Usina nuclear no sertão de Pernambuco ameaça índios pankarás
Quando o governo
transferiu a aldeia da margem do Rio São Francisco para um terreno pedregoso e
sem água, em Itacurubá, a 466 quilômetros do Recife, o então cacique Geraldo
Cabral pensou que o megaprojeto da Represa de Itaparica era o último ataque à história dos
pankarás, índios que resistiram, durante quatro séculos, a jesuítas,
franciscanos, capuchinhos, criadores de gado, escravagistas, cangaceiros,
coronéis, líderes messiânicos, corruptos e assentados da reforma agrária.
A história se repete.
Tratores amarelos, mesma cor das máquinas que derrubaram malocas antes do
enchimento da reserva, em 1988, cortaram a comunidade onde vivem 65 famílias
para a abertura de uma estrada estadual, construída com recursos federais. O
susto maior foi quando os índios receberam a notícia de que o caminho na
caatinga levaria a uma usina nuclear.
O projeto de uma
usina no semiárido nordestino chegou a ser anunciado no ano passado pelo
ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. A ideia está engavetada, pois não
convenceu setores influentes do governo e recebeu críticas pesadas de políticos
e cientistas. Uma estrada, porém, começou a ser aberta na terra dos pankarás
para garantir o acesso a um sítio, a 8 km das malocas, reservado para a usina.
‘Bomba‘
“No passado, eles
tiraram a gente da beira do rio, onde tinha água e peixe. A gente ficou na
pedra”, lembra o índio Fernando Antonio da Silva, de 65 anos, um dos mais
antigos da tribo. “Só não é pior que ficar ao lado da bomba. Se tiver problema,
não vai dar tempo de correr.”
Os técnicos do
governo espalharam no centro de Itacurubá a versão de que serão criados,
durante as obras, 4 mil empregos – e depois, a usina, que “não é uma bomba”,
trará finalmente o desenvolvimento da região. Era uma notícia robusta para os
habitantes de Itacurubá, Rodelas e Petrolândia, cidades reconstruídas pela
Companhia Hidrelétrica do São Francisco, a Chesf, após a inundação da represa.
Os moradores da
região saíram de uma economia de subsistência, de pequenas criações e lavouras,
para viver ao redor das prefeituras e dos salários do funcionalismo público, em
novos centros urbanos. “O governo sabe tudo o que está ocorrendo”, diz,
resignado, Jorge França, de 40 anos, uma das novas lideranças dos pankarás.
“Eles (os políticos) sempre nos viram como pessoas que empatam o
desenvolvimento do Brasil”, reclama a cacique Lucélia Leal Cabral, de 34 anos.
“Não ganhamos indenização em 1988 e não queremos agora. A tribo precisa apenas
de paz para sobreviver.”
Até dezembro de 2002,
os índios da região utilizavam vários nomes e expressões para reafirmar sua
distintividade étnica, como “caboclo” e “braiado”. No começo de 2003, passaram
a adotar o etnônimo Pankará da Serra do Arapuá. Hoje, o povo indígena reúne
quase 3 mil pessoas – a Funai só tomou providências quanto ao reconhecimento
territorial em 2005. (EcoDebate)
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