguras. O alívio será quase imediato nos
orçamentos de famílias e de empresas, nas contas externas e nos planos de
investimento.
Segundo Suzuki, as 54 usinas respondiam pela geração de 25%
a 30% da energia consumida no país. Essa parcela foi substituída por térmicas a
petróleo, carvão e gás natural. A importação desses recursos – inclusive do
Irã, com devida permissão internacional – reverteu o saldo comercial do país.
Se foi positivo em 8,7 trilhões de ienes na média de 2000 a
2011, passou para negativo em 5,8 trilhões de iene em 2012. Para 2013, o Bank
of Tokyo-Mitsubishi estima déficit de 9,4 trilhões de ienes. O saldo em
transações correntes deverá ser de 6,2 trilhões de ienes no período, graças à
repatriação de 17,8 trilhões de ienes em lucros de subsidiárias de companhias
japonesas no exterior.
Viés político
"Há uma vastidão de argumentos para religar a maioria
das 54 usinas, mas essa questão assumiu um viés político", disse Suzuki,
referindo-se à captura da controvérsia nuclear pela oposição e setores
políticos aliados ao governo. "Se elas não forem reativadas, aumentará
mais o custo da energia, e a indústria perderá competitividade. Será inevitável
reativá-las."
A Federação Empresarial do Japão (Keidanren) espera o rápido
retorno das usinas, desde que a segurança esteja comprovada e a população local
aceite a decisão. Mas não vê possibilidade de isso acontecer em curto prazo por
causa das pressões políticas. Um dos líderes contrários à reativação dessas
plantas é o ex-primeiro-ministro Junishiro Koizumi, do mesmo Partido Liberal
Democrata de Abe. Koizumi apoiou os candidatos de oposição contrários às usinas
nucleares na eleição para o governo de Tóquio, em fevereiro. O vencedor, porém,
foi o ex-ministro da Saúde Yoichi Masuzoe, apoiado por Shinzo Abe e favorável à
retomada da energia nuclear.
Kiyoaki Fujiwara, diretor de Política Econômica do
Keidanren, contou que o custo da energia elétrica é crescente no Japão desde
2007. Mas a tragédia de Fukushima acentuou a escalada. A tarifa industrial de
energia no país é de US$ 200 por megawatt/hora, segundo a Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Nos EUA, fica em cerca de US$
60, e na Alemanha, o segundo país com tarifas mais altas, de US$ 140 por mw/h.
Por isso, setores que usam muita energia e mão de obra, como o automotivo e o
eletrônico, foram para o exterior. "Só parte delas vai retornar. Aqui
ficaram os segmentos de carros especiais e as indústrias voltadas ao mercado
interno", disse.
O economista chefe do Bank Tokyo-Mitsubishi, Takahiro
Sekido, tem outra visão sobre o tema energético. Para ele, não se trata de uma
questão importante porque as grandes corporações aceleraram, nos últimos três
anos, seus programas de transferência de fábricas para países onde a energia é
mais barata. "Essas indústrias são independentes do impasse sobre religar
ou não as usinas nucleares", afirmou Sekido. "Outros setores vão
seguir o mesmo caminho nos próximos cinco anos. Ficarão aqui apenas as sedes
das companhias e os centros de pesquisa e desenvolvimento."
Um problema adicional – não menos grave, na opinião do
Keidanren – é o aumento da emissão de gases do efeito estufa por causa da
substituição das plantas nucleares por térmicas a carvão ou petróleo. Em
novembro, o Japão abandonou os compromissos registrados no Protocolo de Kyoto,
de 1997. Em vez de reduzir em 25% suas emissões até 2020, com base nos níveis
de 1990, o país vai aumentá-las em 3%. (OESP)
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